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Patente "escapulário" gera disputa judicial na Alemanha

Tobias Jung19 de janeiro de 2006

Empresário alemão resolve patentear a palavra brasileira, a fim de comercializar os objetos e arrecadar multas dos desavisados que se utilizarem do termo sem autorização prévia.

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Amuletos da sorte sob patente alemãFoto: Maria Maria

Quem é que não conhece aqueles pequenos objetos, em sua maioria com motivos religiosos, que servem para trazer sorte a quem os carrega e neles acredita? Sejam eles broches, figas, fitas, correntes ou pulseiras, também na Alemanha esses amuletos são objetos cobiçado e fazem a cabeça dos supersticiosos.

Há brasileiros que aproveitam este interesse germânico para vender escapulários trazidos do Brasil, como foi o caso de uma paulistana radicada na Alemanha, que colocou um chaveiro-escapulário à venda no site de leilões e-Bay.

Com o pagamento dos dez euros e a entrega da peça efetuados, a sorte da brasileira pareceu ter ido junto com seu talismã. Duas semanas após concluir a negociação, ela recebeu uma correspondência, demandando o pagamento de multa por utilização indevida do nome e marca "escapulário".

Multas e embates judiciais

O valor total do processo era de 75 mil euros, dos quais ela teve que arcar com mil da multa mais os custos com advogado. Frank Papendieck – que patenteou o escapulário e registrou domínio na internet, passando a ser o detentor de direitos sobre a nova marca – está processando, através de seu advogado, mais de 30 pessoas pelo mesmo motivo, entre brasileiros e alemães, que se utilizarem do termo. Enquanto uns aceitam pagar a multa – a maioria delas gira em torno de mil euros – e assinar um acordo, outros brigam na Justiça pela anulação da patente.

Escapulário
Moda entre jovens na EuropaFoto: Maria Maria

"Sinto-me revoltada e impotente. Tive minha conta no banco penhorada no valor de mil euros por ter vendido algo por dez no e-Bay", contou a paulistana indignada ao site ABKnet. Há indícios, no entanto, que o procedimento todo foi uma ação premeditada, com o propósito de tirar dinheiro da brasileira e de todos aqueles que, ingenuamente, utilizam o termo, agora protegido legalmente.

Para a paulistana – que declarou à DW-WORLD ter entrado em contato com a firma sem nunca ter recebido uma resposta – não foi difícil descobrir se tratar de um golpe. Como o site de leilões permite o acesso às informações de usuários cadastrados, ela pôde comparar o endereço de e-mail do comprador com o do advogado que enviou o processo pelo correio. A ponte estava feita.

Governo brasileiro apóia vítimas

Após denúncia dela ao Ministério brasileiro das Relações Exteriores, o Itamaraty divulgou nota na qual afirma que "o assunto foi levado ao conhecimento do Grupo Interministerial de Propriedade Intelectual (GIPI), e a Embaixada do Brasil em Berlim foi instruída a realizar gestões junto à empresa alemã no sentido do abandono voluntário do mencionado registro indevido da marca 'escapulário'."

Segundo o Itamaraty, "o registro é indevido à luz do disposto no artigo 6º da Convenção de Paris sobre Propriedade Industrial e no artigo 15 do Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comércio (Trips), da OMC [Organização Mundial do Comércio]". A mesma nota destaca ainda dois casos semelhantes, quando as palavras "rapadura" e "cupuaçu" também foram patenteadas na Alemanha e Japão, respectivamente.

Conforme informou à DW-WORLD Luis Guilherme Parga Cintra, secretário do Setor de Cooperação Científica e Educacional da Embaixada do Brasil em Berlim, o registro pode ser considerado indevido por se tratar de uma palavra de uso corrente da língua portuguesa. Cintra também afirma que a representação diplomática aguarda decisão do Instituto de Propriedade Industrial da Alemanha (Bundespatentamt) sobre a anulação da patente, para o qual a brasileira já teria encaminhado todos os recursos possíveis.

Escapulários na internet

Escapulário
Diversos sites comercializam os amuletos da sorteFoto: Maria Maria

Em seu site, Papendieck conta que a história de seus escapulários começou com a descoberta dos colarezinhos de devoção religiosa brasileiros, a partir dos quais então foi desenvolvida toda uma coleção de mesmo nome. Através do desenvolvimento de novas idéias e design, seus produtos são constantemente modificados e regularmente apresentados em feiras internacionais, tanto na Europa quanto na Ásia e América.

Caridade – A empresa também destaca sua filosofia de responsabilidade social, afirmando que, com a aquisição de cada produto original da marca, 50 cents de euros são destinados à caridade. Este trabalho seria realizado juntamente com a Missio Deutschland e a Kindernothilfe, ambas instituições ligadas à igreja católica e evangélica, respectivamente.

Apesar de ser um substantivo da língua portuguesa, os direitos legais sobre o escapulário agora aparentemente são propriedade de um alemão. Procurado pela DW-WORLD, Frank Papendieck não foi encontrado para comentar o caso.