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Os segredos da arqueologia alemã

Simone de Mello3 de janeiro de 2003

Exposição “Gente – Épocas – Espaços” reúne pela primeira vez achados arqueológicos de toda a Alemanha reunificada.

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Foto: presse

A mera menção da arqueologia alemã nos remete diretamente a highlights, como a descoberta de Tróia, por Heinrich Schliemann, em 1868, por exemplo. Em território alemão, no entanto, são poucas as descobertas arqueológicas capazes de deixar leigos boquiabertos. A exposição "Arqueologia na Alemanha: Gente – Épocas – Espaços", aberta ao público até o fim de março, no Martin-Gropius-Bau, em Berlim, reúne uma amostra de descobertas arqueológicas representativas, desde testemunhos paleantropológicos da Idade da Pedra até achados da recente arqueologia urbana. Entre os objetos expostos, apenas alguns tornam imediatamente presentes as civilizações passadas; na maioria dos casos, apenas o complexo aparato de informações e os efeitos especiais de luz e som tornam imagináveis a vida de tantos povos que cruzaram esta região da Europa Central.

Rupturas históricas e a busca arqueológica

Desde o século XV, achados arqueológicos passaram a fazer parte dos gabinetes de curiosidades da corte, sendo encarados mais como suvenires do que como testemunhos históricos. Em meados do século XVIII, apesar de todo o discernimento da Idade das Luzes, costumavam-se presentear objetos desta espécie. Sem qualquer pudor, inscreviam-se dedicatórias nas peças achadas, com uma descrição das circunstâncias em que foram descobertas, segundo mostra uma urna romana, inteiramente manuscrita a tinta em 1742. Só por volta de 1800 começaram a surgir os primeiros regulamentos sobre o tratamento adequado de descobertas arqueológicas, sendo que a primeira lei de conservação de patrimônio foi assinada apenas em 1902, no Principado de Hessen.

A reunificação tardia da Alemanha levou, também na arqueologia, a um desenvolvimento descentralizado das pesquisas e coleções. Os bombardeios do fim da Segunda Guerra Mundial destruíram diversas fontes e sítios arqueológicos, mas abriram brechas para se escavar em regiões urbanas densamente povoadas até então. No entanto, a prioridade do pós-guerra era garantir rapidamente moradia para os milhões de desabrigados; e assim foram vedadas novamente as brechas abertas no final da guerra.

A reunificação da Alemanha garantiu não apenas um maior intercâmbio entre os pesquisadores e instituições dos dois lados do país. A reconstrução do Leste e a necessidade de sanear amplas superfícies habitacionais também levaram à redescoberta de uma parte até então intacta do cotidiano da Idade Média, por exemplo. A mostra organizada pelos Museu de Pré-História de Berlim, em cooperação com a Federação dos Arqueólogos da Alemanha, é a primeira mostra que reúne coleções e estudos de todo o território nacional, expondo as descobertas arqueológicas dos últimos 25 anos.

Do sacrário celta ao cálice de E.T.A. Hoffmann

A exposição documenta procedimentos de investigação paleontológica, reconstrói o cotidiano dos povos germânicos e momentos da colonização romana, traça o roteiro de outros povos, como os eslavos, que mantinham contato não apenas com o viquingues, mas com culturas mediterrâneas, rastreia o subsolo das aglomerações urbanas medievais e aponta para novos achados da arqueologia urbana.

Descobertas de vulto ainda são possíveis em território alemão, como mostra o sítio arqueológico de Glauberg, no estado de Hessen, onde se encontraram, em 1996, um sacrário celta com dois túmulos ricamente decorados e quatro estátuas de guerreiros, uma das quais bem conservada. A escultura, feita sob influência da arte grega, inclui todos os atributos do guerreiro, remetendo a diversos objetos encontrados nos túmulos, do que se deduz que a estátua venha a ser um retrato do príncipe sepultado.

A exposição também reúne objetos da história recente, mostrando que a atividade arqueológica não se restringe a civilizações desaparecidas. A sensacional descoberta do bunker da guarda pessoal de Hitler, não muito distante do Reichstag, no início da década de 90, trouxe à luz "afrescos" nazistas e objetos do cotidiano dos guarda-costas do líder nazista, mostrando que Berlim – centro de tantas viradas históricas – ainda encerra muitas surpresas no subsolo.

Uma das curiosidades berlinenses é o conjunto de copos, pratos e talheres do restaurante e café Lutter & Wegner, onde o escritor E.T.A.Hoffmann provavelmente concebeu muitos de seus contos de terror. O local, consagrado pela ópera póstuma de Jacques Offenbach Os Contos de Hoffmann (1880), foi inaugurado em 1911 no piso térreo de um casarão do século XVIII na Charlottenstrasse 49, expandindo-se posteriormente para o porão. O edifício, destruído por bombas em 1944, foi submetido em 1993 a uma inspeção técnica, durante a qual se encontrou – no porão – uma prateleira caída e carbonizada com louças do famoso ponto de encontro dos últimos românticos.

A exposição "Arqueologia na Alemanha: Gente – Épocas – Espaços" também poderá ser vista a partir de abril na Kunsthalle de Bonn.