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Opinião: Os dois lados da Saxônia

23 de fevereiro de 2016

O estado no leste da Alemanha é mesmo mais xenófobo do que o resto do país? Ou isso não passa de preconceito? Mesmo após recentes atos contra refugiados na região, generalizações não ajudam, opina Marcel Fürstenau.

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Kommentarfoto Marcel Fürstenau Hauptstadtstudio
Marcel Fürstenau é jornalista da DWFoto: DW/S. Eichberg

Do lado de fora, a multidão brada insultos irados; no ônibus, refugiados amedrontados. Os policiais não são capazes de conter a brutalidade do povo. Em vez disso, arrastam os refugiados com violência para a rua – para colocá-los em segurança, alegam. Uma explicação perfeitamente plausível, em face das ameaçadoras cenas que se veem na internet.

O clima na cidade saxã de Clausnitz está carregado de ódio, e a situação pode sair do controle a qualquer momento. Ou será que a polícia busca uma escapatória, para desviar a atenção do próprio fracasso? À distância não há como julgar com certeza. Ainda assim, não se fazem esperar as imputações de culpa de muitos lados. Comportamento esse que também pode contribuir para uma escalada, ao menos no nível retórico. Certo está que, para o esclarecimento, ele dificilmente contribuirá.

Só uma coisa está clara: mais uma vez a pacata Saxônia foi palco de excessos xenófobos. Não se trata apenas da impressão de que isso esteja acontecendo com mais frequência naquele estado no leste alemão. Lá, os incêndios em abrigos de refugiados são recorrentes – como no último sábado, na cidade de Bautzen.

A brutalização é visível. Os bombeiros são impedidos de apagar o fogo, curiosos cheios de ódio se deleitam com o mar de chamas. Não há como minimizar a situação, muito menos desculpá-la. A Saxônia está a caminho de se transformar num sinônimo da imagem do mau alemão.

Para muitos, o estado já é isso há bastante tempo, em especial graças ao movimento Pegida (sigla para "Patriotas europeus contra a islamização do Ocidente" em alemão). Há mais de um ano, todas as semanas milhares saem em passeata por Dresden e eles têm se radicalizado cada vez mais.

De início, havia possivelmente muitos entre eles que, com razão, se sentiam negligenciados e incompreendidos pela política. Hoje, porém, quem ainda apoia esse movimento abertamente xenófobo e racista, está conscientemente se posicionando fora da sociedade civilizada. O mesmo se aplica aos imitadores do Pegida em outras partes da Alemanha.

Abrigos de refugiados não ardem apenas no leste do país, da mesma forma que a resistência dos cidadãos decentes e a ajuda aos necessitados não acontece apenas no oeste. Entretanto, diante das circunstâncias, os bons exemplos na Saxônia acabam se perdendo, via de regra.

A indignação justificada e ampliada pela mídia faz mais barulho e toma mais espaço do que a solidariedade de cem cidadãos íntegros em Clausnitz, no último fim de semana. Quem registrou a impressionante corrente humana com 13 mil participantes, em Dresden, que em 13 de fevereiro recordou a destruição da cidade às vésperas do fim da Segunda Guerra Mundial? Desse modo, os manifestantes também emitiram um sinal claro contra a apropriação dessa data pelos ultradireitistas e pelo clima criado pelo Pegida.

Tais imagens também são parte da Saxônia. E com elas transmitem-se boas notícias para o mundo a partir da bela Dresden, às margens do rio Elba. Contudo essas notícias só fazem esquecer a odiosa face do ódio por pouco tempo. Depois dos repulsivos acontecimentos dos últimos dias, a Saxônia corre, mais do que nunca, o perigo de ser rotulada de forma duradoura como reduto da extrema direita. Infelizmente sempre volta a haver motivo para tal.

De nada adianta apontar para a xenofobia que se manifesta por todas as partes da Alemanha. A Saxônia tem mais do que um problema de imagem. E isso só mudará quando houver mais gente indo às ruas contra o Pegida do que com o Pegida. A cada manifestação. Isso vale mais do que nunca depois de dias como esses em Clausnitz e Bautzen.

Marcel Fürstenau
Marcel Fürstenau Autor e repórter de política e história contemporânea, com foco na Alemanha.