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Opinião: Merkel acerta em não ir a Dia da Vitória

Christian Trippe (ca)12 de março de 2015

Chanceler federal alemã decidiu não participar do desfile pelos 70 anos do fim da Segunda Guerra Mundial na Rússia. Uma decisão difícil, mas necessária, opina Christian Trippe, correspondente da DW em Moscou.

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01.2012 DW Europa aktuell Moderator Christian Trippe
Correspondente da DW Christian TrippeFoto: DW

No final, a surpresa ficou somente por conta da escolha da hora. Até mesmos funcionários próximos esperavam que a da chanceler federal alemã, Angela Merkel, levasse mais tempo para anunciar a decisão – que ela aguardasse o desenvolvimento da situação no leste da Ucrânia; que segurasse esse trunfo de negociação de valor simbólico extremamente elevado pelo maior tempo possível; ou que pesasse com calma os prós e os contras.

O Dia da Vitória é de suma importância na Rússia. Não há nenhum outro feriado cuja carga emocional chegue ao menos perto do que suscita o 9 de maio. O dia da capitulação alemã possui um significado constitutivo para os russos – mais do que o Dia da Constituição, mais sério que o Primeiro de Maio, incontestavelmente mais importante de que todos os feriados religiosos.

A Segunda Guerra Mundial significava para a União Soviética muito mais do que simplesmente vencer ou perder. Os russos lutaram por sua sobrevivência como povo e cultura. Por todas as partes, a sociedade russa ainda carrega consigo, 70 anos mais tarde, as cicatrizes do conflito com a Alemanha nazista, que custou a vida de mais de 20 milhões de cidadãos soviéticos.

Merkel está ciente desse significado. Quando universitária, vivenciou isso tudo em suas viagens pela Rússia. E ainda assim ela recusa agora o convite para participar das comemorações oficiais do dia 9 de maio, em Moscou. Não se deve descartar a possibilidade de que, ao longo da Praça Vermelha, também desfilem unidades que participaram da guerra não declarada da Rússia no leste da Ucrânia ou na anexação da Crimeia.

Na Segunda Guerra Mundial, a Rússia resistiu ao fascismo alemão. Mas desvaloriza essa conquista histórica com atual propaganda estatal: no momento em que ela classifica, da mesma forma, a agressão russa na Ucrânia como "uma luta contra o fascismo" – desta vez contra a suposta "junta" em Kiev.

Tais considerações também podem ter desempenhado algum papel na recusa de Merkel de subir à tribuna de honra na Praça Vermelha – com vista para o local onde o político de oposição Boris Nemtsov foi assassinado no final de fevereiro.

E, mesmo assim, a rejeição de Merkel se diferencia da recusa de outros líderes europeus: poloneses, lituanos, estonianos e letões não querem participar das comemorações da vitória, já que para eles o avanço do Exército Vermelho implicou o início de um novo período de opressão e – ainda mais importante – por se sentirem hoje ameaçados pela política neoimperialista de Vladimir Putin.

Merkel, no entanto, vai se curvar à memória do sofrimento que as tropas alemãs trouxeram para a Rússia: um dia após as pomposas celebrações militares e oficiais, ela pretende depositar uma coroa de flores no Túmulo do Soldado Desconhecido, na Muralha do Kremlin. Ou seja, um tributo silencioso, ali, onde qualquer levantar de voz pode gerar rapidamente discórdia diplomática. Os russos saberão interpretar esse gesto da chanceler federal alemã.

Ainda não está claro, aliás, como o presidente americano, Barack Obama, o premiê britânico, David Cameron, e o presidente francês, François Hollande, vão se comportar: se irão ou não para a celebração do Dia da Vitória como representantes dos antigos aliados da União Soviética. Por outro lado, já é certo que o ditador norte-coreano, Kim Yong-um, viajará para o desfile. O porquê de sua presença continua um mistério, que Angela Merkel agora não precisa mais desvendar.