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Opinião: A guerra na Síria e os erros do Ocidente

15 de março de 2018

Uma invasão poderia ter tido consequências fatais. O dilema, porém, é que o mesmo se aplica à decisão de não intervir. As potências ocidentais podem tirar várias lições desses sete anos de conflito.

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Syrien Assad kündigt Fortsetzung der Angriffe auf Ost-Ghuta an
Edifícios em Ghouta Oriental destruídos por ataques aéreos executados pelo regime sírio comandado por Bashar al-AssadFoto: picture alliance/AA/A. Sab

A guerra na Síria é também um caso para historiadores com a competência especial em história ficcional: o que teria acontecido se...? Esta questão é particularmente urgente em relação aos Estados ocidentais: como essa guerra teria decorrido se eles tivessem agido de maneira diferente? E esta indagação não é fútil, de forma alguma: ela afeta diretamente o destino de inúmeras pessoas que, caso o Ocidente tivesse tido uma postura diferente, poderiam , talvez (!), ainda estar vivas.

Do ponto de vista atual, o histórico das decisões ocidentais espelha acima de tudo um de oportunidades perdidas. A mais notória foi em 2013: quando se tornou evidente que o regime do presidente Bashar al-Assad poderia usar gás venenoso contra seu povo, o então presidente dos EUA, Barack Obama, advertiu sobre uma "linha vermelha", que seria atravessada neste caso, e advertiu sobre as consequências. Mas quando o gás venenoso foi usado, de fato, Obama não fez nada. Ele ignorou o uso do gás ou seu seu próprio alerta – ou ambos.

Com isso, aquela que era possivelmente a última oportunidade de mostrar ao regime de Assad seus limites aparentemente foi desperdiçada. Na época, a Síria ainda não estava sob proteção do Irã e da Rússia, pelo menos não como agora. Ainda havia um equilíbrio de forças, que tornava plausível qualquer tipo de intervenção dos EUA e de seus parceiros. Obama deixou escapar essa oportunidade.

Ele pode ter tido boas razões para isso. A intervenção americana no Iraque havia ocorrido há cerca de dez anos e, havia muito tempo, provou ter sido um desastre político, moral e de propaganda. A invasão sem norte, determinada com base em mentiras flagrantes, deu aos Estados Unidos a imagem de uma força arrogante e neo-imperial – uma impressão da qual nunca se recuperou.

E somente por esta razão, uma nova intervenção no Oriente Médio – desta vez na Síria – teria sido arriscada: dependendo do curso e do resultado, teria arruinado ainda mais a reputação dos EUA.

E o peso do risco estratégico era similar: afinal, o resultado de uma intervenção era completamente incalculável. Assad teria se deixado impressionar? Rússia e Irã teriam aceitado uma invasão? E teria Obama possivelmente levantado parte do mundo islâmico contra seu país – xiitas, talvez até sunitas? A intervenção significaria novos ataques jihadistas nos EUA e na Europa?

Uma coisa era certa: uma invasão poderia ter trazido consequências fatais. O dilema é apenas que o mesmo se aplica à decisão de não intervir. A situação atual é conhecida: Rússia e Irã tomaram o comando na Síria e intervieram de forma tão intensa, que tornou impossível uma confrontação para o Ocidente.

Demandas de Washington e de capitais europeias de que Assad tem que renunciar tornaram-se apenas labiais e cruelmente irrelevantes. O que o Ocidente quer ou não quer pouco importa. Até mesmo os gestos habituais de indignação não impressionam ninguém no local.

O fato de os EUA terem simulado nos anos anteriores ao início da guerra estratégias para derrubar Assad, com as teriam jogado a Síria igualmente em caos, faz com que também os americanos aparentem ser uma força com intenções duvidosas.

E que Obama e seus parceiros tenham demonstrado uma falta de determinação no lugar de um intervencionismo rude também não melhorou a situação. Apoiar rebelde sim, mas não muito, por medo de apoiar o errado (digamos jihadistas). Essa estratégia não mitigou a crise, pelo contrário: encorajou uma incontável oposição a uma luta que, na perspectiva de hoje, já estava perdida na época. E não apenas eles morreram. Centenas de milhares de civis também foram vítimas da mais terrível violência, praticada com um cinismo muitas vezes nem comparável a outras atrocidades do século 20.

A questão é: o que pode ser aprendido com isso tudo? As intervenções do Ocidente foram executadas de forma amadora e fracassaram jorrando bastante sangue tanto no Iraque e na Líbia. Uma coisa é clara: o Ocidente é (atualmente) incapaz de realizar intervenções sensatas de longo prazo e ele não pode simplesmente deixar o campo para outros – a guinada provocada por Rússia e Irã na guerra da Síria é das mais cínicas já presenciadas.

Para o futuro – embora não seja mais para a Síria, pois é muito tarde – isso só pode significar que possíveis declarações devem ser seguidas de ações determinadas ou bem pensadas. Ou o Ocidente ficará de fora desde o início. Com os habituais belos discursos, no entanto, nada será alcançado: eles apenas pioram as coisas.

Kersten Knipp é jornalista da DW

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Kersten Knipp
Kersten Knipp Jornalista especializado em assuntos políticos, com foco em Oriente Médio.