O teatro nas redes
15 de setembro de 2003O que a arte contemporânea tem a dizer sobre a globalização? A resposta do diretor teatral Dirk Cieslak é tão simples quanto sua realização é complexa: longe de criticar, combater ou querer transformar esse fenômeno atual, ele tenta reproduzi-lo com meios artísticos.
O ponto de partida foi uma consideração de Cieslak: "Todo o mundo conhece os sintomas da globalização. Mas quase ninguém entende como ela funciona. Aí pensamos, precisamos experimentar essa coisa. Como se produz? Como se distribui? [...] Fluxo de dados e conexão em rede são os instrumentos centrais, portanto começamos a construir um website e uma espécie de rede de correspondentes." O nome do projeto: Mutation.
Cinco grupos teatrais e de dança – além do Lubricat que Cieslak dirige em Berlim, outros em Buenos Aires, Lagos, Richmond (Virginia) e Xangai, cada um com cinco membros – comunicam nesse site suas experiências cotidianas. Duas colunas de conceitos servem para estruturá-las: de um lado, 12 "áreas" (governo, relações, prazer), do outro, 12 "estados" (morrendo, crescendo, luta) que podem ser livremente combinados aos pares (governo fazendo, dinheiro sozinho, etc.).
Sobre o abismo entre a rede e o palco
Através de suas contribuições os – em mais de um sentido – "atores" constróem pouco a pouco uma forma híbrida entre texto teatral, diário de bordo e léxico da globalização. O resultado final será apresentado em palcos nos cinco cantos do mundo. Os ensaios começam em setembro em Richmond. Na Alemanha, Mutation poderá ser visto no próximo ano.
Cieslak não acredita no perigo de – durante essa viagem por cinco continentes movida à base de virtualidade e no afã de conectar-se à contemporaneidade – estar sacrificando o que há de específico e mais forte no palco como forma de expressão: "No palco, nosso trabalho está plenamente focalizado na presença física dos atores", assegura o diretor. "Não queremos tornar o teatro mais chique. Aqui a técnica é mero instrumento. O que me interessa são meios de produção, não histórias".
"A questão é mais de pesquisa, formas de apreender o mundo", acrescentam os atores do Lubricat, "é mais sobre o trabalho como ator e ser pensante".
"Não" ao multicultural
O projeto distancia-se radicalmente da onda multicultural, assim como de outras variantes do "world" e do "etno", tão populares nas últimas duas décadas. Não há intercâmbio cultural no sentido clássico. "Não queremos provocar o entendimento, mas sim curto-circuitos", adverte Cieslak.
Em entrevista à DW-WORLD, ele especifica: "Decisiva para mim neste projeto é a tentativa de desenvolver uma prática artística do 'curto-circuito global'. Não me ocupo mais de apresentar culturas e proporcionar seu encontro, num intercâmbio. Isso pode ter sua justificativa a título de concepção política ou pedagógica. Nós trabalhamos numa prática artística que torna atual a multiplicidade das transformações de identidades culturais na globalização".