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O mapa das conquistas no estômago

(gh)30 de março de 2003

Carga genética de bactéria do estômago revela os caminhos percorridos pelo ser humano na conquista do mundo.

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A "helicobactéria pilori" é útil à pesquisa, mas também pode causar úlcerasFoto: Lund University

Uma equipe internacional de pesquisa, liderada por microbiologistas alemães, acaba de descobrir no genoma de uma bactéria do estômago, chamada Helicobacter pylori (helicobactéria pilori), dados que podem ajudar a reconstituir a trajetória percorrida pelo homo sapiens em sua proliferação pelos cinco continentes.

A bactéria é encontrada no estômago de praticamente todo ser humano. Normalmente, ela vive em harmonia com o seu portador, mas, às vezes, também pode causar úlceras. Devido à sua diversidade biológica, é muito útil para pesquisas antropológicas. Análises do genoma da helicobactéria pilori são de alto valor informativo. A bactéria deixa rastros claros das relações de parentesco, ao longo dos caminhos percorridos pelo ser humano pelas diversas regiões do globo.

Os pesquisadores liderados por Mark Achtman, do Instituto Max Planck de Biologia Infectológica, e Sebastian Suerbaum, do Instituto de Higiene e Microbiologia da Universidade de Würzburg, coletaram amostras de helicobactéria pilori em 27 fontes, geográfica, étnica e lingüisticamente diferentes. Eles decifraram determinadas partes do genoma de 370 isolados (amostras) da bactéria, nos quais identificaram mais de mil variações, os assim chamados polimorfismos, que lhes servem de pontos fixos para estudar as relações de parentesco entre os isolados.

Com a ajuda de programas especiais de computador, eles conseguiram identificar quatro grandes populações de helicobactéria, nas quais é possível classificar todas as outras variantes. Em função de sua distribuição geográfica, essas linhagens de bactérias foram batizadas de "África 1", "África 2", "Leste Asiático" e "Europa". Análises mais detalhadas permitiram dividir duas das linhagens principais em três subgrupos: "Amerind", "Easia" e "Maori".

Ondas migratórias

Os cientistas descobriram que quase todos os isolados de helicobactéria dos diferentes países asiáticos pertencem à linhagem "Easia". O grupo "Amerind" foi encontrado, principalmente, entre os inuits (esquimós) e os índios das Américas do Norte e do Sul.

Os resultados da pesquisa confirmam antigos dados antropológicos e históricos, segundo os quais, há cerca de 12 mil anos, emigrantes do Leste Asiático povoaram o continente americano. Comprovam também que africanos ocidentais deixaram rastros no continente americano, sobretudo entre os afro-americanos de Louisiana e Tennessee, onde a bactéria do estômago revela um retrato do comércio escravagista.

Mosaico - Já a composição dos isolados de helicobactéria na Europa é bem mais complexa. Os pesquisadores analisaram 200 isolados diferentes, mas não conseguiram identificar nenhum subgrupo estruturado. Eles supõem que isso tem a ver com a história do continente, cuja população atual resultou da miscigenação de diversas ondas migratórias independentes. Por isso, o genoma da helicobactéria pilori encontrada na Europa apresenta-se como um mosaico, composto por elementos de diversas fontes.

Tudo indica que a bactéria do estômago dos europeus tem duas origens: a linhagem AE1 teria vindo da Ásia Central, e a AE2, do Norte da África. Essa hipótese coincide com as teses sobre as duas principais ondas migratórias em direção ao continente europeu. Segundo estudos paleontológicos, no período neolítico, agricultores do Oriente Médio migraram para a Europa e misturam-se com os povos caçadores que encontraram na região.

Além disso, pesquisas lingüísticas indicam que uma outra onda migratória independente veio da região dos Montes Urais. A bactéria do estômago, portanto, não apenas parece ser uma fiel companheira do ser humano, como pode construir pontes entre períodos históricos e continentes.