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O Brasil na imprensa alemã (15/02)

15 de fevereiro de 2023

Retirada de invasores da TI Yanomami, acordo Mercosul-UE e posição do Brasil na guerra na Ucrânia foram destaques da imprensa alemã na semana que passou.

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Avião destruído em pista de terra. Equipamento foi queimado pelo Ibama em operação para retirada de garimpeiros ilegais da TI Yanomami.
"O Ibama voltou", titula o diário Tageszeitung, que fala sobre a retirada de garimpeiros ilegais da TI YanomamiFoto: Edmar Barros/AP Photo/picture alliance

Tageszeitung (TAZ) – O Ibama voltou (13/02)

Densas nuvens cinzentas de fumaça sobem ao céu diante do verde farto da Floresta Amazônica. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) divulgou fotos e vídeos em seu site, mostrando os mais recentes sucessos na luta contra garimpeiros ilegais. As imagens mostram, por exemplo, um avião em chamas, acima do qual está escrito: "O Ibama voltou".

Desde a troca de governo em 1º de janeiro, o órgão atua de maneira reforçada contra garimpeiros ilegais na Amazônia. Com frequência, equipamentos usados pelos invasores, como aviões ou escavadeiras, são queimados e, assim, inutilizados. Em cooperação com o Exército e a polícia, os agentes estão atuando principalmente na Terra Indígena Yanomami, na fronteira brasileira com a Venezuela. A reserva do tamanho da Suíça, localizada nas profundezas da floresta tropical, é rigorosamente protegida pela Constituição – haveria cerca de 35 mil indígenas na região.

Nas últimas semanas, imagens dramáticas rodaram o mundo. Mostram crianças famintas e idosos em estado avançado de desnutrição. Muitos indígenas estão subnutridos e centenas de crianças morreram de doenças evitáveis, frequentemente trazidas pelos garimpeiros. Até 20 mil deles teriam invadido o território Yanomami, alguns com armas pesadas e ligações estreitas com o crime organizado, que usa a área como rota do tráfico de drogas. Os conflitos violentos com indígenas são frequentes.

(…) Um problema adicional: os garimpeiros usam mercúrio para aglutinar o pó de ouro durante a extração. Os restos do metal pesado vão parar no rio e envenenam os peixes comidos pelos indígenas. O metal altamente tóxico pode causar danos permanentes ao sistema nervoso. Dezenas de milhares de indígenas são envenenados silenciosamente.

Que a situação tenha chegado a esse ponto tem relação com um homem: o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro. Seu governo ignorou mais de 20 pedidos de auxílio dos yanomami. Na contramão, quis abrir as áreas protegidas para atividades econômicas e legalizar a mineração ilegal. (…) O garimpo ilegal explodiu formalmente depois de sua posse.

(…)

Além disso, o comércio de ouro é um negócio bilionário com mandantes influentes – também no exterior. O rush do ouro no Brasil também tem relação com a demanda crescente no mercado mundial. Enquanto a comunidade internacional se interessa cada vez mais pela origem dos produtos agrícolas brasileiros, considerando até boicotes, o metal amarelo raramente é foco de atenção. No Brasil, porém, aumentam cada vez mais as exigências à comunidade internacional de adotar medidas vinculantes contra o "ouro de sangue".

Die Welt: Podcast Machtwechsel – Viagem instrutiva pela América Latina (12/02)

No podcast semanal com Dagmar Rosenfeld, Robin Alexander relata o que observou na viagem do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, ao Brasil, ao Chile e à Argentina.

Dagmar Rosenfeld: Não foi fácil a viagem de Olaf Scholz ao Brasil. Mesmo que ele veja no presidente Lula um camarada ou até mesmo um amigo, o mandatário brasileiro não teve um comportamento nada cavalheiresco. [Lula] não quer participar do clube do clima do chanceler federal alemão. Não quer apoiar a coalizão ocidental com munição. Em compensação, Lula declarou a China como pacificadora, mesmo que Scholz tenha dito, pouco antes: "Todos estamos felizes que o Brasil voltou ao palco mundial e que esteja se empenhando por uma integração regional mais forte na América Latina. Vocês fizeram falta!" Foi proximidade ou estratégia, devido ao fato de o governo alemão precisar do país latino-americano como parceiro?

Robin Alexander: Acho que são as duas coisas. É um recurso estilístico, talvez também um elemento estrutural da política externa de Olaf Scholz, que tenta fazer contatos calculados com pessoas com alinhamento político semelhante a ele. (…) Ele foi à Argentina, ao Chile e ao Brasil e encontrou chefes de estado e de governo de esquerda – e destacou isso.

E ele também levou uma ideia de que uma Alemanha governada por uma coalizão-semáforo – ele diria que se trata de uma Alemanha progressista – é um parceiro especialmente atraente para esses países. E isso é algo incomum na política externa, já que as cores partidárias não costumam ter muita relevância nesse contexto. (…) Essa ideia de pensar a política externa em cores partidárias é incomum. Acho que isso funcionou bem na Argentina e no Chile, mas Scholz naufragou com isso no Brasil.

Rosenfeld: "Está na hora de a China colocar a mão na massa e ajudar a encontrar a paz entre Rússia e Ucrânia", disse Lula, durante a visita do chanceler federal. Scholz contou com esse tipo de declaração?

Robin Alexander: Acho que não, ele parecia muito estoico durante a coletiva de imprensa. Algo deu errado ali. Talvez seja importante conhecer o contexto – era uma grande esperança de Putin que a guerra na Ucrânia fosse um conflito entre a Rússia e o Ocidente e que o resto do mundo ou observasse ou ficasse do lado dele. Isso tem relação com a experiência que Putin teve.

Havia o conceito do Brics, o grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, que poderiam atuar como bloco próprio de países emergentes que agora têm bastante poder, que se tornariam atores da política mundial. Eles ajudaram bastante o Ocidente, a exemplo da crise financeira mundial, precisaram deles. Mas os outros Brics não ficaram ao lado de Putin. O próprio Brasil votou pela condenação da invasão russa na ONU.

(…)

Por que Lula não quer ajudar a Ucrânia com armas?

Houve uma conversa confidencial bastante longa entre Lula e Scholz. Deve ter havido um posicionamento em relação à China nesse diálogo.

O problema básico não é Lula dizer que precisamos falar com a China. Scholz também faz isso. O problema é que Lula parece flertar com essa ideia de que poderia haver aí um polo oposto ao Ocidente. O próprio Lula não é jovem, e seu conselheiro mais importante tem 80 anos. Os dois e outros membros do entorno têm essa marca de uma esquerda latino-americana muito antiga.

No Ocidente, não se enxerga isso. O presidente alemão Frank-Walter Steinmeier viajou para a posse de Lula e, três dias antes de Scholz, a ministra alemã da Cooperação e do Desenvolvimento, Svenja Schulze, já estava no Brasil. Ela levou 200 milhões de euros na bagagem, como financiamento de estímulo, por assim dizer. Pelo fato de Bolsonaro ter sido uma espécie de versão do Sul de Trump e ter feito tanta coisa ruim, pensa-se que seu sucessor é um herói. E, na política, isso costuma não funcionar.

Handelsblatt – Com UE, Brasil já se enxerga como unidade comercial – (09/02)

Para Bruxelas, o pacto que já está sendo negociado há mais de 20 anos ganha relevância devido à nova situação geopolítica mundial. No contexto das crises envolvendo a Rússia e a China, a Europa procura novos fornecedores de matérias-primas e energia. Os países do Mercosul como Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai poderiam ser alternativas, segundo a expectativa. A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, promove uma "agenda comercial ambiciosa", que deverá possibilitar o acesso da Europa a matérias-primas cobiçadas. (…)

Superar o isolamento, fortalecer as cooperações no interior da América Latina, expandir as relações comerciais internacionais: é assim que o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, define sua agenda. O ex-presidente Jair Bolsonaro isolou o país com suas políticas ambiental e de direitos humanos, quase nenhum governo ocidental queria receber o populista de direita. Seu ex-ministro Ernesto Araújo tinha até orgulho de o Brasil ser um pária no mundo.

(…)

Scholz e Lula destacaram durante conversas na semana passada que querem acelerar as negociações sobre o tratado de livre comércio do Mercosul com a UE. A União Europeia precisaria dizer claramente que acréscimos quer adicionar ao mecanismo de uma zona de livre comércio, como padrões ambientais, diz o ministro brasileiro. "Até agora, não sabemos o que Bruxelas quer", afirma Vieira. "Esperamos que a UE não use acréscimos para introduzir medidas protecionistas".

(…)

Mas, enquanto o acordo avança, a política relativa à Rússia também inclui pontos de conflito com o Ocidente.

(…)

O ministro brasileiro diz não compreender as irritações causadas pelas palavras de Lula na Europa. Segundo ele, o comunicado condenou claramente a agressão russa ao território da Ucrânia. Sobre negar o envio de munição a tanques alemães, o Brasil também estaria seguindo as premissas tradicionais de sua política externa de não se envolver em conflitos internacionais.

(…)

[Segundo Vieira] O multilateralismo, a integração regional, a prioridade de buscar soluções pacíficas para conflitos – esse seria o preâmbulo da diplomacia na Constituição. (…) Lula havia sugerido a criação de um grêmio internacional para mediar o conflito na Ucrânia – incluindo o Brasil como possível participante. Segundo o mInistério, se o Brasil quiser mediar de forma credível, não pode tomar partido no conflito.

 rk/bl (ots)