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Negócio da China na Amazônia equatoriana

Clarissa Neher/Nádia Pontes5 de setembro de 2013

Controversa decisão de Correa de explorar petróleo em uma das regiões de maior biodiversidade do mundo teria sido fruto de pressão de Pequim, que cada vez mais se aproveita da busca do Equador por crédito no exterior.

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Foto: DW / Michael Altenhenne

A polêmica decisão do presidente Rafael Correa de explorar petróleo numa reserva em plena Amazônia equatoriana – que indignou ambientalistas, já mobiliza parte da sociedade civil no país e gerou mal-estar até com a Alemanha – foi motivada também por pressão da China, segundo fontes e especialistas ouvidos pela DW.

Desde 2008, quando decretou a moratória de parte de sua dívida externa, o Equador passou a ter nos chineses seus principais credores – só em agosto passado recebeu 1,2 bilhão de dólares, como parte de acordos de pré-venda de petróleo. E o óleo extraído do Parque Nacional Yasuní poderia servir para suprir a demanda exigida por Pequim.

"A decisão de Correa de explorar Yasuní é uma resposta à pressão internacional, à pressão da China. Nós temos uma dívida enorme com esse país", afirma Jorge Espinoza, da organização ambiental equatoriana Acción Ecológica.

Em junho passado, Correa anunciou que a estatal China National Petroleum Company investiria 12,5 bilhões de dólares na modernização e construção de novas refinarias no Equador. Antes disso, a dívida equatoriana com Pequim já chegava a 7,8 bilhões de dólares, grande parte relacionada ao setor petrolífero.

"Sem dúvida alguma, uma razão [para o projeto em Yasuní] é a crescente demanda de recursos naturais em países como a China, que estão desesperadamente famintos por petróleo, minerais e alimentos", diz Alberto Acosta, ministro de Minas e Energia durante o primeiro mandato de Correa.

A China começou a se aproximar do Equador com a chegada de Correa ao poder, em 2007, em busca de fontes de recursos naturais para sua gigantesca indústria. Então, o país sul-americano vendia 75% do seu petróleo para os Estados Unidos. Hoje, estima-se que envie mais da metade para os chineses, e a tendência é que a cifra cresça.

Ecuador Polizei greift ein bei Demonstrantionen
Manifestantes protestam contra a exploração de YasuníFoto: picture-alliance/dpa

"A China tem um portfólio de investimentos em crescimento vertiginoso na América Latina, inclusive no Brasil, e os países, em geral, têm um comportamento diplomático bastante subserviente à China", aponta o americano Philip Fearnside, pesquisador do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisa das Amazônia). "Portanto, o potencial chinês para provocar impactos ambientais na região é grande."

O governo equatoriano foi procurado pela reportagem da DW, mas não quis se pronunciar sobre o assunto.

Fracasso de iniciativa internacional

Ambientalistas e povos indígenas ainda se mobilizam para tentar impedir a exploração de petróleo no Parque Yasuní, uma das regiões de maior biodiversidade do mundo. Eles buscam recolher assinaturas para a realização de um referendo. O projeto encaminhado por Correa está atualmente na Assembleia Nacional, que, dominada por partidários do presidente, deverá aprová-lo sem transtornos.

Em 2007, o Equador havia se disposto a preservar a região se recebesse 3,6 bilhões de dólares de ajuda internacional, numa iniciativa conhecida como Yasuní ITT. O valor corresponde à metade do lucro estimado com a exploração do petróleo durante dez anos.

No entanto, o Equador conseguiu apenas 13 milhões de dólares, doados por países europeus e organizações de proteção ao meio ambiente. A quantia foi depositada em um fundo de um programa das Nações Unidas e, com o fim do projeto, será devolvida. O episódio gerou fortes críticas, sobretudo da Alemanha, uma das principais defensoras da preservação do parque.

Quando foi anunciada, a iniciativa Yasuní ITT parecia revolucionária: países mais ricos ajudariam governos mais pobres a preservar a natureza em vez de explorá-la economicamente. Mas a empreitada inovadora tinha poucas chances de dar certo: segundo especialistas, o fracasso desse modelo já era esperado.

A presidente do Centro Equatoriano de Direito Ambiental (Ceda), Verónica Arias, aponta as contradições do governo do Equador como um dos fatores decisivos para a falha da iniciativa. Para ela, também houve problema na concepção do projeto, que era considerado como modelo para reduzir mudanças climáticas – e não um projeto de preservação da biodiversidade. Houve também, segundo ela, falta de clareza nas diretrizes sobre a aplicação dos recursos que viriam do fundo.

"Havia o plano A, que era não extrair petróleo na região, mas sempre houve o plano B, que era explorar Yasuní se não conseguissem juntar os recursos. A comunidade internacional percebeu isso como uma chantagem", afirma. "As ambiguidades de Correa são uma das razões para que a comunidade internacional permanecesse afastada do projeto", complementa Espinoza.

Manobra política

Rafael Correa
Pressão da China teria influenciado CorreaFoto: Rodrigo Buendia/AFP/Getty Images

O contrato com as Nações Unidas demorou demais para sair – no meio do projeto houve uma mudança da equipe da iniciativa. E ainda: Correa se opôs à forma de administração do fundo, composta por uma maioria de representantes internacionais. Essas ações fizeram com que, em todo mundo, existissem dúvidas sobre a proposta de preservação.

Para Adalberto Veríssimo, do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), a compensação para evitar a exploração em Yasuní não serviu como estratégia para o manter a região preservada.

Na visão do pesquisador, a iniciativa de Yasuní não passou de uma manobra política de Correa para que, no fim, ele conseguisse uma desculpa para aprovar o polêmico projeto de exploração no parque – e sem essa desculpa, ele não teria apoio da população. Hoje o presidente garante que o projeto passaria por qualquer referendo popular no Equador.

"Qualquer tentativa de pedir que a comunidade internacional pague um recurso desse vulto está fadada a não dar certo. O Equador, para mim, a partir do momento que colocou essa proposta na mesa, já estava disposto explorar petróleo. O governo queria apenas criar um pretexto para, internamente, justificar o fato para a opinião pública", diz Veríssimo.

O ex-ministro Alberto Acosta vê um efeito preocupante para o resto da Amazônia. Para ele, toda a região perde com "o fracasso de uma proposta que caminhava para uma era pós-extrativista e que, sobretudo, forçava que os conceitos de 'desenvolvimento' e 'progresso' fossem repensados."