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Maxim Biller e as relações violentas

Ricardo Domeneck18 de julho de 2013

Autor alemão, que ganhou fama após a Reunificação, tem narrativas carregadas de fatores geográficos e culturais, muitas vezes marcadas pela relação entre judeus e a Alemanha.

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Foto: picture-alliance/dpa

Quando, em 1990, Maxim Biller estreou com o livro de contos Wenn ich einmal reich und tot bin (Quando eu estiver rico e morto, em tradução livre), em pleno momento de transição para uma Alemanha e de dissolução para a outra, foi celebrado como o retorno da literatura de sensibilidade judaico-alemã.

Com histórias tomadas pelo peso desta relação marcada por um problemático hífen – a judaico-alemã – Biller construía suas histórias de destruição e agressão mútua dentro de famílias e entre amantes. Cortantes e mordazes, seus textos uniam-se a uma lista de produção literária desiludida das possibilidades de gentileza entre iguais na literatura germânica, que já podia ser sentida desde o pós-guerra, se levados em consideração os textos de Heiner Müller, Thomas Bernhard, Peter Handke ou Elfriede Jelinek.

Em suas colunas satíricas para jornais como o Frankfurter Allgemeine Sonntagszeitung (Moralische Geschichten / histórias morais), ou para revistas como a edição alemã da Rolling Stone e a publicação Tempo (100 Zeilen Haß/100 Linhas de Ódio), o autor destilava sua ironia contra aspectos ou mesmo figuras centrais da cultura alemã.

Nascido em Praga em 25 de agosto de 1960, imigrou com os pais e a irmã (a também jornalista e escritora Elena Lappin) para a Alemanha Ocidental em 1970, aos 10 anos de idade. Estudou Literatura em Hamburgo e Munique e, após concluir o curso de jornalismo na capital bávara, passou a escrever para publicações como Der Spiegel e Die Zeit.

As décadas de 80 e 90 foram o período de sua produção jornalística, reunida em seu segundo livro, Die Tempojahre – Essays und Reportagen (Os anos de Tempo – ensaios e reportagens, 1991), e de suas narrativas curtas, como no volume de contos Land der Väter und Verräter (Terra dos pais e traidores, 1994) e na novela Harlem Holocaust (1998).

Para muitos, no entanto, a confirmação de sua chegada e seu livro mais celebrado viriam com o primeiro romance, Die Tochter (As filhas, 2000). Com tons fortemente alegóricos e uma narrativa marcada pela tradição, o livro conta a história de amor entre um soldado israelense, vivendo então na Alemanha, e uma alemã.

Uma relação culturalmente marcada pelas violências do passado de alemães contra judeus, mas também pelas violências dos últimos anos em Israel, nos territórios palestinos e em outras regiões do Oriente Médio, a narrativa viaja entre a Alemanha e Israel, por campos de concentração e pela Guerra do Líbano, na qual a personagem principal lutou.

Resenhando o livro para o Frankfurter Allgemeine Feuilleton, Thomas Wirtz escreveria que “Maxim Biller saiu da polêmica excitada e curta e saltou para ampla literatura – e pousou com dois pés firmes”.

Mas Max Biller atingiria sua celebridade na Alemanha de forma inusitada e certamente indesejada. Talvez ilustrando a própria violência das relações que ele mesmo retratara, ao lançar seu segundo romance, Esra (2003), o autor viu-se envolvido em uma peleja com uma ex-namorada e a mãe dela, quando elas acreditaram reconhecer-se em personagens do romance, retratadas de forma nada elogiosa.

Após uma batalha judicial, o autor viu seu romance proibido e condenado a uma multa de 50 mil euros por danos morais. A situação chamou a atenção da imprensa e da comunidade literária germânica, por suas óbvias implicações quanto à liberdade de expressão e criação. Escritores como os ganhadores do Nobel Elfriede Jelinek e Günter Grass, assim como os artistas Herbert Achternbusch e Peter Zadek assinaram uma carta em defesa do autor. A multa foi mais tarde cancelada, mas não a proibição do livro.

As próximas publicações de Maxim Biller apareceram nos mais diversos formatos: livros de reportagens e artigos para a imprensa, contos, textos para o teatro e memorialística. O autor foi traduzido para várias linguas e publicado tanto na prestigiosa revista The New Yorker (dois contos em tradução de Anthea Bell), como na mais importante editora francesa – a Gallimard (a tradução de seu romance Die Tochter).

Em um ensaio crítico sobre sua geração e partindo da publicação do primeiro romance de Rainald Goetz como marco histórico, Maxim Biller falou sobre um Ichzeit – “tempo do eu”. Mas escritores como Rainald Goetz e o próprio Maxim Biller talvez partam dos desastres da primeira pessoa do singular para mostrar como estes desastres começam e terminam na primeira do plural.