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Leia o trecho controverso da palestra de Bento 16

(gh)15 de setembro de 2006

Citação de uma parte de um diálogo entre imperador bizantino e estudioso persa sobre religião e violência desencadeou polêmica.

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Bento 16 falou a representantes do meio científico em RegensburgFoto: AP

Durante sua visita à Baviera, Bento 16 encontrou-se na última terça-feira (12/09) com cerca de 1500 representantes da área científica no auditório da Universidade de Regensburg, onde proferiu uma palestra intitulada "Fé, razão e universidade –lembranças e reflexões".

No papel do teólogo Joseph Ratzinger, o papa começou a exposição falando sobre os tempos em que atuou na Universidade de Bonn, e do contato que manteve na época com professores de outras disciplinas, além dos de Teologia. Ele lembrou que, apesar de haver casos de "ceticismo radical" em relação às faculdades de Teologia, "por tratarem de algo de não existe – Deus", nunca se duvidou na universidade de que era necessário e sensato questionar a existência de Deus através da razão e de fazer isso considerando a tradição da fé cristã.

Em seguida, ele proferiu o seguinte trecho polêmico de sua palestra (em tradução livre, a partir do texto original em alemão, publicado no site do Vaticano):

"Tudo isso novamente me veio à mente, quando, há pouco, li a parte do diálogo que o sábio imperador bizantino Manuel II Palaeologos manteve em 1391, na residência de inverno em Ancara com um estudioso persa sobre o cristianismo e o islã e ambas as verdades, e que foi editado pelo teólogo Theodore Khoury (Münster). O imperador provavelmente anotou o diálogo durante a ocupação de Constantinopla entre 1394 e 1402; assim se entende porque suas explicações são muito mais minuciosas do que as de seu interlocutor persa.

O diálogo abrange todo o espectro da estruturação da fé descrita pela Bíblia e pelo Corão e gira em torno da imagem de Deus e do ser humano, mas também sempre necessariamente em torno da relação das chamadas "três leis" ou "três ordens de vida": Antigo Testamento – Novo Testamento – Corão.

Aqui, nesta palestra, não desejo tratar disso, apenas tocar num ponto marginal da construção do diálogo, que, em relação ao tema fé e razão, me fascinou e que serve de ponto de partida para minhas reflexões sobre este tema.

Na sétima parte das conversações (Controversas), editada pelo professor Khoury, o imperador aborda o tema do jihad, da guerra santa. O imperador sabia, certamente, que na sura [capitulo do Corão] 2, 256 está escrito: Nenhuma coação em coisas da religião – trata-se de uma das mais antigas suras, como os peritos nos dizem, da época em que o próprio Maomé ainda era impotente e ameaçado.

Mas o imperador naturalmente conhecia também a determinação escrita no Corão – surgida mais tarde – sobre a guerra santa. Sem entrar em detalhes, como o tratamento diferenciado de "detentores da escrita" e "incrédulos", ele se dirige de forma brusca ao seu interlocutor, surpreendentemente brusca para nós, simplesmente com a questão central da relação entre religião e violência: "Mostre-me então, o que Maomé trouxe de novo, e ali só encontrarás coisas más e desumanas, como esta, de que ele determinou, que se propague através da espada a fé que ele prega".

Após ter atacado deste jeito, o imperador argumenta, então, pormenorizadamente, por que a propagação da fé através da violência é absurda. Ela está em contradição com a essência de Deus e da alma. "Deus não tem prazer no sangue", diz ele, "e agir de forma irracional contraria a essência de Deus. A fé é fruto da alma, não do corpo. Quem, portanto, pretende conduzir alguém à fé, precisa da habilidade do bom discurso e de um raciocínio correto, mas não de violência e ameaça... Para convencer uma alma sensata, necessita-se não de seu braço, não de instrumentos de agressão nem de outros meios pelos quais se pode ameaçar alguém de morte ..."

A frase decisiva nesta argumentação contra a conversão pela violência é: agir de forma insensata contraria a essência de Deus".