1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Karlheinz Stockhausen: santo das galáxias

Oliver Schilling (sm)19 de outubro de 2005

Os Beatles se inspiraram neste compositor de vanguarda. Karlheinz Stockhausen intriga, seja ao usar helicópteros em suas composições ou ao escrever o mais extenso ciclo musical do mundo.

https://p.dw.com/p/73oi
A vida imita a arteFoto: AP

No início de julho de 1995, a minúscula praça em frente ao teatro Westergasfabriek, em Amsterdã, foi transformada em heliporto. Acompanhados de um barulho ensurdecedor, pousam diante do edifício antigo quatro helicópteros alugados por Karlheinz Stockhausen para a estréia da excêntrica obra Helikopter-Quartett (Quarteto para Helicópteros). Enquanto o público espera atônito pelo início da apresentação, os membros do renomado quarteto de cordas Arditti sobem nos helicópteros e começam o concerto. A apresentação aérea é transmitida em som e imagem na sala de concertos.

"Neuroticamente bela"

Ouvintes e compositores reagem a Stockhausen de forma semelhante. De duas uma: ou eles o amam ou o odeiam. Os críticos, todavia, são unânimes. Karlheinz Stockhausen é um dos mais talentosos e influentes compositores alemães do pós-guerra. Suas composições são altamente complexas; as peças, desarmônicas e abstratas. John O'Mahony, crítico de música do jornal britânico The Guardian, qualificou a música de Stockhausen de "neuroticamente bela".

Nascido na cidade de Mödrath, na Renânia, a vida do futuro compositor transcorreu de forma semelhante à de muitos jovens alemães de sua geração, obrigados a começar tudo do zero depois da Segunda Guerra. Após a morte dos pais e de traumáticas experiências de guerra, Stockhausen passou um tempo ganhando a vida com trabalhos circunstanciais. Tocando em piano bars, por exemplo.

Jam sessions atonais

Stockhausen estudou Música, Letras Germânicas e Filosofia na Universidade de Colônia. Depois se transferiu para a Universidade de Bonn, onde freqüentou os cursos de Fonética e Comunicações. De 1952 a 1953, estudou em Paris com o compositor Olivier Messiaen (1908-1992), influente professor de expoentes da música nova como Pierre Boulez, Iannis Xenakis e György Kurtág.

Stockhausen não demoraria a se tornar conhecido por seu trabalho. Gravações experimentais feitas no início dos anos 50 nos estúdios da emissora WDR levaram-no a conquistar reconhecimento internacional e a conhecer pessoalmente compositores como John Cage e músicos como o pianista David Tudor.

Nos anos 60, Stockhausen teve um papel decisivo no movimento Fluxus, interessado em abolir os limites tradicionais entre arte e sociedade. Ele trabalhou em Nova York com artistas de vanguarda, como Nam June Paik e Allen Ginsberg, e desenvolveu seu interesse pelas artes visuais.

Karlheinz Stockhausen
Karlheinz StockhausenFoto: picture-alliance / dpa

Nas décadas de 60 e 70, Stockhausen deu aula em diversas universidades: em Basiléia, na Pensilvânia, em Filadélfia, na Califórnia e em Colônia. Na Exposição Mundial de Osaka, no Japão, ele se apresentou diante de quase um milhão de pessoas. Sua música foi tocada duas vezes por dia durante os seis meses de duração da exposição.

Ele também trabalhou com músicos de rock. Stockhausen consta da montagem de retratos na capa do álbum Sergeant Pepper, dos Beatles. Sua amizade com John Lennon sobreviveu à dissolução da banda.

Não só as composições pioneiras de Stockhausen chamaram atenção pública: sua vida privada também. Quando sua segunda mulher, Mary Baumeister, entrou com o pedido de divórcio, ele começou uma greve de fome que durou sete dias. Depois viria a dizer que essa ruptura inaugurou uma nova fase da sua vida, na qual ele se distanciou de sua antiga abordagem musical eletrônica.

Sexta-feira de Luz

Nos anos 70, Stockhausen começou a trabalhar no ciclo de ópera épico Licht (Luz), cuja apresentação integral aconteceu somente em outubro de 2004. A obra consiste de sete partes intituladas como os dias da semana. O ciclo completo dura mais de 29 horas, representando a composição mais longa da história da música. Luz não ultrapassa somente os limites usuais da performance musical, mas também as possibilidades financeiras da maioria dos organizadores de concertos.

O Centro Europeu de Artes de Hellerau, em Dresden, pretende encenar o ciclo integral de Luz em 2008, por ocasião dos 80 anos de Stockhausen. A produção deverá custar dez milhões de euros, caso seja realmente realizada, ao contrário de outras tentativas anteriores.

Em 1996, a Ópera de Leipzig fez um investimento gigantesco para montar Sexta-feira, de Luz. De Bonn a Tóquio, outros produtores já haviam se recusado a fazer as vontades especiais de Stockhausen. Até mesmo contratos de encenar parcialmente a obra foram cancelados.

Vida de eremita

Desde que começou a trabalhar no ciclo Luz, em 1977, Stockhausen se afastou quase que inteiramente da vida pública. Nos últimos anos, ele raramente saiu de casa. Manfred Fuhrmann, crítico de música do diário alemão Berliner Zeitung, escreve que Stockhausen construiu uma visão de mundo absolutamente individual, na qual todos os acontecimentos mundanos representam uma obra de arte.

Essa visão de mundo se espelha naquilo que ele disse logo após o 11 de setembro de 2001. Stockhausen qualificou os atentados em Washington e Nova York como a maior obra de arte imaginável – uma observação que desencadeou indignação internacional e críticas severas.

O compositor György Ligeti acusou Stockhausen de endossar ações terroristas. Concertos de Stockhausen programados para o Festival de Música de Hamburgo foram cancelados na ocasião. Posteriormente, Stockhausen justificou que não apoiava os atos de terror, mas simplesmente ficara fascinado com a determinação dos terroristas.