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Justiça em braile

mw15 de janeiro de 2003

Cegueira física não é impeditivo para alguém fazer justiça. Na Alemanha, existem 54 juízes com deficiências visuais – total ou parcial. Justiça criminal, porém, não admite cegos.

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Equipamento especial para o trabalho dos cegos ao computadorFoto: AP

A escrivaninha de trabalho de Steffen Humenda, no Tribunal de Mühlhausen, no Estado da Turíngia, não é muito diferente das dos demais juízes. Sobre a mesa, volumosos códigos legais, obras de consulta, vade-mécuns e outros livros. Entre eles, anotações em braile. Ali Humenda estuda processos, faz apontamentos e atende ao telefone. A labuta do juiz cego soa diferente quando o computador recita em voz alta trechos da legislação, anteriormente escaneados e arquivados.

Humenda perdeu a visão na adolescência. O exame de acesso à universidade já foi realizado em braile, assim como as provas de admissão para o Tribunal Estadual de Mühlhausen. Desde 1995, o jurista cuida, na câmara civil de recursos, de reivindicações de indenização em casos de locação, trânsito, construção e comércio.

Uma vez por semana, Humenda reúne-se com dois colegas na sala de sessões para juntos julgarem até oito processos. "Nos julgamentos não importa que eu seja cego", comenta o juiz de 37 anos, pai de dois filhos e músico por hobby. "Posso ver as pessoas também sem os olhos", acrescenta.

"Sinto prazer em mediar", continua o homem da lei, embora a queda de braço entre as partes em processos civis aconteça exclusivamente através de meios jurídicos. Na Justiça criminal, não se aceitam cegos, pois considera-se fundamental que o juiz possa olhar as testemunhas, olho no olho.

Em seu gabinete, Humenda tem o auxílio de Elke Otto. Ela lê textos para o juiz, busca fontes e leis na biblioteca, prepara a fundamentação para sentenças. O jurista cego nega que precise de memória excepcional para seu trabalho. Muito mais importante é adotar um método próprio. Por exemplo, ele guarda sentenças num fichário e dispôs os diretórios de seu computador com um jeito pessoal.

Informática facilita o trabalho

O sistema com que trabalha atualmente traduz documentos escaneados para a linguagem braile. Através de combinações de pontos, ele tateia letras e palavras. Outra opção é consultar CDs e disquetes, com softwares que apresentam versões em áudio da legislação. Da mesma forma, Humenda pode ouvir os e-mails que recebe. Por outro lado, o juiz pode redigir notas e textos em braile, que seu computador os traduz para o alfabeto convencional.

Difícil é a leitura de anotações manuais, gráficos e outras formas de provas que não podem ser escaneadas. Para gráficos, por exemplo, existem quadros, cobertos com papel especial, que permitem assim que cegos possam interpretar os desenhos.

Em Mühlhausen, Humenda tem ainda mais um colega cego: Manfred Tröger. Ambos são os únicos magistrados deficientes visuais totais na Justiça da Turíngia. Em toda a Alemanha, eles são 54 juízes, quatro procuradores e 22 advogados – ao todo 213 homens e mulheres em atividades no meio jurídico –, segundo a Associação dos Profissionais Cegos e Deficientes Visuais (DVBS), sediada em Marburg.

"Até hoje, só tivemos boas experiências", diz Rudolf Metz, presidente do Tribunal de Mühlhausen. Em breve, a corte receberá o reforço de uma juíza deficiente visual.