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Jornal acusa escritor de anti-semitismo e detona polêmica

Laís Kalka31 de maio de 2002

O "Frankfurter Allgemeine Zeitung" recusou-se a publicar capítulos de um romance ainda não lançado de Martin Walser, acusando o autor de anti-semitismo.

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O crítico de literatura Marcel Reich-Ranicki, pivô da polêmicaFoto: AP

Em carta aberta publicada em sua edição de quarta-feira (29) e assinada por um de seus cinco editores e responsável pelo caderno de cultura, Frank Schirrmacher, o diário Frankfurter Allgemeine Zeitung recusou-se a adiantar a publicação de capítulos do novo romance de Martin Walser, Tod eines Kritikers (Morte de um Crítico).

Acusações –

"Seu livro é uma execução", um "documento do ódio" e brinca com o "repertório de clichês anti-semitas", afirma Schirrmacher, referindo-se ao enredo e à personagem principal do livro de Walser. O romance trata do pretenso assassinato de um crítico da literatura por um autor que se sente prejudicado por ele.

No livro, o poderoso crítico, André Ehrl-König, é descendente de judeus e logo foi identificado pelo FAZ como uma alusão ao "papa" da crítica na Alemanha, Marcel Reich-Ranicki, de 82 anos, judeu de origem polonesa que sobreviveu ao Holocausto e com quem Walser mantém um relacionamento tenso. Em entrevista a uma emissora de rádio, o autor confirmou ter se inspirado em Reich-Ranicki, mas acentuou que a personagem de um romance "nunca é idêntica" a uma pessoa de verdade.

"Não se trata do assassinato de um crítico em sua condição de crítico [...] a questão é o assassinato de um judeu", consta da carta de Schirrmacher. E ainda a afirmação de que o assassinato, a investigação, tudo "brinca com a lembrança do genocídio praticado pelos nazistas".

Autor defende-se –

Martin Walser admite ter citado numa passagem de seu livro que, entre os antepassados de sua personagem principal, há judeus. "Mas para mim isso é o que tem menos importância", afirma ele numa declaração publicada ainda na quarta-feira. Para ele, o principal acento recai não sobre o judeu e sim sobre o crítico.

"O livro trata das experiências de um autor com o exercício do poder, no setor da cultura, nesta época dominada pela televisão", afirma Walser. "Nunca, jamais eu teria imaginado que ele seria relacionado com o Holocausto", mesmo porque "não acontece assassinato nenhum". No final do romance, fica-se sabendo que o crítico não foi morto, mas estava apenas desaparecido.

O autor acusa ainda Schirrmacher de ter reduzido o significado de seu livro a um aspecto e que a única leitura possível agora será a busca da confirmação ou não do anti-semitismo.

A editora Suhrkamp também acusa o jornal de oportunismo, por ter detonado uma polêmica em torno de um assunto de grande atualidade, citando de um livro cujo manuscrito ainda não foi totalmente revisado. O lançamento, que estava previsto para agosto, talvez seja antecipado para junho.

O que diz o crítico –

Marcel Reich-Ranicki, que em outras ocasiões já fizera críticas bastante negativas a obras de Martin Walser, recusou-se inicialmente a pronunciar-se sobre a atual polêmica. Manifestou-se, porém, no jornal Die Welt desta sexta-feira (31): "O romance me abalou, ofendeu e doeu profundamente". Além disso, afirma ele, "Walser nunca escreveu tão mal como agora". Em sua opinião, o livro é obra de um autor que "perdeu o autocontrole".

O debate sobre o livro ainda não lido por ninguém vem se acirrando nestes dias: todos os órgãos da imprensa comentam o assunto e inúmeros intelectuais já se pronunciaram, alguns em defesa, muitos condenando Martin Walser.