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'Cultura da inveja'

Carlos Albuquerque27 de fevereiro de 2007

Pobres contra ricos, jovens contra velhos, Leste contra Oeste, protestos contra altos salários dos executivos. Um documentário procura esclarecer se a cultura da inveja é algo "tipicamente alemão".

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Debates sobre a inveja fazem ricos evitarem publicidadeFoto: BilderBox

Quando os irmãos Immler, dois empresários do ramo da construção civil, financiaram uma escola para sua cidade na região da Suábia, não esperavam a reação de seus conterrâneos: eles se viram rodeados de inveja. Os aplicados construtores resolveram então fazê-la tema em sua cidade.

Em vez de financiarem a ampliação do prédio escolar, resolveram construir, na sua frente, a "fonte do carneiro da inveja" ou "fonte do invejoso", onde uma figura humana com cabeça de carneiro cospe sobre aquilo que muitos invejam: a felicidade dos outros.

Neidhammel, literalmente "carneiro da inveja", é o nome do documentário de Tilo Knops e Kirsten Waschkau que a rede de televisão de direito público ARD levou ao ar em fins de janeiro último. Segundo a emissora, os autores, que já se dedicaram a pesquisas sobre avarentos, brigões e pedantes, pesquisam neste filme se a cultura da inveja é algo "tipicamente alemão".

Debates da inveja

Deutschland Fernsehen ARD Film Neidhammel Die deutsche Neidkultur
Irmãos Immler posam junto à "fonte do invejoso", em IsnyFoto: PHOENIX/SWR /T.Knops/K.Waschkau

Razões para tal não faltam. Principalmente na área econômica, proliferam os assim chamados "debates da inveja" (Neiddebatten), que chegaram até mesmo ao Parlamento alemão.

Por ocasião da elevação de 3% do imposto sobre a riqueza (Reichensteuer), políticos conservadores, como Peter Ramsauer, vice-líder da bancada dos partidos da União Democrata Cristã (CDU) e União Social Cristã (CSU) no Parlamento, o chamaram de "imposto sobre a inveja" (Neidsteuer).

A expressão "debates da inveja" também é utilizada, hoje na Alemanha, para discussões como os protestos contra os altos salários de executivos, a divisão dos custos entre gerações, sem falar na relação entre os ricos alemães do Leste e os pobres alemães do Oeste.

"Inveja" tornou-se expressão política

Kompetenzteam: Dieter Althaus Ministerpräsident Thüringen, Porträt
Dieter Althaus: 'debates insuportáveis'Foto: AP

Em entrevista à revista Cicero, Dieter Althaus (CDU), governador da Turíngia, comenta que "todo 'debate sobre a inveja' leva à separação daqueles que invejam uns aos outros. Se a política reforça tal tendência, incitando Oeste contra o Leste, pobres contra ricos, jovens contra velhos, ela não presta nenhuma contribuição à sociedade. Por isso, é importante estimular o valor e a potencialidade de cada um destes grupos. 'Debates em torno da inveja' são insuportáveis", afirmou o político.

Maria Jepsen, bispa luterana de Hamburgo, acredita que a inveja tornou-se quase um termo político na Alemanha. Jepsen, que é a primeira bispa luterana do mundo, não acredita que uma sociedade possa ser invejosa. Inveja seria algo pessoal, afirma ela, acreditando que alegria de viver e humildade seriam o melhor remédio para o caso.

Novos ricos

Luxuslimousine vor dem Kaufhaus Stockmann in Riga
Limusine em Riga, na LetôniaFoto: picture-alliance / dpa/dpaweb

Enquanto constata um boom de artigos de luxo em países como China, Índia e Rússia, o jornal Financial Times Deutschland vê a diminuição do consumo destes artigos, por parte dos mais abastados da Alemanha e de outros países europeus, também como conseqüência de campanhas recentes de marketing, como "Geiz-ist-geil" (avareza é bom) e também devido aos "debates sobre a inveja".

"Os ricos daqui evitam a publicidade", afirma Harald Münzberg, da empresa de consultoria Capgemini, em entrevista ao FTD. "Isto é bem diferente no Leste Europeu e na China". Enquanto na Alemanha, é preciso manter-se no understatement, em outras regiões, as pessoas insistem em ostentar seu bem-estar.

Alemães invejosos?

"Será que a inveja está aumentando na Alemanha, enquanto em países como os EUA, é possível se ter mais respeito pelo rendimento dos outros e orgulho daquilo que se conseguiu?", perguntam os diretores de Neidhammel.

Em busca de respostas, os cineastas entrevistaram invejosos e sociólogos alemães e norte-americanos. Apesar de dois terços dos alemães se reconhecerem como invejosos, segundo pesquisas atuais, a conclusão do documentário é a de que os norte-americanos não são menos invejosos que os alemães.

Na Alemanha, entretanto, comenta-se mais sobre a inveja. Principalmente, sobre a inveja dos outros.