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Influência internacional

1 de outubro de 2010

Philip Zelikow fala da diminuição do poder da Alemanha desde a queda do Muro de Berlim e sugere como o país poderia contribuir para a resolução de problemas de ordem global.

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Philip Zelikow acompanhou a reunificação alemãFoto: picture alliance/dpa

Quando foi Consultor de Segurança Nacional do governo George W. Bush, Philip Zelikow trabalhou recorrentemente com o tema da reunificação alemã. Junto com Condoleezza Rice, escreveu o livro Germany Unified and Europe Transformed: A Study in Statecraft (1995), que enfoca a Alemanha após a queda do Muro e seu impacto na Europa.

Philip Zelikow é professor de História da Universidade de Virgínia e foi diretor executivo da Comissão do 11 de Setembro. Em entrevista à Deutsche Welle, ele fala sobre sua visão a respeito da influência internacional do país antes e depois da reunificação.

Deutsche Welle: Enquanto antes da queda do Muro de Berlim a maioria dos políticos alemães apoiava retoricamente o princípio da reunificação, poucos acreditavam que isso sequer aconteceria enquanto estivessem vivos. Antes das coisas começarem a se desenrolar na então Alemanha Oriental, o senhor e outras autoridades norte-americanas achavam que o país seria reunificado pacificamente ainda na sua geração?

Philip Zelikow: Na primavera de 1989, muitos de nós passaram a acreditar que isso era possível. Por isso recomendamos por escrito ao então presidente Bush que colocasse a unificação da Alemanha em pauta como algo prioritário e que desse destaque ao assunto.

E isso levou a uma série de declarações do presidente Bush (sênior) e o então chanceler federal alemão Helmuth Kohl. Bush afirmou repetidas vezes antes da queda do Muro de Berlim que apoiava a reunificação alemã e que se sentiria grato em ver isso acontecer. Em meio à instabilidade na Europa Oriental, tais comentários tiveram grande impacto.

Voltando ainda mais no tempo, antes de 1985 o senhor pensou que a reunificação alemã fosse possível?

Achei que fosse improvável. Em meados de 1980, quando participei de debates como o da redução de armas estratégicas, nos resignamos ao fato de que a Europa permaneceria dividida em um futuro próximo. Achamos que era trágico.

No fim de 1988, diferentes figuras notáveis, incluindo a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, declararam felizes que a Guerra Fria havia acabado. Aquela não era minha visão. Na minha opinião, a Guerra Fria não tinha acabado, pois a Europa ainda estava dividida.

A Guerra Fria não era apenas um confronto militar. O ponto fundamental desta guerra, que de certa forma se remete à revolução russa, era como iríamos organizar essas sociedades modernas na Europa. E como essas comunidades poderiam escolher livremente a forma como querem organizar suas vidas e seus países. Essa questão nunca foi estabelecida.

Quando ficou incerto se a União Soviética tinha interesse ou habilidade de usar força militar para matar pessoas na intenção de manter o poder como fizera em 1953, em 1956 e em 1968 e na Polônia, com a lei marcial, tudo se tornou possível.

Quais eram os objetivos estratégicos dos Estados Unidos em estabelecer conversas sobre o futuro da Alemanha, as chamadas conversas 2+4?

A estratégia dos Estados Unidos em 1989 e 1990 foi acelerar o processo rumo à reunificação da Alemanha. E a pergunta era como poderiam os Estados Unidos e a República Federal da Alemanha trabalhar juntas para alcançar esse objetivo de forma pacífica.

Uma das ideias que foi desenvolvida primariamente pelo [então Secretário de Estado James] Baker e seus colegas do Departamento de Estado era criar esse sistema chamado de negociação 2+4.

Nós da Casa Branca ficamos reticentes com isso, porque embora compartilhássemos de um objetivo, nossa preocupação era que o processo fosse usado como instrumento para retardar o caminho rumo à reunificação.

Temíamos que se transformasse em uma arma para os soviéticos bloquearem as negociações. Mas Baker e sua equipe trabalharam essa questão. O 2+4 era um instrumento essencial para negociar um processo que levasse à reunificação. Ele efetivamente se tornou um comitê, com numerosas outras negociações sendo acertadas em diferentes aspectos, incluindo o futuro das forças armadas na Europa e o exército da Alemanha.

O objetivo principal dos Estados Unidos era acelerar a reunificação pacífica da Alemanha e fazê-lo de uma forma que assegurasse o resto da Europa que uma Alemanha unificada não representaria perigo.

Isso significava uma Alemanha que poderia escolher livremente se queria ficar nos sistemas econômico e de segurança ocidentais. O país havia feito escolhas históricas reais acima de tudo nos anos 1950 quando estava em busca de sua identidade nacional como parte da identidade europeia e do Atlântico. Essas decisões tranquilizavam muitas pessoas e foram a base para o sucesso político internacional da Alemanha nos anos 1960, 1970 e 1980.

Quais foram os aspectos ou momentos que mais o surpreenderam durante as negociações sobre a resolução das questões da Alemanha?

Houve tantos momentos. Eu estava em Ottawa com Jim Baker quando o acordo 2+4 foi firmado. Mas ocorreu algo que parece anedótico. Houve um encontro de ministros em Moscou para acertar algumas questões finais, mas o documento básico foi concluído em agosto de 1990. E ao final deste encontro, um representante da Alemanha Oriental nos mostrou uma pintura de um corredor de escritório de um tipo bem banal e comum. Mas se tratava de uma imagem bem peculiar.

E todos nós ficamos confusos por ele nos ter dado uma ilustração tão curiosa ao final de um encontro histórico. Ele explicou: "Essa imagem que vocês estão vendo é a cena que milhares de alemães-orientais são obrigados a ver, pois é a sala de espera dos que se inscrevem para receber permissão de viagem ao Ocidente.

Eu darei para vocês essa imagem para que lembrem que, com o trabalho que estamos fazendo, nenhum alemão-oriental tenha que enfrentar isso novamente".

Os Estados Unidos tinham grandes esperanças no papel que a Alemanha unificada poderia representar no mundo. Em 1990, o presidente Bush memoravelmente ofereceu à Alemanha uma parceria de liderança. Olhando para a Alemanha 20 anos após a reunificação, qual sua impressão do papel internacional do país?

Bem, estranhamente, o papel internacional da Alemanha hoje é provavelmente menos impactante do que era em 1990 ou 1989 e menos impactante do que foi 20 anos antes disso. Creio que os últimos 20 anos foram de debates e discussões sobre como a Alemanha se tornaria um país normal.

E acredito que de certa forma ela se tornou uma nação bem normal, bastante preocupada com interesses locais e com as enormes fronteiras, e forças para construir uma nação unificada e para incorporar a antiga Alemanha Oriental, o que tem sido um processo difícil e caro. E com essas preocupações o papel da Alemanha no mundo, que tem sido muito importante desde o período de Guerra Fria, foi, na verdade, reduzido.

Agora, para ser justo, o papel da Alemanha na União Europeia se mantém vitalmente importante e o país continua sendo um pilar na UE. É difícil apontar apenas uma questão diplomática em que Alemanha tenha desempenhado um papel fundamental de liderança para resto da Europa.

E tem sido muito difícil para os alemães as parcerias em assuntos de risco fora da Europa. Sua participação na missão no Afeganistão foi claramente um assunto complicado, pois o tema é polêmico dentro do país.

Tem sido difícil para a Alemanha descobrir exatamente como encontrar seu espaço no mundo político. O país tinha um lugar muito claro no contexto da Guerra Fria e agora que se tornou uma nação normal não achou um papel comparável ao de antes.

Creio que os alemães têm uma série de qualidades que podem empregar para nos ajudar a construir coalizões importantes e lidar com alguns dos problemas globais mais importantes, como problemas econômicos, de desenvolvimento internacional e muitas outras coisas onde acredito que a Alemanha possa ser uma poderosa força positiva.

Entrevista: Michael Knigge (mda)
Revisão: Roselaine Wandscheer