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Aquecimento global

16 de novembro de 2007

Reunidos na Espanha, peritos da ONU fazem resumo de relatórios sobre o clima baseados em dados em parte ultrapassados. Síntese do IPCC será uma espécie de manual para negociações da cúpula mundial do clima em Bali.

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Advertência do Greenpeace em Valência: 'Salvem o clima'Foto: AP

O ser humano aquece a atmosfera através de gases do efeito estufa e, com isso, põe em risco a vida de milhões de habitantes do Planeta. É o que aponta com clareza inédita o relatório de 2007 sobre o clima, publicado pela Organização das Nações Unidas (ONU).

As 15 mil páginas do complexo documento foram resumidas por cerca de 2.500 cientistas do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), reunidos esta semana em Valência, na Espanha.

Uma síntese de dez páginas será apresentada neste sábado (17/11) pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, e servirá de base para as negociações na cúpula mundial do clima em Bali, em dezembro próximo.

O trabalho dos peritos do IPCC, fortalecido pelo Prêmio Nobel da Paz, no entanto, não é imune a críticas. Como o resumo precisa ser aprovado por 130 governos, "briga-se por cada frase e palavra", explica o professor Olav Hohmeyer, da Universidade de Kiel, vice-presidente do Grupo de Traballho 3 do IPCC, que trata da adaptação do ser humano à mudança climática.

Consenso forçado

A obrigação de chegar a um acordo implica o risco de que o texto se torne vago, admite o pesquisador alemão. "Mas esse é o preço pago para que o relatório seja consensual. E disso depende o seu significado para a cúpula de Bali", afirma.

Segundo Hohmeyer, "governos que pouco querem fazer contra a mudança do clima temem relatórios-síntese como o diabo foge da cruz. Os norte-americanos e os sauditas quiseram impedir uma síntese ou pelo menos adiar sua publicação para janeiro de 2008, depois da conferência de Bali".

O Ministério alemão do Meio Ambiente acusou os EUA de bloquear as negociações a portas fechadas em Valência. Apesar dos fatos incontestáveis do IPCC, os EUA novamente tentam relativizar o vínculo entre as emissões de gases do efeito estufa causados pelo ser humano e as mudanças climáticas, disse na quinta-feira (15/11), o vice-ministro Michael Müller.

"O relatório-síntese vai mostrar que é urgente agir. E ninguém poderá dizer que não teve tempo de ler um documento de dez páginas. As notícias serão tão simples que vão gerar uma pressão para a ação", afirma Hohmeyer.

Novos dados

Mas o relatório também tem um ponto fraco – seus dados mais recentes são de meados do ano passado. Ele não inclui, por exemplo, o estudo de outubro de 2006 do economista Nikolaus Stern, diretor do programa do governo britânico de proteção ao clima , segundo o qual é mais barato frear a mudança climática agora do que pagar suas conseqüências durante décadas.

Um estudo recente feito por Stefan Rahmstorf, do Instituto de Pesquisas dos Efeitos do Clima, de Potsdam, aponta que o nível dos mares deve subir mais do que os 20 a 60 cm previstos no relatório do IPCC. Muitos pesquisadores e o WWF consideram possível uma subida do nível do mar de até 1,4 metro ainda neste século.

Há ainda outros resultados de pesquisas não incluídos no relatório. "Do contrário, ele seria uma advertência ainda mais forte", diz Stefan Singer, diretor do escritório europeu de política climática e energética do WWF (Fundo Mundial para a Natureza).

"O que o IPCC apresenta é um consenso extremamente conservador. A nova literatura, que não foi considerada, é mais dramática", diz Singer. "A mudança do clima é mais rápida do que previam nossos piores cenários há cinco ou seis anos", acrescenta Hans Verolme, perito em clima do WWF.

O WWF, que junto com outras organizações ambientalistas presta assessoria ao IPCC, considera o trabalho do painel "lento e atrasado demais". Segundo o Instituto de Estudos Internacionais e Estratégicos (CSIS), de Washington, nos últimos 20 anos, as previsões dos peritos sobre mudança climática sempre estiveram atrasadas em relação à realidade.

"Profetas do pânico climático"

Klimakonferenz Valencia Eröffnung
Pachauri (d) e a vice-primeira-ministra espanhola, Maria Teresa Fernandez de la Vega, na conferência de ValênciaFoto: AP

Um motivo para isso poderia ser o fato de que os cientistas querem evitar a polêmica e o rótulo de "profetas do pânico climático", segundo o CSIC. Uma outra causa seria estrutural.

Desde 1988, a cada cinco ou seis anos, o IPCC publica relatórios sobre o clima. Seus membros não fazem pesquisas, apenas compilam e analisam dados já disponíveis e fazem recomendações. No geral, esses documentos são considerados bem fundamentados por causa do rigoroso controle dos dados.

Justamente esse controle transformou-se num problema: os relatórios do IPCC não acompanham o ritmo das pesquisas. A elaboração por dezenas de cientistas chega a durar três anos e os textos são publicados com pelo menos um ano de atraso.

Os peritos do IPCC avaliam a lentidão e a cautela como algo positivo. "Os cientistas esperam a comprovação de resultados antes de apontarem uma tendência. Ao evitar um tom alarmista, eles ganham mais credibilidade", justifica o holandês Bert Metz, um dos principais autores do IPCC.

Diante das críticas à lentidão dos chamados "gurus do aquecimento global", o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, sugeriu em Valência que o painel não só faça previsões sobre o futuro do clima como também discuta o próprio futuro. (gh)