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Guerra divide políticos alemães

Sonia Pahlnikar / Ruth Elkins5 de fevereiro de 2003

Em entrevista à DW-WORLD, o deputado verde W. Hermann critica o imperialismo americano e defende a posição de Berlim, enquanto o democrata-cristão Jörg Schönbohm considera desastrosa a política externa de Schröder.

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Winfried Hermann (à esquerda) e o ex-general, hoje político, Jörg SchönbohmFoto: AP

Se dois anos atrás 64% dos alemães eram favoráveis a uma intervenção americana no Afeganistão, agora apenas 9% aprovariam uma guerra contra o Iraque, segundo uma pesquisa representativa realizada a nível internacional pelo Instituto Gallup.

O governo alemão foi o primeiro europeu a se posicionar claramente contra a guerra, despertando inicialmente uma sensação de estranheza na União Européia e provocando uma crise nas relações da Alemanha com os Estados Unidos.

Embora a maioria dos alemães seja contrária a uma – por enquanto virtual – guerra contra o Iraque, as opiniões são diferenciadas. A DW-WORLD entrevistou dois políticos alemães, de dois partidos que se situam nos extremos do espectro político: o deputado verde Winfried Hermann e o secretário do interior de Brandemburgo, Jörg Schönbohm, da União Democrata Cristã, o maior partido de oposição ao governo federal.

Pacifista desde o berço

O Partido Verde alemão – parceiro de coalizão dos social-democratas em Berlim – é pacifista por tradição, muito tendo relutado em apoiar mesmo que uma participação alemã na reconstrução do Afeganistão.

Segundo Hermann, seu partido e o SPD do chanceler federal Gerhard Schröder fecharam posição contra a guerra, não havendo diferença alguma nesse ponto. Berlim está convicto de que o Iraque não faz parte da rede internacional que sustenta o terrorismo. Uma guerra seria muito prejudicial para a população iraquiana, iria desestabilizar a região, provando o caos. "Indiretamente uma guerra ajudaria os terroristas, porque no mundo árabe e em muitos países pobres predomina a opinião de que o Ocidente – e especialmente os EUA – é oportunista, usa indiscriminadamente os recursos do planeta, pressiona o resto do mundo a seguir a sua linha e sustenta governos, para depois atiçar uma guerra contra eles quando bem entendem."

O principal temor do deputado é que o Conselho de Segurança formule uma nova declaração simplesmente condenando o Iraque por não colaborar com os inspetores de armas, mas sem dizer "sim" ou "não" a uma guerra. Isso abriria uma brecha para que Washington dê a ordem de atacar, dando a impressão de não violar o direito internacional. Hermann considera que uma guerra seria de qualquer forma uma violação e por isso o governo alemão teria negado as armas requeridas pelos EUA.

Antikriegsdemonstration in Köln
Manifestação em Colônia contra a guerraFoto: AP

O dilema da Alemanha – entre sua posição pacifista de um lado e os compromissos assumidos como aliado da OTAN, de outro – fica explícito no caso concreto dos aviões de reconhecimento Awacs, que o deputado expôs na entrevista: eles só poderão sobrevoar território da OTAN. Os soldados alemães que fazem parte de sua tripulação deixarão de integrá-la se os Awacs forem usados para localizar alvos no Iraque.

Big Brother

na escuta

Quanto à crise nas relações Berlim/Washington, Winfried Hermann chamou de "tabu no pensamento internacional" achar que não se deve criticar os aliados. "Às vezes é preciso fazê-lo, principalmente quando se vê que eles estão cometendo graves erros", ponderou. Sobre os danos no relacionamento com os EUA, disse que que a nova política de Bush é perigosa e que ele não deverá ter êxito, mas que dentro de alguns anos esse período será encarado de outra maneira: como o momento em que os Estados Unidos trataram de dominar o mundo mas, na verdade, seu poder começou a diminuir.

"A história nos ensina que as superpotências sempre chegam a um ponto em que forçam demasiado seu poderio, instigando a resistência contra elas em todo o mundo", disse, lembrando que seria trágico se os rumos da história forem ditados por um político que se elegeu com apenas mil votos a mais do que seu adversário, Al Gore.

Depois de referir-se a uma animosidade pessoal entre Schröder e Bush, o deputado do Partido Verde fez uma observação muito curiosa, ao atribuir o "azedamento" das relações em parte à espionagem da CIA. O serviço secreto americano, segundo ele, tem seus tentáculos em todo o mundo e não hesita em "grampear" os aliados. "O presidente Bush está furioso com os alemães porque ele sabe, através do serviço de inteligência, o que os alemães realmente pensam sobre ele!"

Schröder pôs a carroça diante dos bois

Secretário do Interior de Brandemburgo pela União Democrata Cristã, Jörg Schönbohm é general reformado das Forças Armadas alemãs, onde pertenceu ao alto escalão.

Demonstrant gegen Krieg in Berlin
Protesto em BerlimFoto: AP

O maior erro do chanceler federal Gerhard Schröder, para o ex-general, é haver tomado a decisão de opor-se à guerra antes de conhecer os fatos, isto é, o relatório dos inspetores de armas. O seu não à guerra sob qualquer circunstância ocorre quando aliados dos EUA, como a Grã-Bretanha e a Austrália, deslocam efetivos para pressionar Saddam Hussein a cumprir as resoluções da ONU.

A posição de Schröder, por outro lado, além de prejudicar as relações com Washington está minando também o que Schönbohm chamou de pilar europeu, isto é, a criação de uma política de segurança comum da União Européia. Neste contexto de isolamento da Alemanha no cenário internacional, o político democrata-cristão considerou uma ironia do destino que tenham sido justamente o chefe de governo alemão e o presidente francês a propor uma espécie de ministro do Exterior da UE.

Sobre a França, o ex-general questionou que a posição de Jacques Chirac por ocasião dos festejos dos 40 anos do tratado de amizade teuto-francês não significa um não definitivo ao uso de força militar contra o Iraque. Paris refletiu muito antes de dar seu apoio quando da primeira guerra em 1991, mas acabou fazendo-o por considerar do interesse da Europa, e portanto da França. "Só conheceremos realmente a posição francesa quando chegar a hora de uma decisão", afirmou.

Política pacifista para consumo doméstico

Na visão do político alemão, a Alemanha deveria continuar sendo um aliado fidedigno dos EUA, em função de toda a ajuda que recebeu após a Segunda Guerra, reservando-se o direito de fazer críticas, como costuma acontecer entre bons amigos. Isso teria ocorrido durante o governo Helmut Kohl.

Mesmo tendo assegurado a Bush em maio do ano passado que a questão do Iraque não seria usado como tema de campanha eleitoral, foi isso que aconteceu. Assim sendo, ao tirar da manga a carta pacifista para salvar sua reeleição, Schröder pratica uma política para uso doméstico, para impressionar os adeptos das correntes avessas a ações militares nos dois partidos, o social-democrata e o verde.

Perguntado por que a Alemanha deveria ir à guerra contra o Iraque, ao lado dos EUA, Schönböhm foi taxativo: "A Alemanha não deve ir à guerra, não se trata disso". Mas se os Estados Unidos tomarem a decisão, com o apoio do Conselho de Segurança, a Alemanha deveria arcar com a parte da responsabilidade que lhe cabe. (ns)