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Fotógrafo Elger Esser constrói universo poético com paisagens

21 de julho de 2012

Ele foi aluno do conceituado fotógrafo Bernd Becher, mas seguiu um caminho distinto do de seus colegas da Escola de Düsseldorf. O fotógrafo Elger Esser retrata paisagens – registros de um mundo encantado.

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Foto: Elger Esser

É difícil de se imaginar uma contradição maior entre a arte de Elger Esser e a localização de seu ateliê em Düsseldorf: o fotógrafo trabalha bem em frente a uma drogaria popular e a poucos metros da filial de um supermercado de baixo preço. No pátio interno do prédio, amontoam-se oficinas mecânicas, padarias baratas e copiadoras. Uma paisagem triste, típica dos subúrbios alemães.

O ateliê de Esser, localizado nas imediações do porto fluvial de Düsseldorf, é amplo, com chão de tacos de madeira escura e prateleiras altas. Há poucas fotografias de sua própria autoria nas paredes – a maior parte delas fica guardada em um depósito. De certa forma, esta contradição combina com tudo o que ele diz de seu trabalho, de suas imagens, viagens e leituras. O ateliê ele usa, em primeiro plano, para preparar e trabalhar posteriormente suas fotografias, todas registradas ao ar livre.

Fotógrafo Elger Esser
Fotógrafo Elger EsserFoto: Elger Esser

As reproduções de Elger Esser são todas de grande formato, sobretudo imagens da província francesa. Não há certamente nenhum outro fotógrafo alemão que tenha reproduzido, quase cartografado, tão frequentemente a França nos últimos anos como ele. Nascido em Stuttgart, ele trabalha no momento em um Atlas da Memória da França, para o qual conta com a ajuda de sua coleção de cartões postais históricos, frequentemente coloridos, da virada do século 19 para o 20. São aproximadamente 25 mil deles, todos guardados em seu ateliê. O lendário pioneiro francês da fotografia Gustave Le Gray é aqui fonte de inspiração.

Água: motivo recorrente

Os motivos das imagens de Esser não são nem mesmo espetaculares: rios, natureza, pátios ou povoados simples na província, mas também paisagens urbanas, vistas marinhas, quase sempre com a presença da água. Em suas reproduções de grande formato, nem sempre há muito o que se ver, pois muitas vezes domina o vazio, a infinitude do céu e do mar.

O horizonte costuma definir o centro das imagens: duas grandes superfícies, entre elas muitas vezes uma linha estreita de paisagem, rochedos, pedras. A peculiaridade está nas cores: tons de amarelo e marrom marcam a maioria das fotos. São tons monocrômicos em sépia, semelhantes àqueles que se conhece dos primórdios da fotografia, que mergulham tudo numa atmosfera de irrealidade. As obras de Esser dão uma impressão de esquecimento, melancolia e poesia, apesar de toda sua intensidade e definição.

"Les Andelys" compõe série de paisagens
"Les Andelys" compõe série de paisagensFoto: Elger Esser

Elger Esser é um dos mais conhecidos artistas alemães ligados à fotografia, sendo representado internacionalmente por diversas galerias de renome. No mercado de artes, suas fotos são vendidas a preços altos, e seus trabalhos são expostos em museus de referência em Nova York, Paris ou Amsterdã. Na Academia de Artes de Düsseldorf, ele foi aluno de Bernd Becher, que ao lado de sua mulher Hilla Becher marcou o que se convencionou chamar de "Escola de Düsseldorf". Entre seus integrantes, contam fotógrafos como Andreas Gursky, Candida Höfer ou Thomas Struth, cujas obras são vendidas a preços recordes no mercado internacional.

Universo de Esser: literatura e século 19

Mas o trabalho de Esser diferencia-se de maneira fundamental daquele de seus famosos colegas. Enquanto Andreas Gursky exibe massas humanas e paisagens urbanas, prédios e casas, ou seja, o mundo moderno globalizado, Esser reproduz paisagens ou objetos que existem há muitos anos, às vezes há séculos. Ou seja, as imagens de Esser respiram história. Seus principais pontos de referência são o século 19 e a literatura – um mecanismo que o distanciou do conceito rígido da procura do objeto a ser fotografado proposto pelos Becher. O editor e colecionador Lothar Schirmer o acusou certa vez de ser o "herege" da Escola Becher.

Esser vê seu próprio trabalho como um ofício no sentido antigo do termo. Seu ateliê tem ainda um laboratório, e chegando lá é possível muitas vezes encontrá-lo com as mangas da camisa arregaçadas e as mãos sujas das soluções usadas para revelar e secar fotografias analógicas. Os métodos digitais adotados por muitos fotógrafos de hoje lhe são estranhos, mesmo que a manipulação posterior das fotografias constitua parte importante de seu processo criativo. Esser retoma com frequência técnicas antigas, como por exemplo a hoje quase desaparecida heliogravura, que permite definição e profundidade incríveis.

Relação diferenciada com a Modernidade

Filho de um escritor alemão e de uma repórter fotográfica francesa, Esser cresceu em Roma: "Cresci em meio ao espírito alemão, mas com uma espécie de alma italiana e francesa", diz ele. Por isso, sempre manteve outro olhar sobre o mundo. "Quando você passa a infância numa cidade como Roma, onde se depara por todos os lados com 3 mil anos de história, você percebe o 'tempo' de maneira muito distinta", diz.

Carcaças de navio como símbolo da passagem do tempo
Carcaças de navio como símbolo da passagem do tempoFoto: Elger Esser

Quando na época visitou a Alemanha, terra natal de seu pai, sentiu-se de certa forma surpreso ou até irritado com a relação das pessoas no país com a Modernidade. Segundo ele, esta era vista como um remédio milagroso para tudo. E não somente na arte, mas também na arquitetura. Esser diz que considerando todas as cicatrizes deixadas por duas grandes guerras no país, isso era compreensível, embora tenha provocado danos depois de 1945. Sua própria postura sempre foi a de ver a Modernidade como algo cheio de rupturas – um olhar crítico com o qual ele não fez apenas amigos.

Esse olhar sobre a história, a arte e a cultura marca os trabalhos de Esser. E também sua vida. "A Alemanha sempre foi para mim um país do qual gosto, pelo qual tenho muito apreço. Se amo o país, não sei", acentua o artista, que vive na Alemanha "também para manter o desejo pelo outro". O "outro", neste sentido, é a França, terra de sua mãe, para onde viaja entre cinco a seis vezes por ano para fotografar. Em algum momento, Esser terá cartografado todo o país, com registros completos das regiões. "Paisagens são como estados de espírito. Cada um de nós carrega em si uma paisagem, que naturalmente também idealiza", diz o artista.

Variações da Onda de Courbet

A mais recente série de fotografias de Esser foi feita em alto-mar, durante a primavera, num navio de pesquisas, ao lado de geólogos que estudavam os vulcões de lama do Golfo de Cádiz. Durante as quatro semanas de viagem, Esser fez nada menos do que 25 mil fotografias do mar e das ondas. Boa parte desse material compõe agora um mosaico fotográfico, uma variação da famosa pintura A onda, de Gustave Coubert (1819-1877). A obra fica exposta a partir de julho de 2012 no Palácio de Oldenburg, na Baixa Saxônia.

'A onda' é composta de diversas fotografias de pequeno formato
'A onda' é composta de diversas fotografias de pequeno formatoFoto: DW

Também essa obra foca a reflexão sobre a história da arte e sobre os elementos, entre estes o mar, o verdadeiro elemento primordial de onde todos viemos. Elger Esser toca com suas obras nas maiores questões da humanidade: De onde viemos? O que significa tempo? Ele reflete sobre essas perguntas com um olhar muito peculiar. Mas mesmo aqueles que nunca leram Proust anteriormente nem conhecem a pintura de Courbet poderão apreciar sua produção. "Quando tenho que ler uma bula para entender a arte, então alguma coisa está errada com a arte", conclui.

Autor: Jochen Kürten (sv)
Revisão: Augusto Valente