1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW
História

Foto pode reescrever história da Noite dos Cristais

Jefferson Chase md
8 de novembro de 2016

Há 78 anos, o regime de Hitler usou o atentado contra um diplomata alemão em Paris por um adolescente judeu para incitar ataques antissemitas. Foto recém-descoberta sugere que pivô do caso sobreviveu ao Holocausto.

https://p.dw.com/p/2SMWU
Novemberpogrome 1938 Zerstörte jüdische Geschäfte in Magdeburg
Comércio judaico destruído em Magdeburg, um dia após a Noite dos Cristais, em 1938Foto: Bundesarchiv, Bild 146-1970-083-42/CC-BY-SA

A versão histórica aceita sobre Herschel Grynszpan é que ele foi executado ou que morreu de alguma doença quando estava preso na Alemanha em algum momento entre 1942 e 1945. Mas uma foto encontrada no arquivo do Museu Judaico de Viena, na Áustria, parece mostrar que ele, na verdade, sobreviveu à Segunda Guerra Mundial.

Caso seja realmente genuína, a foto forçaria historiadores a reescreverem seus relatos sobre o homem que inadvertidamente levou os nazistas a desencadearem o mais terrível pogrom da fase inicial do Holocausto: a Noite dos Cristais.

Fotofund Herschel Grynszpan
Rapaz da foto, feita em campo de deslocados em Bamberg, tem semelhança com GrynszpanFoto: Jüdisches Museum Wien

A imagem mostra um rapaz com alguma semelhança com as poucas fotos existentes de Grynszpan, entre um grupo de judeus que protestam, em um campo alemão para deslocados mantido pelas forças aliadas, contra a decisão britânica de fechar territórios palestinos para a imigração judaica em 1946.

A diretora do arquivo do Museu Judaico, Christa Prokisch, descobriu a fotografia recentemente e entrou em contato com o jornalista alemão Achim Fuhrer, autor de vários livros sobre a história nazista, incluindo uma biografia de Grynszpan.

Ele diz que "há um grau muito elevado de probabilidade" de a foto ser de Grynszpan, o homem que atirou e feriu mortalmente o diplomata alemão Ernst vom Rath, em janeiro de 1938.

"A foto parece ter sido feita de surpresa, por um repórter ou alguém que estava lá no momento", escreveu Fuhrer na revista Focus. "Não parece que o fotógrafo tenha reconhecido Grynszpan, cuja imagem foi impressa nas capas de revistas em todo o mundo depois de ele cometer o atentado em 1938. Em todo o caso, a imagem é uma verdadeira surpresa, já que o destino de Grynszpan é incerto. A questão sobre se ele sobreviveu à guerra e ao Holocausto sempre foi considerada sem solução. Até agora."

Não há uma prova positiva de que o homem na foto é Grynszpan, mas outros também veem uma estreita semelhança entre a imagem e as fotos feitas logo após o incidente em 1938.

"De fato, características permanentes, como a posição dos olhos e as suas sobrancelhas, o nariz, queixo e orelhas, dão suporte à ideia", concluiu o jornal Die Welt.

Prelúdio do Holocausto

Em 7 de novembro de 1938, Grynszpan, judeu polonês de 17 anos que vivia ilegalmente em Paris, baleou o funcionário da embaixada alemã em Paris Ernst vom Rath duas vezes no abdômen. Grynszpan, nascido na cidade alemã de Hannover, posteriormente disse que o que o motivou foi a deportação de seus pais e de 12 mil outros judeus da Alemanha para a Polônia no agosto anterior.

Ernst vom Rath
Ernst vom Rath foi considerado um mártir pelos nazistasFoto: picture-alliance/dpa

Hitler enviou dois médicos a Paris, incluindo o seu médico pessoal, mas Rath morreu dois dias depois. Fuhrer afirma que os médicos provavelmente deixaram que Rath morresse para fins de propaganda: uma hipótese controversa. Mas não há dúvida de que altos funcionários nazistas imediatamente começaram a tentar usar o atentado para promover seus próprios objetivos na Alemanha.

"Na manhã seguinte ao atentado, a imprensa nazista, sob a orquestração de Joseph Goebbels, começou a fazer uma enxurrada de ataques brutais contra os judeus, para incitar a violência", escreveu o historiador Ian Kershaw. "Com certeza, naquela noite de 8 de novembro, pogroms – incluindo a queima de sinagogas, destruição de propriedades judaicas, a destruição de mercadorias e maus-tratos contra judeus – foram instigados em várias partes do país."

Hitler promoveu Rath ao posto de cônsul, poucas horas antes de ele sucumbir a seus ferimentos às 5h30 do dia 9 de novembro. Goebbels anunciou rapidamente a notícia da morte de Rath ao público em geral e emitiu ordens diretas para coordenação de violência antissemita em um pogrom que ficou conhecido como a Noite dos Cristais.

Em uma única noite, 91 pessoas foram mortas, mais de mil sinagogas foram queimadas e mais de 7 mil estabelecimentos de propriedade de judeus foram danificados ou destruídos. A Noite dos Cristais é geralmente considerada uma grande escalada na perseguição organizada pelo Estado contra judeus na Alemanha, um prelúdio do Holocausto.

Desaparecendo de vista

Mas o próprio Grynszpan permaneceu uma figura misteriosa, cercada por rumores e controvérsias. Após o atentado, ele foi imediatamente preso em Paris, mas seu caso nunca chegou a julgamento, em parte devido ao crescente sentimento antialemão na França após o início da Segunda Guerra Mundial, em setembro de 1939. Em 18 de julho de 1940, depois que a França havia sido ocupada por forças alemãs, ele foi entregue à Alemanha nazista.

Deutschland Geschichte Juden in Berlin Pogromnacht Synagoge
Nazistas usaram atentado como pretexto para incitar ataques a estabelecimentos judeus na AlemanhaFoto: picture alliance/akg-images

Goebbels repetidamente usou o atentado cometido pelo adolescente como evidência de uma conspiração judaica global, mas estava preocupado que Grynszpan repetisse alegações, provavelmente na esperança de salvar sua pele, de que ele tinha um caso homossexual com Rath, caso ele fosse submetido a um julgamento altamente público. Assim, os nazistas parecem ter planejado esperar até depois da Segunda Guerra Mundial para levar Grynszpan a julgamento exemplar e executá-lo.

Em todo caso, o historiador Ron Roizen afirma que Grynszpan recebeu tratamento especial como um prisioneiro político proeminente. Ele foi preso primeiro no campo de concentração de Sachsenhausen e, em seguida, em uma prisão na cidade de Magdeburg. O que aconteceu depois não é conhecido. O último registro sobre ele é de setembro de 1942.

O rumor de que Grynszpan e Rath eram amantes foi repetidamente citado na Alemanha após a guerra, embora tenha sido refutado de forma bastante conclusiva. Mas não era o único mito em torno do jovem judeu.

Falta de documentos

Os pais de Grynszpan tiveram seu filho declarado legalmente morto pelo governo da Alemanha Ocidental em 1960, dizendo que eles não haviam ouvido nada dele desde o final da guerra. No entanto, corriam rumores de que ele tinha sobrevivido e que vivia em Paris ou em outro lugar.

A questão jamais foi esclarecida. Mas um médico francês chamado Alain Cuenot, que investigou exaustivamente o caso Grynszpan, concluiu em 1982 que ele muito provavelmente morreu no final de 1942 ou início de 1943.

"Se Grynszpan houvesse sobrevivido aos anos de 1943, 1944 e 1945, seria bastante incomum que outros documentos não tivessem sido adicionados aos já recolhidos", escreveu Cuenot.

Sobre a questão de porque, se Grynszpan sobreviveu, não haver registro confirmado dele depois de 1942, Fuhrer especula que ele pode não ter querido enfrentar possíveis acusações criminais pelo assassinato de Rath – ou que poderia ter ficado com medo da ira de judeus, por ter causado a Noite dos Cristais.

Embora convencido de que a pessoa da foto é Grynszpan, Fuhrer admite que isso não esclarece o que pode ter acontecido com ele. "A foto traz mais perguntas do que respostas", escreveu o jornalista. O debate sobre o rapaz que, inadvertidamente, provocou a Noite dos Cristais provavelmente continuará.