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Festival celebra influência negra

(rr)28 de setembro de 2004

Diversas nações européias possuem em comum o passado negro das missões colonizadoras. Agora, um festival procura festejar o "futuro negro" na Europa com mais de 30 eventos na Casa das Culturas do Mundo em Berlim.

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Cena do novo espetáculo do dançarino brasileiro Ismael IvoFoto: AP

O nome do festival Black Atlantic, que vai até 15 de novembro na Casa das Culturas do Mundo, em Berlim, remonta ao sociólogo e cientista cultural britânico Paul Gilroy, que, junto com Jean Borelli e o dançarino brasileiro Ismael Ivo, assumiu a curadoria dos mais de 30 shows, performances, workshops, leituras, discussões, filmes, além de um novo espetáculo de Ismael Ivo e uma exposição de arte.

O termo, explicou Gilroy ao jornal alemão Tageszeitung, destituiria a cultura de seu caráter nacionalista, salientando a função do Oceano Atlântico, principal eixo da diáspora negra desde o século 16, como um "continente negativo" – o movimento da água oposto à estabilidade da terra.

Negro como a neve

Marcada por termos como pátria, lembrança e identidade, a exposição reúne obras de quatro artistas. O principal deles é Isaac Julien, que contribui com duas instalações multimídia. True North, concebida especialmente para o evento, é uma espécie de homenagem ao afro-americano Matthew Henson, que serviu e acompanhou o explorador Robert Peary, o primeiro a chegar ao Pólo Norte, em sua expedição.

Outras obras são do maltês Keith Piper, que aborda a construção de paisagens como uma forma de colonização do espaço natural, e do escocês Tim Sharp, que, através de fragmentos de vídeos adquiridos em mercados de pulgas, procura explorar a produção de "verdades objetivas". A alemã Lisl Ponger reuniu imagens de casamentos e festas na cidade de Viena para evidenciar o caráter multicultural negligenciado na representação pública da capital austríaca.

Em busca de vestígios em Berlim

Olhos D'Agua - Tanztheater von Ismael Ivo
Ismael IvoFoto: AP

O dançarino brasileiro Ismael Ivo assume um papel central no festival. Além de representar a enorme herança da cultura negra no Brasil, seu novo espetáculo, Olhos d'água, explora a transmissão cultural de tradições africanas no contexto do tráfico transatlântico de escravos. Para isso, Ivo baseou-se em sua própria experiência e nas lembranças das histórias que lhe contava sua avó, nascida escrava, e que muito contribuíram para a formação de sua própria identidade.

Três mulheres conduzem o espetáculo: Mãe Beata, que dirige um templo de candomblé na Bahia; a cantora de jazz e dançarina Othalla Dallas, que trabalhou com grandes como Josephine Baker e Sammy Davis Jr.; e a atriz, diretora e ativista política Tereza Santos, que lutou contra a ditadura tanto no Brasil quanto em Angola.

Ivo também proporciona uma "viagem performática" em busca de vestígios da exploração colonial africana, do tráfico negreiro e da diáspora africana em Berlim. O tour passa, por exemplo, pela Mohrenstrasse, no centro de Berlim, onde aconteceu a Conferência do Congo de 1884/85, na qual as nações colonizadoras européias dividiram entre si o território africano. Ou pelo chamado "bairro africano" em Wedding, e pelo monumento levantado em homenagem aos soldados alemães que exterminaram os hereros, na Namíbia. A viagem de ônibus é acompanhada por leituras de textos, performances e apresentações em vídeo.

Do genocídio à influência musical

Um debate com o escritor Christopher Small, autor do recém-lançado Music of a Common Tongue: Survival and Celebration in Afro-American Music, tematiza ainda a enorme influência negra na música, seu significado revolucionário no movimento abolicionista e seu papel na cultura popular globalizada.

O passado colonial alemão também não escapa à análise. Debates com intelectuais e pesquisadores, como o historiador Sebastian Conrad, da Universidade Livre de Berlim, discutem, entre outros temas, como um estudo mais minucioso da expansão colonial alemã para além da Europa poderia alterar as perspectivas da história alemã entre 1885 a 1945.