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Extremismo ameaça consolidação do novo Estado líbio

14 de setembro de 2012

O ataque ao consulado dos EUA em Benghazi evidencia a fraqueza do novo Estado líbio e cria a suspeita de que extremistas estrangeiros estariam tentando colocar o país no rumo do radicalismo islâmico.

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Foto: picture-alliance/dpa

Na Líbia, a expectativa era de que os ataques não iriam se restringir aos santuários sufistas, como há semanas vêm ocorrendo no país. A questão não era se, mas quando e onde os terroristas atacariam com mais impacto. Por isso, as palavras do presidente do Parlamento líbio, Mohammed Magarief, soaram como um reconhecimento por demais tardio de que o consulado dos EUA em Benghazi poderia ter sido protegido de forma mais efetiva.

"Pedimos perdão ao povo americano e ao mundo inteiro", declarou Magarief logo após o ataque. E como se quisesse reforçar o pedido de desculpas, lembrou o fato de que o ataque à representação diplomática ocorreu exatamente no décimo primeiro aniversário dos atentados ao World Trade Center. "O que aconteceu está relacionado ao 11 de Setembro. E rejeitamos, sob todas as circunstâncias, que nosso território seja usado para tais operações."

Pesar e revolta

Tristeza, revolta e sensação de impotência são os sentimentos predominantes na Líbia. O jornal online Al Watan al Libia publicou um retrato emoldurado em preto do embaixador norte-americano assassinado, Chris Stevens. "Para onde estas pessoas querem levar a Líbia?", questionou o editorialista do jornal, já dando a resposta: "Para o abismo!" Os terroristas, segundo ele, querem transformar a Líbia num Estado como a Somália, Afeganistão ou Líbano. "Eles tornaram nosso país um lar para aventureiros, corrompem nosso povo e nossa terra. Esta é a alternativa deles para o nosso projeto, com o qual queremos construir o país, fazê-lo crescer e levar prosperidade à população."

Já a Irmandade Muçulmana da Líbia também divulgou comunicado condenando o ataque com determinação, mas culpando os governos ocidentais e a comunidade internacional de "total responsabilidade" sobre o ocorrido. Segundo o texto, não basta que os países ocidentais declarem respeito ao Islã em suas declarações oficiais, enquanto silenciam, ao mesmo tempo, para insultos que "semeiam o ódio entre as religiões".

Mohammed el Magarief
Mohammed Magarief (c) perdiu perdão a norte-americanosFoto: Reuters

Extremismo importado

Há vários indícios de que a invasão da representação diplomática norte-americana em Benghazi foi organizada por extremistas estrangeiros. "Nos últimos meses, ocorreram vários atentados com carros-bomba que provocaram mortes na Líbia", relata o publicitário Mustafa Fetouri, em entrevista à Deutsche Welle, observando que carros-bomba eram, até agora, um fenômeno desconhecido no país, que não fora usado nem mesmo durante a revolução contra Kadafi. "Esse tipo de violência deve ter sido trazido de fora. É um indício do envolvimento de grupos fanáticos, presumivelmente pertencentes à rede Al-Qaeda ou a outra organização terrorista".

Há semanas, antigos santuários sufistas vêm sendo profanados ou destruídos na Líbia. Esses ataques também indicam que extremistas estrangeiros atuam no país. "Os autores desses atentados são salafistas", acusa Michel Cousins, editor do jornal The Lybia Herold, fundado no início de 2012, observando que a ideologia dos terroristas é originária da Arábia Saudita.

"Mas são grupos relativamente pequenos. No total, não deve haver mais do que 400 a 500 deles", calcula, ressaltando que esses grupos encontram algum apoio de locais, embora estes também sejam em número limitado. "Os líbios são, em maioria, muçulmanos moderados. Eles estão chocados com a violência que atinge o patrimônio cultural do país", sublinha Cousins.

Depois que os candidatos radicais foram rejeitados pela população nas eleições parlamentares de julho, parece que eles querem atingir seus objetivos por outros meios. "Agora eles estão tentando ganhar influência pela força", acredita Mustafa Fetouri. "Este é um problema muito sério."

A grave sits empty after Libyan Salafis Muslims destroyed a Sufi mosque in central Tripoli August 25, 2012. Attackers bulldozed a mosque containing Sufi Muslim graves in the centre of Tripoli in broad daylight on Saturday, in what appeared to be Libya's most blatant sectarian attack since the overthrow of Muammar Gaddafi. REUTERS/Ismail Zitouny (LIBYA - Tags: POLITICS CIVIL UNREST RELIGION)
Destroços em templo sufista em Trípoli, após atentado contra prédio histórico em agostoFoto: REUTERS

Tática cínica

A invasão do consulado pode ser a continuação de uma estratégia para enfraquecer o governo líbio e minar seu prestígio e legitimidade. O Estado não está presente em todos os lugares deste país pouco povoado e de território amplo ─ a Líbia ocupa uma área de cerca de 1, 8 milhão de metros quadrados e tem uma densidade populacional de 3,3 habitantes por quilômetro quadrado. Isso favorece os extremistas. A estratégia é simples: os ataques a patrimônios culturais do país, como os santuários sufistas, com os quais a maioria dos líbios tem uma forte relação emocional, fazem o Estado parecer enfraquecido.

"Quanto mais frequentes esses ataques são, mais evidente fica a incapacidade do Estado para fazer cumprir a lei", explica Mustafa Fetouri. "Isso significa que a confiança da população no governo vai sendo enfraquecida. E com isso, o povo começa a formar suas próprias milícias." Essa falta de confiança no Estado pode vir a se evidenciar nas próximas eleições. E pode, assim, fazer crescer os anseios por um homem forte. E o homem forte possivelmente também poderá ter boas chances de ser eleito defendendo posições extremistas.

Autora: Kersten Knipp (md)
Revisão: Carlos Albuquerque