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Arte e mídia

Carlos Albuquerque5 de dezembro de 2007

De forma lúdica e inteligente, a exposição "Da Faísca ao Pixel", no Martin-Gropius-Bau, em Berlim, relata os quatro estágios da imaterialidade e presta importante contribuição para a interface entre a arte e a mídia.

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Gregory Barsamian: 'The Scream', 1998: efeito zoetrope dos primórdios do cinemaFoto: Gregory Barsamian

Mais do que o relato tecnológico-histórico da humanidade, a exposição Da Faísca ao Pixel. Arte + Novas Mídias, no Martin-Gropius-Bau berlinense, mostra diferentes posições internacionais de artistas contemporâneos que trabalham em grande escala com mídias eletrônicas interativas e digitais.

Em 24 instalações, 20 das quais ainda inéditas em Berlim, artistas provenientes de 12 países procuram relatar quatro estágios da imaterialidade: o fogo, a eletricidade, a luz e o pixel – a menor unidade da imagem eletrônica é vista então como uma forma de energia que não mais possui qualidades fósseis.

Trabalhos de artistas conhecidos, como o coreano Nam June Paik, pioneiro da videoarte falecido no ano passado, e outros inéditos ou feitos exclusivamente para a exposição na capital alemã poderão ser apreciados, até 14 de janeiro de 2008, no magnífico prédio Martin-Gropius-Bau, jóia da arquitetura eclética berlinense que se dedica a exposições temporárias.

Efemeridade tecnológica

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
O pátio do Martin-Gropius-Bau foi coberto de azulFoto: Ulf Langheinrich

No início eram faísca e fogo. Em seu entorno, nasceram língua e a arquitetura. Passaram-se milênios e o fogo se consagrou como símbolo de comunidade. Peregrinos repousaram à volta dos fogões das igrejas medievais.

Surgiu então a máquina como forma de apaziguar católicos e protestantes. Vieram em seguida vapor, eletricidade e a amplificação da luz por emissão estimulada de radiação. Informação transformou-se em texto. Surgiu o pixel e o fogo esfriou.

O curador francês Richard Castelli sabia o que estava fazendo ao iniciar o percurso de sua mostra com a obra de Paik, Candle TV (1975), na qual, em uma carcaça oca de um aparelho de TV dos anos de 1950, o observador pode assistir ao queimar de uma vela. A ironia melancólica e apocalíptica de Paik remete à efemeridade de todos os tipos de tecnologia.

Gerador eletroestático

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
Máquina do tempo e gerador eletrostático de Brad HwangFoto: Brad Hwang

Seguem-se trabalhos como a instalação, concebida exclusivamente para a mostra, do também coreano Brad Hwang Time May Change Me, I Can't Change Time (2007).

Através de uma máquina concebida por Hwang, uma espécie de gerador eletrostático e máquina do tempo, o visitante é levado a experimentar o surgimento da eletricidade e da transmissão de rádio, ao acionar a máquina com sua força muscular.

Em seus trabalhos, o austríaco Erwin Redl reveste estruturas reais com milhares de luzes. Para a mostra berlinense, Redl preparou FLOW Berlin (2007), onde encobre todo o pátio interno do prédio com ondas luminosas sobre as cabeças dos visitantes, formando assim um forro virtual com 30 mil lâmpadas azuis do tipo LED (diodo emissor de luz) distribuídas em 12 km de cabos a nove metros de altura.

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
Oceanos imaginários em 'Hemisphere', de Ulf LangheinrichFoto: Ulf Langheinrich

Também no pátio interno rodeado de colunas, o artista alemão Ulf Langheinrich trouxe para Berlim a instalação Hemisphere (2006–2007). Deitado em almofadas, os sentidos do visitante são atingidos por interferências acústicas e visuais com projeções de oceanos imaginários sobre uma cúpula de dez metros de diâmetro, posicionada a poucos metros do solo. Hemisphere relata sobre o vazio e faz com que o espectador mergulhe num processo de dissolução perceptiva.

Projetores multimídia

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
Em 'Visp', Christian Partos faz esculturas no espaçoFoto: Christian Partos / Martin-Gropius-Bau, Berliner Festspiele

Uma das boas surpresas da exposição fica por conta do sueco Christian Partos, presente com três instalações na mostra. Além da comovente obra M.O.M (2003), onde faz a imagem de sua falecida mãe aparecer somente através da reflexão diferenciada da luz em pastilhas de espelho, Partos trouxe para Berlim a instalação multimídia Striptease (1998), onde sombras dançantes se despem, projetadas em miniatura por projetores multimídia.

O artista trouxe também a escultura de luz Visp (2002), feita para o pavilhão sueco da Expo 2000 de Hannover. Mil diodos luminosos pregados em cinco fios de dez metros de comprimento giram no espaço, fazendo aparecer uma espécie de rosário.

Pontuação do real e do irreal

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
Dumb Type, 'Voyages': visitante usa corpo como telaFoto: Dumb Type

Luz e movimento também caracterizam os trabalhos do americano Gregory Barsamian The Scream (1998) e No, Never Alone (1998), que fazem uso do assim chamado efeito zoetrope, invenção do século 19, onde imagens são colocadas em seqüência num cilindro.

Remetendo à forma primitiva de cinema representada pelo zoetrope, as esculturas rotantes do artista nova-iorquino permitem uma visão cinematográfica "ao vivo", resgatando a relação entre o real e o imaginário.

Como pontuação do irreal e do corporal, a instalação do grupo japonês Dumb Type Voyages (2002) é um dos trabalhos mais fortes da mostra. O observador se movimenta sobre um tapete de projeções e pode utilizar seu próprio corpo como tela, captando imagens projetadas a laser por uma câmera situada à altura de seus quadris.

Escutar a luz, ouvir a imagem

Ausstellung "Vom Funken zum Pixel", Martin-Gropius-Bau Berlin
Em 'Ondulation', Thomas McIntosh escutou a luz e ouviu a imagemFoto: Thomas McIntosh / Martin-Gropius-Bau, Berliner Festspiele

Em Ondulation (2002), o inglês Thomas McIntosh joga com a reflexão da luz sobre uma superfície aquática, colocada em movimento através do uso de alto-falantes. Som, água e luz produzem ondas, que se refletem e se dissipam indefinidamente.

Trabalhando com a simultaneidade de ondas luminosas e acústicas, a instalação de McIntosh permite uma experiência limítrofe da arte ao observador, que tem a impressão de escutar a luz e ouvir a imagem.

Da Faísca ao Pixel é um convite à interatividade. A mostra resgata, de forma inteligente e lúdica, a relação do corpo com a tecnologia, lincando vivências perceptivas radicalmente modificadas com novas possibilidades participativas do observador. Com esta exposição, o Martin-Gropius-Bau presta uma importante contribuição para a interface entre arte e mídia.