Especialistas debatem gestão de águas no Brasil e na Alemanha
10 de setembro de 2006A Alemanha, uma República federativa, definiu os Estados como unidades responsáveis pela gestão das águas. O Brasil, também uma Federação, optou pelo modelo francês, que determina as bacias hidrográficas como unidades de gerenciamento. Assim, em rios que passam por mais de um Estado brasileiro, a definição e execução das políticas pode ficar a cargo dos governos estaduais ou federal, ou de ambos.
"Ter dentro de uma mesma bacia o domínio estadual e o federal cria uma grande confusão", avalia Jackson Roehrig, professor da Escola Superior Técnica de Colônia.
O professor Airton Bodstein, da Universidade Federal Fluminense (UFF), vê o problema da mesma forma, e ressalta que a falta de uma definição clara de atribuições cria sérios problemas à política brasileira de águas.
"No Brasil existe a figura do rio estadual e rio federal, o que vejo como um absurdo. Assim, há bacias de rios federais cujos afluentes são estaduais, ou seja, parte da água é administrada pelo Estado e parte pela União", critica Bodstein.
Falta de coordenação e pragmatismo
O professor da UFF acrescenta que o fraco sistema federativo e as constantes disputas políticas no país fazem com que a questão fique ainda mais problemática, "A Federação no Brasil é competitiva, e não cooperativa, como na Alemanha. Os Estados competem pelo poder, por isso normalmente luta-se para que a iniciativa do outro dê errado, para que o opositor político não consiga se manter no poder", destaca.
Outro aspecto negativo, de acordo com Roehrig, é a falta de pragmatismo no processo de tomadas de decisão no Brasil, o que cria uma grande diferença em relação aos resultados alcançados na União Européia.
"A legislação brasileira (lei 9433 de 1997) prevê um sistema completo de gestão das águas, mas peca por não estabelecer um plano de implementação para definir quem executa o quê, e quando", salienta. "Essa situação provoca um debate político sem fim", completa.
Necessidade de um cronograma
Roehrig lembra que a diretiva-quadro que estabelece uma política de águas para a União Européia também criou um cronograma completo de execução das políticas do setor. "Desde o princípio, questões como quais órgãos nacionais teriam que responder à UE, quando cada passo seria tomado e de que maneira ocorreria o monitoramento estavam claras", relata.
O professor da Escola Superior Técnica de Colônia cobra vontade política das autoridades brasileiras, no sentido de acrescentar à legislação vigente diretrizes voltadas para a implementação dos projetos. "Já passou da hora de elaborar um plano de metas concreto e delegar funções para a execução de tarefas. Há muita discussão, muita teoria e pouca prática, por isso no Brasil os comitês das bacias hidrográficas ainda não foram totalmente implantados", observa.
Bodstein lembra que a Universidade Federal Fluminense está trabalhando em um projeto-piloto no Rio Itabapoana, que passa pelos Estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro, voltado para regionalizar a gestão das bacias dos rios federais estimulando a cooperação entre os Estados.
"Com base nos resultados do projeto Managés (nome dado pelos indígenas ao Rio Itabapoana) poderemos sugerir mudanças à legislação brasileira", declara.
De acordo com o docente da UFF, as questões hídricas no Brasil precisariam funcionar de forma mais eficaz, devido à importância da água não só para o país mas para todo o planeta. "O Brasil tem cerca de 20% de toda a água doce do planeta. Estamos para a água assim como o Irã está para o petróleo", concluiu Bodstein.
Diálogo das sociedades civis
O Terceiro Fórum Brasil-Alemanha – Diálogo das Sociedades Civis foi encerrado neste sábado (09/09). O evento, que aconteceu em Bonn, contou com a presença de autoridades e membros das comunidades científica e acadêmica dos dois países. Além de discutir diversas formas de cooperação bilateral, o encontro tratou especificamente da problemática da água em todo o mundo.
Criado em 2002 pelo ex-chanceler federal alemão Gerhard Schröder e pelo ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, o Fórum Brasil-Alemanha tem como objetivo discutir questões políticas, econômicas, ecológicas e culturais relevantes para os dois países e promover a integração entre as sociedades brasileira e alemã. As duas primeiras edições aconteceram em Stuttgart e Fortaleza.