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Escândalo deixa governo Temer por um fio

Jean-Philip Struck | Rafael Plaisant
18 de maio de 2017

Denúncia de que presidente teria dado aval a obstrução da Lava Jato elimina resquícios de legitimidade popular de um governo que, ao longo de um ano, viveu sob a sombra constante de crises e escândalos.

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Michel Temer: um ano depois de assumir Presidência, governo tem apenas 4% de aprovação
Michel Temer: um ano depois de assumir Presidência, governo tem apenas 4% de aprovaçãoFoto: Reuters/U. Marcelino

O Brasil vive nesta quinta-feira (18/05) um terremoto político com a notícia, revelada na noite da véspera, de que o presidente Michel Temer teria dado seu aval à compra do silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha para frear as investigações da Lava Jato.

A denúncia tem potencial para implodir o governo, nascido do impeachment de Dilma Roussef, erguido sob a sombra de uma crise permanente, índices irrisórios de aprovação e que falhou em todas as tentativas de ganhar legitimidade popular.

Para analistas políticos e observadores, se confirmado o conteúdo da denúncia, a pergunta não é mais "se", mas "quando" e "como" o governo Temer vai cair: não haveria mais operação de engenharia política para salvar o atual presidente.

"Este caso é a arma fumegante contra Temer", opina o cientista político Gaspard Estrada, do Instituto Sciences Po, de Paris. "É muito mais grave do que qualquer coisa que apareceu no governo Dilma: é um presidente em exercício agindo diretamente para fraudar a Justiça. E parece haver provas bastante concretas."

Segundo a denúncia, publicada originalmente pelo jornal O Globo, Joesley Batista, um dos controladores do frigorífico JBS, gravou Temer concordando com pagamentos para manter o silêncio de Cunha.

Na conversa, o dono da JBS conta a Temer que pagava uma mesada a Cunha e ao doleiro Lúcio Funaro, um dos operadores presos na Lava Jato, para que ficassem calados. Na gravação, divulgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quinta-feira, Joesley fala que está "de bem com o Eduardo". O presidente responde: "Tem que manter isso, viu?". "Todo mês", completa o dono da JBS.

O áudio é parte da delação dos executivos da empresa, homologada nesta quinta-feira no STF. Na sequência da decisão, o ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo, autorizou abertura de inquérito para investigar a conduta do presidente.

O dilema do presidente

Por mais que Temer diga que não vai renunciar, a situação, na avaliação de especialistas, fica insustentável para um governo que, um ano depois de assumir, tem apenas 4% de aprovação e que, para 92% da população, leva o país para o caminho errado.

"A lógica sugere que Temer não tem mais condições de continuar", afirma Estrada. "É o tipo de coisa que fere um governo mortalmente. Neste caso, seria a chance para eleições antecipadas. Mas o candidato mais bem posicionado nas pesquisas é justamente o ex-presidente Lula. Vai ser preciso esperar ver o que a elite política vai fazer a partir desse novo escândalo e se vai favorecer em peso a saída de Temer", completa o analistas da Science Po.

A oposição não só defendeu o impeachment, como um de seus deputados já protocolou um pedido pedindo a abertura de um processo de impedimento de Temer. PDT, PT, PCdoB, PSOL, Rede e PSB pediram a renúncia ou o afastamento de Temer e a realização de eleições diretas.

Mas não foram só oposicionistas que se pronunciaram contra Temer: o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado, que é aliado do governo, defendeu a renúncia do presidente e a realização de eleições antecipadas para a Presidência e o Congresso.

Para Carlos Pereira, professor visitante da escola de governança Hertie, em Berlim, diante da gravidade do caso, não parece existir cenário realista que inclua a permanência de Temer no governo.

"Temer deve estar agora enfrentando um dilema. Se renunciar, pode sofrer consequências jurídicas imediatas, ficar sem foro privilegiado, arriscando ir para a cadeia pouco depois de deixar o cargo. Ele deve estar se perguntando agora: 'Jogo pensando na história ou tentando me proteger?'", comenta Pereira. "Parece muito provável que ele renuncie. Se não o fizer, ainda há uma chance de o julgamento do TSE em poucos dias decidir a questão."

O escândalo atinge o governo às vésperas de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) começar a julgar, em 6 de junho, a ação que pede a cassação da chapa Dilma – Temer, eleita em 2014.

"Corruptos não sabem o que fazer" 

A denúncia reforçou a suspeita de que o governo tem uma postura duvidosa em relação à Operação Lava Jato e que teria sido montado de forma a preservar seus aliados – e o próprio presidente – das investigações.

O áudio pode ser a base de um processo criminal ou de impeachment contra o presidente. Temer chegou a ser citado nas delações da Odebrecht, mas não poderia ser julgado como presidente por eventuais crimes cometidos antes de seu mandato. O encontro com o executivo da JBS aconteceu em março passado, no Planalto.

Para o professor Carlos Pereira, também é possível fazer uma leitura mais otimista disso tudo: "O episódio mostra que os corruptos não têm mais controle sobre os mecanismos de controle. O Ministério Público, a imprensa livre, a polícia estão fortalecidas."

"Temos um presidente acossado por suspeitas, e essa elite política decadente não sabe o que fazer. Temer não foi o único presidente ou ex-presidente acusado de tentar interferir no trabalho da Justiça. Os mecanismos de controle estão explicitando o modus operandi deles. Não existe mais ambiente para continuar agindo assim. Os políticos corruptos não sabem mais o que fazer." 

Após a revelação de um áudio, também nesta quarta-feira, em que o senador Aécio Neves, presidente nacional do PSDB, pede 2 milhões de reais a Joesley Batista, dono do frigorífico JBS, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu afastá-lo do mandato. A Procuradoria Geral pediu a prisão do tucano.

O dono da JBS relatou ainda, segundo o jornal, que o ex-ministro Guido Mantega, também investigado na Lava Jato, era seu contato dentro do PT. De acordo com Joesley, com esse político era negociado o dinheiro que seria distribuído aos membros e aliados do Partido dos Trabalhadores.