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Diretor premiado: falta espaço para atores de origem estrangeira

1 de maio de 2012

Ele é um dos mais bem-sucedidos diretores de teatro da Alemanha no momento. Com formação de ator, Nurkan Erpulat tem dado o que falar com suas peças sobre jovens berlinenses de origem turca.

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Foto: picture-alliance/dpa

Nascido em Ancara, em 1974, Nurkan Erpulat concluiu sua formação como ator em Izmir, na Turquia, antes de se mudar, aos 24 anos, para Berlim, no ano de 1998. No curto espaço de tempo de um ano e meio, aprendeu alemão e foi aceito para cursar a concorrida graduação de direção na Escola Superior de Teatro Ernst Busch.

Entre suas montagens mais bem-sucedidas, de peças em parte escritas por ele próprio, estão Jenseits – Bist du schwul oder bist du Türke? (Do além – Você é gay ou é turco?), Heimat im Kopf (Terra natal na cabeça) e Familiengeschichten (Histórias de família) – todas voltadas para o público jovem.

Regisseur Nurkan Erpulat im Schauspielhaus Düsseldorf
Erpulat na Schauspielhaus de DüsseldorfFoto: picture-alliance/dpa

Verrücktes Blut (Sangue louco), no qual uma professora empunha uma arma, a fim de angariar o respeito de uma sala de aula cheia de filhos de imigrantes, foi convidada para o Encontro do Teatro de Berlim (Theatertreffen) em 2011, tendo sido escolhida como "Melhor Peça do Ano em Língua Alemã".

Segundo uma enquete realizada entre críticos pela revista Theater heute, Erpulat foi também eleito o melhor "jovem diretor de teatro de 2011". Depois de encenar O Castelo, de Franz Kafka, e Os Filhos do Sol, de Maxim Gorki, ele assumiu por dois anos a direção do teatro Schauspielhaus, em Düsseldorf (temporada 2011/2012). Seu Sangue louco poderá ser em breve lido em Washington e Nova York, na tradução para o inglês. Leia abaixo entrevista com o diretor.

Deutsche Welle: A primeira etapa de sua temporada como diretor na Schauspielhaus de Düsseldorf está quase chegando ao fim. Você vai continuar na direção ou pretende retomar o trabalho de ator e voltar a escrever peças?

Nurkan Erpulat: Meu trabalho como ator acabou. Isso é algo que eu, na verdade, não queria, mas em função do trabalho como diretor nos últimos anos, acabei não tendo mais tempo. Atuar é como exercitar um músculo. Quando você para de fazer exercícios, ele desaparece. Mas pretendo continuar trabalhando como dramaturgo. Tenho interesse pela criação de textos.

Há histórias que quero continuar contando e, neste caso, é importante ter tudo preto no branco. Minha peça Sangue Louco vai continuar sendo encenada, ela continua. Outros projetos, ao contrário, se esvaem, são pouco perenes. Mas eu não sou um dramaturgo no sentido clássico do termo. Normalmente escrevo textos que vou desenvolvendo junto dos atores. Sempre acabo reescrevendo o que criei anteriormente. E aí reenceno. Este é meu método.

Você começou sua carreira com trabalhos sobre jovens turcos dos bairros berlinenses. Gostaria de começar se distanciar do tema migração?

Não quero me distanciar do tema, pois ele é muito importante. Também sou turco e isso é totalmente ok. Problemático é o fato de as pessoas não terem – ou não terem tido – confiança em mim para tratar de outros assuntos. Sou um diretor que encena peças em alemão, usando dinheiro do contribuinte. E vejo minha tarefa também do ponto de vista político-cultural. Em algum momento me senti irritado, porque só recebia propostas que giravam em torno do tema migração.

Por quais outros temas você se interessa?

A migração não entraria na lista dos temas pelos quais mais me interessam, pois ela é na melhor das hipóteses um traço. Acho amor, ódio e traição muito mais importantes. Me interessa muito também fazer algo sobre a moral. Ou sobre o poder. Também não vejo minhas peças, que foram categorizadas como sendo centradas no tema migração, como tais. Heimat im Kopf, por exemplo, trata do ser e da aparência; Jenseits – Bist du schwul oder bist du Türke? é uma peça sobre moral dupla.

Aufführung Kafka-Theaterstück Regisseur Nurkan Erpulat
Kafka por ErpulatFoto: picture-alliance/dpa

Você, na verdade, não acha surpreendente ter sido um dos primeiros turcos a serem aceitos na graduação em direção da Escola Superior de Teatro Ernst Busch? E a seguir o primeiro diretor turco de teatro na Alemanha?

Até há uns cinco ou seis anos, o teatro na Alemanha não tinha interesse por atores com um histórico de migração. O cinema sim, ali o gelo já havia sido quebrado. Com isso, alguns imigrantes chegaram às escolas de teatro e um ou outro ao cinema. Mas a maioria dos imigrantes com formação teatral acabou batendo com a cabeça na parede, pois não havia lugar para eles nos teatros. Entre os diretores, que são de qualquer forma um número muito mais reduzido de pessoas, acontece a mesma coisa. Sendo assim, não fico surpreso em ter sido um dos primeiros turcos a se formarem em direção na Ernst Busch.

Você tem outras suposições a respeito das razões pelas quais há tão pouca gente com raízes estrangeiras no meio teatral: atores, dramaturgos, diretores?

Os migrantes com formação teatral não eram bem-vindos nos teatros municipais. Isso é claro é óbvio. Há tão pouca gente com histórico de migração na cena alemã de teatro, porque o teatro não tinha interesse por essas pessoas e suas histórias. Afirmamos o tempo todo no teatro que refletimos a realidade. E o que os diretores das casas teatrais, dramaturgos e gerenciadores de verbas fizeram nos últimos 50 anos? Os políticos e os artistas perderam a oportunidade de cuidar disto.

E como é a situação hoje em dia?

As coisas estão mudando lentamente. Mas na cena teatral ainda há muita resistência em delegar determinados papéis a pessoas que têm uma aparência diferente. Eu poderia citar centenas de relatos de atores neste sentido. E também de diretores de casas teatrais, que dizem: 'Não temos no momento nenhum papel turco', como se o migante turco só pudesse interpretar papeis de turcos.

Verrücktes Blut
'Sangue louco' chega aos EUAFoto: Ute Langkafel/Maifoto

Isso é dito por pessoas que, há 30 anos, não têm problemas com o fato de que o príncipe dinamarquês Hamlet seja interpretado por um ator alemão. Ou em dar o papel do negro Otelo a um branco. Mas um ator turco não pode. Isso me irrita muito. Há muitos atores com histórico de migração, também nas escolas estatais. Muitos mais do que se gostaria de ter.

Quando vai mudar algo nos teatro alemães?

Acho que os hábitos vão mudar. Nós, do teatro, rimos um pouco do pessoal da ópera, porque eles são um pouquinho antiquados, muito vacilantes quando se trata de cortar uma cena ou de modificar algo na música. No teatro, exagerando um pouco, há anos que pegamos três frases e modificamos o resto da peça como queremos.

Mas no que diz respeito aos protagonistas, a ópera está muito à frente do teatro. Há 20 anos que há, por exemplo, uma Konstanze de aparência asiática no Rapto do Serralho, de Mozart. E ninguém se surpreende. Isso vai acontecer no teatro também – em 30 ou 50 anos (risos).

Entrevista: Klaudia Prevezanos (sv)
Revisão: Francis França