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Controvérsia sobre Rushdie ressurge em meio a protestos no mundo árabe

20 de setembro de 2012

O romancista Salman Rushdie criticou os protestos em vários países muçulmanos contra o filme anti-Islã realizado nos EUA. Ele disse ainda não se incomodar com novas ameaças à sua vida.

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Foto: picture alliance/ZUMA Press

Uma organização religiosa iraniana teria aumentado a recompensa pela cabeça do escritor indo-britânico Salman Rushdie, de 2,1 milhões para 2,5 milhões de euros por supostamente ter insultado o profeta do Islã há 23 anos. O prêmio inicial pela morte de Rushdie era inferior a 1 milhão de euros.

O jornal iraniano de linha-dura Jornhoori Eslami relatou no último domingo que a fundação religiosa iraniana "15 Khordad" pagaria a recompensa ao assassino de Rushdie.

Em 1989, o aiatolá Khomeini, o ex-líder religioso do Irã, emitiu uma fatwa (decreto religioso) pedindo a morte do autor britânico Salman Rushdie por escrever o controverso romance Versos Satânicos, que, segundo os muçulmanos, humilharia o profeta Maomé.

Rushdie disse que a ameaça mais recente esteve relacionada a "um religioso no Irã à procura de uma manchete." Ao falar no lançamento do seu livro de memórias recém-publicado Joseph Anton, Rushdie disse que a fundação religiosa do aiatolá Hassan Saneii havia oferecido a recompensa por algum tempo, mas que somente algumas poucas pessoas a levaram a sério.

Innocence of Muslims

A controvérsia em torno de Rushdie ressurgiu após a eclosão de protestos violentos em diversos países muçulmanos – incluindo a Líbia, o Egito, o Afeganistão e o Paquistão – contra um filme norte-americano intitulado Innocence of Muslims. O Paquistão e o Afeganistão bloquearam qualquer acesso ao filme pela internet, proibindo por completo o site de compartilhamento de vídeos. Em outros países do sul da Ásia, como a Índia, o próprio Youtube bloqueou o filme.

Capa de "Joseph Anton", autobiografia de Salman Rushdie
Capa de "Joseph Anton", autobiografia de Salman Rushdie

A conexão entre o filme e Rushdie foi que "muitos muçulmanos veem o Innocence of Muslims como uma repercussão dos Versos Satânicos de Rushdie", disse Emrys Schoemaker, pesquisador da London School of Economics.

Ele afirmou que, no passado, a interação entre pessoas com pontos de vista divergentes era limitada, mas que isso mudou com o advento da era da informação.

"Não existe mais o luxo do isolamento. Os extremistas se deparam uns com os outros e não possuem habilidades para o debate. O resultado de tudo isso é que tais pessoas assumem posições radicais, que são destinadas a atrair grupos de interesse", disse.

Política ocidental

Lindsey German, organizador da ONG Stop the War Coalition, em Londres, disse à Deutsche Welle que a reação a Rushdie e ao filme anti-Islã deve ser observada num quadro político mais amplo.

"Eu não concordo com a fatwa à qual Rushdie foi condenado ou com o aumento da recompensa por sua cabeça. Mas não se trata apenas de um autor. Trata-se das políticas dos governos ocidentais no Oriente Médio. Enquanto o Ocidente não mudar sua política para países muçulmanos, tais coisas vão continuar a acontecer", afirmou German.

Protestos contra filme anti-Islã são cada vez mais violentos
Protestos contra filme anti-Islã são cada vez mais violentosFoto: Reuters

Enquanto alguns culpam a política do Ocidente pela eclosão de violência, Adeel Khan, pesquisador sobre as relações do Islã com o Ocidente, de Cambridge, disse que os muçulmanos deveriam "ficar do lado dos melhores exemplos de sua tradição religiosa", em vez de recorrer à violência.

"O profeta Maomé sempre foi misericordioso, tendo perdoado mesmo a seus inimigos de longa data, e sempre instruiu seus seguidores para nunca abusarem dos deuses de seus inimigos", disse Khan à Deutsche Welle. Ele acrescentou que isso ajudaria se as pessoas no Ocidente fossem "mais sensíveis às crenças religiosas e culturas de outros, especialmente no mundo interconectado de hoje".

Syed Ali Mujitaba Zaidi, ativista xiita de Karachi, disse à Deutsche Welle que seria "necessário lembrar repetidamente [ao Ocidente] que não permitiremos que blasfemadores continuem suas atividades, e que vamos transformar suas vidas numa miséria, para que outros não os sigam."

Liberdade de expressão

"O que Rushdie escreveu foi aceitável no Reino Unido e no Ocidente, mas não em países muçulmanos", explicou o jornalista paquistanês Mohsin Sayeed, acrescendo que o Ocidente também mostrou "padrões duplos", no caso de questões que considerava sensíveis.

Rushdie foi condecorado pela rainha britânica em 2007
Rushdie foi condecorado pela rainha britânica em 2007Foto: AP

O livro Versos Satânicos, disse Sayeed, é um romance "mal escrito" e não deveria determinar o valor do autor, que também escreveu Os filhos da meia-noite, um livro "bonito" sobre a divisão da Índia Britânica. "Não devemos levar Versos Satânicos a sério. Acho que nosso profeta era muito maior do que essas coisas triviais", ressaltou o jornalista.

O escritor paquistanês Salman M. Usmani disse à DW que muitas pessoas, provavelmente, estão fazendo barulho em torno de Rushdie, sem mesmo ter lido seus livros.

"A coisa mais estranha sobre escritores controversos é que as pessoas costumam fazer um alarde sobre o conteúdo, e ignoram a narrativa. Ulisses, de James Joyce, por exemplo, é um livro especial por causa de sua narrativa… o que aconteceu quando o romance chegou às bancas foi que as pessoas foram às ruas para protestar contra o seu conteúdo também", disse o escritor.

Muitos escritores sul-asiáticos e críticos literários admiram muito Rushdie como um romancista que tem contribuído imensamente para a riqueza da literatura em inglês.

Autor: Shamil Shams (ca)
Revisão: Roselaine Wandscheer