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Castanha-do-pará na Alemanha para reflorestar o Brasil

Priscila Jordão
12 de outubro de 2017

Start-up pretende ajudar a Floresta Amazônica com a venda de farinha de castanha na Alemanha, onde há demanda por produtos ecológicos. Com o dinheiro arrecadado, milhares de árvores devem ser plantadas no Mato Grosso.

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Castanheira-do-Brasil, também conhecida como castanheira-do-Pará
Castanheira-do-Brasil, também conhecida como castanheira-do-ParáFoto: Eric Bruno Alves da Silva

Depois de passar 13 anos na Bahia e se apaixonar pela Mata Atlântica, o alemão Benjamin Kromayer conheceu a paraense Andrea Heberling em um grupo de coral brasileiro em Berlim. Os dois começaram a namorar, e a paixão em comum pelo meio ambiente deu origem a uma ideia intercontinental: com a venda de produtos amazônicos na Alemanha, eles poderiam reflorestar áreas desmatadas no Brasil.

O plano foi adiante e Kromayer e Heberling criaram a start-up TodaVida. Em seu projeto piloto, a empresa prevê plantar 5 mil árvores da castanheira-do-Brasil, também conhecida como castanheira-do-pará, na região do Arco do Desmatamento, no noroeste de Mato Grosso. Enquanto isso, a farinha de castanhas coletadas por tribos indígenas e processada por uma cooperativa local é comercializada na Alemanha.

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Mais do que trazer mais um produto tropical para consumidores alemães ávidos por novidades orgânicas seguindo os princípios do fair trade (comércio justo), a intenção dos fundadores e de sua equipe é criar as chamadas agroflorestas, que aliam a produção de alimentos ao plantio de espécies arbóreas. Dessa forma, a monocultura é evitada e, ao mesmo tempo, a floresta ganha um uso econômico e, assim, é protegida do desmatamento.

Benjamin Kromayer e Andrea Heberling
Os fundadores da start-up, Benjamin Kromayer e Andrea Heberling, se conheceram em um grupo de coral brasileiro em BerlimFoto: DW/D.Backes

"Queremos reflorestar e, para isso, temos que estabelecer um ciclo em que a própria floresta replantada produza economicamente o valor para plantar mais floresta", afirma Kromayer.

A aposta é que a empresa aproveite a onda de consumidores preocupados em não comprar produtos importados pela Europa de áreas desmatadas, como carne e soja. Na França, por exemplo, a preocupação já chegou às autoridades, e o ministro francês da Transição Ecológica, Nicolas Hulot, anunciou em julho que vai bloquear  a importação de produtos florestais ou agrícolas que contribuam para o desmatamento no mundo, com a Amazônia entre as regiões prioritárias.

Uma iniciativa semelhante ainda não foi tomada pela Alemanha, mas há forte demanda por produtos orgânicos e ecológicos no país. "No Brasil, o mercado orgânico é fraco, e não conseguimos ganhar escala, mas, na Alemanha, há um mercado de sustentabilidade", avalia Kromayer.

Agroflorestas

Importante fonte de renda e nutrição para diversas comunidades tradicionais, a castanheira-do-Brasil, nativa da Amazônia, está ameaçada de extinção, segundo o WWF. Por ser frequentemente derrubada para a construção de estradas, barragens, para assentamentos de reforma agrária e para a criação de gado, a espécie é considerada vulnerável pela União Mundial para a Conservação da Natureza (UICN) e, no Brasil, integra a lista de espécies ameaçadas do Ministério do Meio Ambiente.

Mudas de castanheiras no viveiro de Juruena
Mudas de castanheiras no viveiro de Juruena. Cerca de 800 mudas devem ir para o solo em dezembro de 2017 e outras 4.200 em dezembro de 2018Foto: Fioravante José Montanher

A espécie também não cresce em monocultura, pois necessita do seu ambiente natural para se reproduzir. As flores precisam ser polinizadas por certos tipos de insetos, atraídos por orquídeas que vivem na região, e as sementes são, em muitos casos, plantadas por cutias, que roem a dura casca de seus frutos. Assim, o plantio da castanheira-do-Brasil almejado pela TodaVida só pode dar certo com uma efetiva recomposição de espécies locais.

Em parceria com pequenos agricultores e tribos indígenas associados à Cooperativa dos Agricultores do Vale do Amanhacer (Coopavam), em Juruena, região noroeste de Mato Grosso, o reflorestamento deve recuperar três hectares de áreas degradadas, planeja a TodaVida. A cooperativa atua em parceria com os povos indígenas Caiaby, Munduruku, Cinta Larga de Aripuanã e Apiacá.

"Como a castanheira demora de seis a dez anos para dar frutos, serão plantadas junto com ela espécies com ciclos mais curtos para o agricultor poder viver disso", conta Heberling.

Mudas de castanheira-do-Brasil
Mudas de castanheira-do-Brasil: a árvore está na lista de espécies ameaçadas do Ministério do Meio Ambiente.Foto: Fioravante José Montanher

Sabedoria ancestral

O estudo de todo o processo de importação da farinha de castanha-do-pará, de como realizar o plantio da agrofloresta e as conversas com a cooperativa ocorrem quando Kromayer e Heberling não estão ocupados com seus empregos tradicionais: ela como gerente de projetos de TI e ele na área de seguros. 

Para financiar o plantio das árvores e a importação do produto, a empresa abriu uma campanha de financiamento coletivo, encerrada no incio de outubro. A meta inicial, de arrecadar 12 mil euros, ainda não foi alcançada, mas os fundadores não pretendem desistir. A intenção é reduzir a meta e reabrir a campanha.

No início, o plano é restringir as vendas à farinha de castanha-do-pará, mas o casal realizou recentemente uma viagem ao Brasil em busca de fornecedores e cooperativas que possam ser novos parceiros. Eles analisam transportar outros produtos vindos do cupuaçu, graviola, mangaba e buriti para terras germânicas.

Para Kromayer, além de ampliar o conhecimento sobre a diversidade amazônica na Alemanha, a inciativa deve aumentar a autoestima das populações indígenas no Brasil.

"A implementação de sistemas agroflorestais com espécies nativas traz um resgate da cultura amazônica, com as tribos sentindo valorização de seus conhecimentos ancestrais", diz.

O alemão reconhece que o ponto fraco do projeto para o meio ambiente é a logística da operação e as emissões de gases de efeito estufa que ela acarreta devido à importação dos produtos para a Europa. Contudo, ele afirma que o reflorestamento ajudará a compensar as emissões de poluentes.