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Caso Lambert pode mudar questão da eutanásia na Europa

Wolfgang Dick (av)6 de junho de 2015

Decisão do Tribunal dos Direitos Humanos no caso do paciente francês pode fortalecer futuras posições pró-eutanásia. Porém, panorama jurídico no bloco é complexo, e decisões continuam cabendo aos governos nacionais.

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Foto: picture-alliance/dpa

Vincent Lambert, de 38 anos, sofreu um acidente de carro em 2008 e, desde então, está tetraplégico e em coma. Na última sexta-feira (05/06), o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH) autorizou que a França desligue os aparelhos que o sustentam em estado vegetativo, deixando-o morrer naturalmente.

O destino do francês é semelhante a vários outros na União Europeia. Esse veredicto é especialmente relevante pelo fato de serem tão diversas as legislações nacionais relativas à eutanásia, e poderá fortalecer a posição de médicos e familiares que gostariam de privar os pacientes de sofrimento, quando sua situação é sem saída.

Desde o acidente de motocicleta, cerca de sete anos atrás, Vincent Lambert se encontra em estado vegetativo persistente (EVP), ou coma acordado, sendo mantido vivo exclusivamente por alimentação artificial.

Sua família se encontrava dividida quanto à manutenção das medidas: enquanto os pais eram a favor, a esposa pedia o fim do sofrimento do paciente. Agora o tribunal sediado na cidade francesa de Estrasburgo autorizou a eutanásia passiva, mesmo na ausência de um testamento vital nesse sentido.

Significado da sentença para França

Inicialmente, os veredictos do TEDH só têm caráter de "sentença constatadora", explica Carsten Kalla, do departamento de Direito Europeu da Faculdade Jurídica de Bonn. A corte em princípio apenas constata se, e até que ponto, uma determinada ocorrência viola a Convenção Europeia dos Direitos Humanos.

Em relação a Vincente Lambert, 12 dos 17 juízes concluíram que tal não se aplica à suspensão da alimentação artificial. A principal justificativa da decisão é o fato de a Justiça francesa já ter considerado meticulosamente todos os aspectos médicos e éticos da questão.

Assim, o cuidado absoluto e o exame intensivo de um paciente em coma serão exigências decisivas em casos análogos futuros, para todos aqueles que se reportem a Lambert e a seu veredicto.

A sentença não significa automaticamente que a lei vigente seja anulada, adotando-se uma nova. Na França são os médicos que decidem quanto à suspensão de medidas de prolongamento artificial da vida, caso o paciente esteja incapacitado de comunicar sua vontade. Essa situação permanecerá, mesmo depois da decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Efeitos sobre outros países europeus

O veredicto de Estrasburgo poderá afetar a regulamentação da eutanásia em outros países europeus, uma vez que a Convenção Europeia de Direitos Humanos é um tratado assinado pelos Estados-membros do Conselho da Europa e vinculativo nos termos do direito internacional.

O advogado da esposa de Lambert, Laurent Pettiti, mencionou, de fato, que outros países europeus poderiam tomar as normas francesas e o veredicto como exemplo para sua legislação.

Em princípio, não há uma obrigação nesse sentido. No entanto, todo país europeu que proceda de forma responsável deveria tomar a sentença como diretriz. Em casos concretos, ela poderá vir a respaldar as disposições e posicionamentos legais de médicos e familiares em relação à eutanásia.

O advogado David Schneider-Addae-Mensah, especializado em direitos humanos, confirma tal avaliação. Ele, que lida com o TEDH há muitos anos, afirma que os veredictos da corte "são muito respeitados em todo o mundo".

Frankreich Vincent Lambert im Krankenaus in Reims
Vincent Lambert no hospital em ReimsFoto: picture-alliance/dpa/Photopqr/L'union De Reims

Confusão de leis na Europa

Cada forma de eutanásia está sujeita a regulamentações diversas nos vários países da Europa. Distingue-se entre suicídio assistido – por exemplo, com o fornecimento de medicamentos letais, que o próprio paciente então se autoministra – e eutanásia indireta – com uma dosagem mais alta de analgésicos e os consequentes efeitos abreviadores da vida.

Essa última forma é considerada legal na maioria dos países, inclusive nos predominantemente católicos, como Itália, Espanha, Irlanda ou Hungria. Já a eutanásia ativa – o homicídio a pedido do paciente – é estritamente proibido, em geral. Porém a Suíça permite o suicídio assistido, que a Noruega e a Dinamarca interditam. Na Suécia há regras excepcionais para pessoas físicas.

Nos últimos anos, os países do Benelux são que adotam as legislações mais liberais. Em Holanda (desde 2001), Bélgica (2002) e Luxemburgo (2009) é permitida a eutanásia ativa, embora haja diferenças nos detalhes: em um país só é necessário o paciente expressar repetidamente seu desejo de morrer, em outro precisa registrá-lo por escrito. Em outros casos, ainda, é necessária a constatação e confirmação independente, por vários médicos, de que a condição é incurável.

A França e a Áustria liberaram a eutanásia passiva – por exemplo, com o desligamento dos aparelhos de sustentação vital; enquanto a fortemente católica Polônia se distancia de todas as formas de eutanásia.

Uma normatização do assunto em nível europeu não está em vista. Na opinião de juristas que se ocupam diariamente do tema, os veredictos do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos só têm potencial acompanhar em parte as discussões sobre a eutanásia.