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Antissemitismo persiste na sociedade alemã, afirma relatório

Jefferson Chase jps
25 de abril de 2017

Novas formas de antissemitismo são disseminadas no país, e especialistas alertam que é necessário fazer mais para combatê-las. Comunidade judaica manifesta preocupação com o preconceito vindo de muçulmanos.

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Deutschland Gebet in der Neuen Synagoge in Freiburg in Erinnerung an die Reichskristallnacht
Foto: picture alliance/dpa/W. Rothermel

Políticos e pesquisadores de uma comissão independente criada pelo Bundestag (Parlamento alemão) invocaram repetidamente, durante a apresentação de um relatório sobre antissemitismo na Alemanha, nesta segunda-feira (24/4), um episódio muito divulgado de preconceito contra um adolescente judeu de 14 anos que foi forçado a mudar de escola.

"O caso mais recente de provocações antissemitas e ataques a um garoto judeu no bairro de Friedenau, em Berlim, dá relevância e atualidade ao nosso relatório", disse Patrick Siegele, diretor do Centro Anne Frank, em Berlim. "O caso ilustra a dificuldade que a sociedade alemã tem ao lidar com o antissemitismo."

Em 2016, 644 crimes antissemitas foram registrados na Alemanha, embora o número real deva ter sido bem mais elevado. Depois de analisar diversos estudos sobre o tema, o grupo concluiu que, embora as formas tradicionais de antissemitismo tenham diminuído um pouco, o antissemitismo moderno, por exemplo críticas a Israel que se estendem aos judeus em geral, continua perigosamente popular.

"Cerca de 40% concordam com o antissemitismo centrado em Israel", comentou o deputado verde Volker Beck. "Isso é quase metade da sociedade alemã, e diz muito sobre o ambiente intelectual no qual os judeus têm que viver."

"Novas formas de antissemitismo surgiram, e infelizmente o fim do Holocausto e da Segunda Guerra Mundial não significou o fim dessa forma de preconceito", disse a parlamentar conservadora Barbara Woltmann. "É preocupante que ainda haja antissemitismo latente entre a população."

Os especialistas sugeriram cinco questões centrais para melhorar essa situação. Elas incluem a nomeação de um encarregado federal para casos de antissemitismo, a criação de uma base de dados nacional para crimes antissemitas e o apoio de longo prazo para grupos de pesquisa sobre o antissemitismo na sociedade.

Mas o relatório de 311 páginas, cuja apresentação coincidiu com o Yom HaShoá, o Dia da Lembrança do Holocausto em Israel, servirá de base para futuros debates parlamentares, e não para propostas de legislação. Em um exame mais detalhado, o relatório revela que ainda falta conhecimento sobre as formas modernas de antissemitismo na Alemanha – especialmente o antissemitismo entre os muçulmanos.

Al-Kuds Berlin Pro-Israel Demonstration 25.07.2014
Conflito no Oriente Médio permanece um assunto controverso na AlemanhaFoto: picture-alliance/dpa

Antissemitismo entre muçulmanos

O relatório conclui que o antissemitismo existe na extrema direita e (com menos proeminência) na extrema esquerda do espectro político na sociedade alemã, bem como entre as comunidades muçulmanas. Apesar de judeus na Alemanha verem o antissemitismo entre muçulmanos como um problema crescente, o texto ressalta que a extrema direita é responsável pelo maior número de crimes de ódio.

Os especialistas também enfatizam que o antissemitismo entre as pessoas com ascendência árabe ou turca tem menos relação com a religião e mais com a sua socialização. "Um estudo-piloto encomendado pelo grupo sobre as atitudes dos imãs na Alemanha foi incapaz de identificar qualquer antissemitismo radical", disse Juliane Wetzel, uma das coordenadoras do grupo.

O estudo parcial em questão, no entanto, incluiu apenas 18 imãs que participaram voluntariamente e, portanto, é pouco representativo. Os nove membros do grupo de especialistas reconheceram que são necessárias mais pesquisas para se determinar até que ponto certas organizações e imigrantes na Alemanha têm atitudes antissemitas.

Sem dúvida, a oposição a Israel, que muitas vezes se transforma em antissemitismo, é um elemento formador da identidade de alguns jovens muçulmanos. No entanto, esse tipo de antissemitismo é cultural, e não religioso.

"Há muitos outros fatores relacionados ao fato de uma pessoa ser muçulmana que levam ao antissemitismo ser mais prevalente entre esse grupo, especialmente o histórico de migração dessas pessoas", disse a pesquisadora Beate Küpper. "Os jovens de contextos sociais muçulmanos, tanto turcos como árabes, são em média mais antissemitas do que outros jovens, mas não são mais antissemitas do que os jovens com outras origens migratórias, como os da antiga União Soviética."

Falta de resultados práticos

Não é nenhum segredo que a palavra judeu é muitas vezes encarada como um insulto entre os jovens de escolas que ficam em bairros de imigrantes em Berlim. Os xingamentos, no caso do garoto de 14 anos de Berlim, partiram de turcos e árabes. A questão é o que pode ser feito para combater essas e outras manifestações de antissemitismo na vida cotidiana na Alemanha.

Alter Jüdischer Friedhof in Leipzig Hakenkreuze Archiv 1992
Maior parte dos crimes antissemitas na Alemanha continua sendo de autoria de membros da extrema-direitaFoto: picture-alliance/dpa

As conclusões e recomendações dos estudos do grupo de especialistas serão tema de debate no Parlamento alemão. Mas, com apenas um punhado de semanas restando neste período legislativo, o grupo admite que a ação política provavelmente não acontecerá tão cedo.

É a segunda vez que um grupo de especialistas apresenta um relatório desse tipo. Os resultados obtidos na primeira ocasião, em 2009, não foram bons. "Perguntei aos membros do meu grupo parlamentar no que deram as recomendações e exigências do primeiro relatório", disse Beck. "Em resumo: praticamente nada."

A estrutura federalista da Alemanha é uma das razões pelas quais o combate ao antissemitismo cotidiano pode ser lento. Os membros do grupo de especialistas concordam que o antissemitismo é muitas vezes ensinado nas escolas apenas em conexão com a história da Alemanha nazista. Segundo eles, é preciso também apresentar o antissemitismo moderno.

Só que os currículos escolares são da responsabilidade exclusiva dos 16 estados federais. Tudo o que o governo federal pode fazer nessa área é emitir recomendações e fornecer dinheiro para projetos.

Qualquer ação concreta é muito improvável de ocorrer antes da eleição nacional, prevista para setembro, e da formação de um novo Parlamento, que quase certamente incluirá o partido Alternativa para a Alemanha (AfD), da direita populista, e que tem entre seus membros pessoas acusados de manter uma simpatia velada pelo nazismo.

Assim, infelizmente há poucas chances de se ver em breve medida para evitar incidentes como o que ocorreu na escola de Berlim.