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Albinos vivem perigosamente na Tanzânia

19 de março de 2015

Desde 2000, mais de 70 portadores do distúrbio congênito foram vítimas de mutilação e assassinato no país, devido à crença de que têm poderes mágicos. Em meio a ceticismo, políticos prometem coibir violência.

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Foto: Getty Images/AFP/T. Karumba

Hassan Khamisi vive em Shinyanga, cidade no norte da Tanzânia. O adolescente, de 17 anos, é um tanzaniano comum. Ele vai à escola, como as outras crianças. No entanto, ele se destaca por ser albino. O distúrbio congênito ocorre em todo o mundo e se caracteriza pela ausência de pigmentos na pele. Cerca de 1.400 tanzanianos são albinos.

Entre as implicações para a saúde estão uma pele mais sensível e um elevado risco de câncer. Fora isso, Khamisi poderia levar uma vida normal, não fosse o constante medo de que as pessoas o ameacem, ataquem ou até o matem. Isso porque na Tanzânia existe a superstição de que os albinos têm poderes mágicos.

Num dos mais recentes casos de perseguição contra albinos publicados pela imprensa tanzaniana, o menino de seis anos Baraka Cosmas teve a mão decepada no distrito de Rukwa, no oeste do país. Partes do corpo de albinos são negociadas como amuleto da sorte no país e usadas por curandeiros tradicionais para fazer poções mágicas.

Uma mão de albino chega a valer cerca de 600 dólares no mercado negro. No momento do ataque, Cosmas estava sozinho com sua mãe. A polícia prendeu sete suspeitos, incluindo o pai do menino. "Essas notícias fazem com que o medo seja meu companheiro constante", diz Khamisi, em entrevista à DW. "Sempre que vou dormir, quando acordo, esse medo está lá. Mesmo nos momentos em que eu estou seguro."

Afrika Albino Verfolgung Diskriminierung
Said Abdallah perdeu a mão esquerda num ataque em 2010Foto: AP

Medo dos curandeiros

Na verdade, Khamisi deveria se sentir seguro onde vive, na instituição Buhangija, que garante proteção e educação para crianças albinas. Mas a vigilância reforçada parece não ser suficiente. Ele sente arrepio só em pensar nos curandeiros tradicionais. "Essas pessoas podem estar em qualquer lugar, a qualquer hora", diz Khamisi. Outra coisa que lhe causa preocupação é que, quando for maior de idade, ele será obrigado a deixar o refúgio.

Enquanto isso, as histórias de horror se multiplicam. Segundo dados da ONU, apenas nos últimos seis meses, ao menos 15 albinos foram sequestrados, feridos ou mortos na Tanzânia e nos países vizinhos, Malawi e Burundi. Na Tanzânia, desde 2000, ao menos 72 albinos foram vítimas de violência.

Diante dos incidentes, a polícia decidiu agir mais energicamente e prendeu mais de 200 curandeiros. Há poucos dias, quatro pessoas foram condenadas à morte, devido a um caso de assassinato em 2008. O próprio presidente tanzaniano, Jakaya Kikwete, reuniu-se recentemente com representantes de associações de albinos e se disse favorável a providências mais enérgicas.

A nova atenção política também pode ser entendida como uma tentativa de melhorar a imagem do governo, já que a Tanzânia se prepara para eleições gerais em outubro. Muitos veem o ativismo por parte do governo como hipócrita. Críticos acreditam que especialmente políticos recorram aos curandeiros, acreditando que seus poderes mágicos possam ajudá-los na campanha eleitoral.

"O que somos para essas pessoas?", questiona Khamisi. "Somos aqueles que devem ajudar os políticos a ter sucesso? As eleições se aproximam, e os assassinatos se multiplicam", desabafa.

Jakaya Kikwete Tansania Präsident
Presidente Jakaya Kikwete se diz favorável a medidas enérgicas contra perseguição a albinosFoto: Reuters

Campanha de conscientização

O jornalista tanzaniano Henry Mdimu lançou uma campanha de conscientização para o problema dos albinos. Embora ele mesmo tenha o distúrbio congênito, o jornalista diz que nunca enfrentou dificuldades. "Em toda minha vida, nunca tive a sensação de que faltava alguma coisa", afirma.

Por isso, Mdimu demorou para entrar na luta pela minoria à qual pertence. Quando se tornou ciente de que outros albinos vêm sendo marginalizados há anos e que a situação não melhorou para eles, ele achou que algo estava faltando nas campanhas sobre o tema já existentes. Então, decidiu viajar pelo país com dinheiro do próprio bolso, para chamar atenção para o problema nos lugares onde a superstição está mais arraigada.

No entanto, os ativistas em prol dos albinos lutam contra vários problemas. Uma grande manifestação programada para o último domingo foi cancelada pela polícia no último minuto, supostamente por motivos de "segurança".

Conseguir unir as diversas instituições que cuidam do problema também é um desafio. "Toda organização que lida com albinos tem que, primeiro, reconhecer que não pode agir como se fosse a única voz desse grupo", diz Abdallah Possi, jurista da Universidade de Dodoma e primeiro advogado albino da Tanzânia. Ele ressalta que tais campanhas costumam ser muito caras e, por isso, a cooperação é muito importante, especialmente num país grande como a Tanzânia.