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Aggro Berlin: sex(ism)o, violência, drogas e pouco rock'n'roll

Rodrigo Rimon15 de julho de 2005

'Planet pro Berlin' salva órfãos da Love Parade – Live 8: música pop pela África – O Nipplegate no escuro de Mariah Carey – Tiefschwarz: comendo livros – Aggro Berlin: como o hip hop alemão perdeu a graça

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Selo de hip hop berlinense choca com temas nacionalistas

Mariah evita Nipplegate

Mariah Carey teve mais sorte que Janet Jackson. Ou um manager mais atento a incidentes. Desde seu lançamento na Alemanha, o álbum Emancipation of Mimi não sai das paradas. Mas tão emancipada assim, Mimi não é.

Karlsruhe foi a única cidade alemã da turnê internacional de Mimi. Cerca de 4,5 mil fãs assistiam ao show a céu aberto e tudo corria bem, até que, durante o bis, as luzes e os dois telões se apagaram. Faltou energia? Não, foi o manager que agiu às pressas quando o bustiê que Mariah trazia arrebentou. Sorte! Outras pagaram caro pelo mesmo delito.

Tiefschwarz: coma livros!

Os irmãos Ali e Basti Schwarz respondem pelo nome de Tiefschwarz. E eles acabaram de lançar um novo álbum: Eat Books. Tiefschwarz se tornou referência na cena house alemã e européia em 2001, com o álbum de estréia Ral 9005, recheado de um deep house limpo, decorado com elementos jazzísticos. O single No More Trouble lotava pistas por toda a Europa e os irmãos de Stuttgart se tornaram dois dos mais cobiçados DJs do continente.

Gruppe Tiefschwarz
Os irmãos Basti e Ali SchwarzFoto: Axel Jansen

Até então, era isso: muitas festas, discotecagens, remixes. Agora a coisa parece ter mudado. A música house acabou cedendo espaço nas pistas para o grande revival dos anos 80, e a palavra da moda era o eletroclash. Há quem goste e quem odeie, mas o estilo muito contribuiu para quebrar as fronteiras entre gêneros musicais.

Plattencover Tiefschwarz
Tiefschwarz: 'Eat Books'

Eat Books é um reflexo disso. Uma música house mais amadurecida e mais aberta, um álbum mais pop, com mais guitarras, sintetizadores e uma novidade: vocais (entre os convidados estão Tracey Thorn, do Everything But The Girl, e Matt Safer, do The Rapture). É normal: quem come livros, acaba vomitando palavras.

Festa de step

O fim da Love Parade deixou um sabor amargo na cena tecno da capital. Mas órfã, Berlim não ficou. No mesmo final de semana (09/07) em que os fãs da parada do amor teriam coberto o parque Tiergarten de lixo, caso a Love Parade tivesse encontrado patrocinador, aconteceu a festa Planet pro Berlin.

Planet pro Berlin, Alternativparty zur Love Parade
Foto: dpa

Foram dez palcos separados por apenas 100 metros de distância, nos quais, durante dez horas, clubes, gravadoras e revistas de música da cidade apresentaram seus melhores DJs. Cerca de 15 mil pessoas dançaram a céu aberto, entre o anjo (Siegessäule) e a praça Potsdamer Platz. Entre os DJs convidados estavam estrelas internacionais, como o DJ Animal, do Brasil.

Live 8 em Berlim

A partir de agora, o assunto é sério. O evento do mês foi o Live 8. Berlim foi uma das nove cidades que sediaram o evento, embora nem todos que assistiram aos shows saibam por quê. Paris, Londres, Moscou, Filadélfia, entre outras metrópoles internacionais, reuniram estrelas de pequeno, médio e grande porte. Mas "isso não é um show de rock, é um protesto", gritava do palco o desesperado Campino, líder da banda punk Die Toten Hosen.

Live 8 Berlin Brandenburger Tor Die Toten Hosen
Foto: AP

Berlim viu bandas alemãs como Wir sind Helden, Silbermond, Herbert Grönemeyer e até alguns grandes internacionais, como A-ha, Roxy Music, Green Day e Faithless. Mas o papel político do evento – um protesto contra a atitude dos países ricos em relação à África – parece ter passado batido até pelos governantes.

Tanto que o público teve de se aglomerar nos longos corredores do Tiergarten e quem pôde reconhecer a silhueta do palco a quilômetros de distância se deu por satisfeito. Tudo isso para que o gramado e os regadores automáticos em frente ao Parlamento alemão não fossem danificados.

Se as coisas chegaram a esse ponto, nem vale mais a pena reclamar que muitos dos presentes não sabiam do que se tratava. Pois, enquanto os tablóides britânicos comparam o organizador Bob Geldof à Madre Teresa e sugerem seu nome ao Nobel da Paz, o jornal Star, de Johannesburgo, lembra que a maior parte dos africanos nem tomou conhecimento do evento.

Leia mais na página seguinte sobre a polêmica no hip hop alemão.

Prédio da Deutsche Welle em Berlim, bairro de Wedding. Um calor de 30 graus, a janela aberta, um carro passa pela rua com o rádio no volume máximo: um rap, daquela variante nacional e nacionalista que, de uns tempos para cá, conquistou seu espaço nas paradas. Mais precisamente desde que o selo berlinense Aggro Berlin começou a lançar seus artistas em 2000.

Foi aí que a coisa começou a ficar séria. Primeiro veio a fase da irresponsabilidade social, quando clipes de rappers como Bushido, Fler e sido eram veiculados sem parar em canais de música como MTV e VIVA. Logo, suas músicas viraram toques para celular e invadiram o espaço dos comerciais de TV. Levou um tempo até que a mídia alemã acordasse para os absurdos que essa nova geração de rappers alemães saem rimando por aí.

Fler
FlerFoto: Aggro Berlin

Insígnias neonazistas como decoração

O alarme soou o mais tardar em maio, mês de lançamento do álbum Neue Deutsche Welle, do Fler. Antes de o disco chegar às prateleiras, a gravadora tinha iniciado uma campanha polêmica: "a partir de 1º de maio, contra-atacaremos". Semanas antes dos 60 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, a referência direta à declaração de guerra de Hitler à Polônia é mais que inaceitável.

Segundo a Spiegel Online, "a estratégia da Aggro Berlin tira proveito do mais escandaloso tabu da sociedade alemã". Fler entoa versos como "preto, vermelho e amarelo-ouro [as cores da bandeira alemã], duro e orgulhoso" e transforma insígnias neonazistas em objetos de decoração: na capa, o título do disco está escrito com letras góticas, e Fler traz no ombro uma águia. No vídeo da faixa-título, a câmera passa dos carros de luxo a bandeiras da Alemanha.

O cotidiano do gueto e as drogas

A mídia alerta, mas os rappers se defendem, dizendo, de peito estufado, que sua preocupação é refletir nas músicas o duro cotidiano das habitações sociais, do desemprego, do ócio intelectual.

E a estratégia da mídia é outra: não se trata de denunciar os cantores como mentores de uma geração em perigo, mas de escancarar a força de marketing por trás disso tudo. Fler, Bushido e sido não passam de montagens. Personagens atrás de dinheiro.

Rapper SIDO - Konzert in Magdeburg
sidoFoto: dpa ZB - Fotoreport

O responsável pela imagem de Fler – o grafiteiro Specter – também ficou a cargo da de sido, outro que muito contribui para o sucesso do selo. Segundo o próprio, seu nome antes significava Scheisse in dein Ohr (m**** no seu ouvido), o que até fazia sentido. Mas hoje ele prefere apresentar-se como Super-inteligentes Drogenopfer (vítima superinteligente das drogas).

Sua maior característica é uma máscara prateada que traz constantemente e com a qual tentava esconder a identidade. Em sua música, reinam a violência, a vulgarização e degradação da mulher, a homofobia e a glorificação das drogas. Na verdade, os ouvintes é que são as verdadeiras vítimas da droga que ele faz.

Parental advisory!

Esses músicos estão agora caindo na mira da censura, que quer evitar que seus discos sejam vendidos a menores de idade. O Departamento Federal de Mídias Nocivas à Juventude (BPjM) já colocou dois álbuns do selo Aggro em sua lista, além do novo álbum do rapper Bushido, que também pertenceu à Aggro até assinar com a Universal.

Bushido
BushidoFoto: Universal

Três dos cinco álbuns do Bushido caíram sob o crivo da censura. Mas ele não se deixa intimidar e diz que não se sente responsável pelo impacto de sua música. "Eu digo a essas crianças: se apertarem play, vocês terão 70 minutos da minha vida. Quando apertarem stop, vocês estarão de volta a suas vidas, com seus pais, professores e os policiais, que vão prender vocês, se fizerem besteira."

Mas a verdade parece ser outra. "Aos poucos, isso tudo se torna normal. No hip hop alemão do novo século, a violência é um trunfo e ser gay é motivo para matar. O negócio é se mostrar, aniquilar e f***r", resumiu o Süddeutsche Zeitung. "No momento, igualdade e fraternidade obviamente não têm a menor chance entre os jovens, contra uma identidade de videogame construída com base em fantasias masculinas de potência", lamentou a Spiegel Online.

A gravadora respondeu em seu site: "Os políticos e jornais irritados deveriam ter em mente que estabelecer critérios para a arte, instrumentalizá-la ou até proibi-la é sempre o primeiro passo em direção à ditadura e ao facismo".

Quem ganhou o CD do Andreas Dorau, sorteado por esta coluna no mês passado, foi Aishá Roriz, de Salvador–BA. A compilação Não-Wave saiu para Luiz Henrique Schroder, do Rio de Janeiro-RJ. Não se preocupem, vocês receberão uma confirmação por email e os CDs serão enviados aos endereços fornecidos.