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Abbas ainda sofre com sombra de Arafat

Anne Allmeling (pv)13 de novembro de 2014

Atual líder da ANP parece se encontrar preso no mesmo beco sem saída de seu carismático antecessor, morto há uma década. Porém, sem ter o mesmo prestígio entre os palestinos.

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Foto: Reuters/I. Rimawi

Era uma marcha fúnebre sem fim. Seis homens carregavam um caixão coberto com uma bandeira palestina. Dezenas de pessoas o seguiam, chorando a morte de Yasser Arafat. O presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP) foi na verdade enterrado em Ramallah há dez anos – e não no campo de refugiados palestinos no sul do Líbano, onde ocorria a cerimônia.

Mas o luto por sua morte era tamanho que o grupo resolveu carregar um caixão vazio para o túmulo. Uma vez mais, os refugiados queriam estar perto de seu líder, ao menos em pensamento, já que eles não podiam regressar às suas casas.

Arafat, morto num hospital militar de Paris em 11 de novembro de 2004 e enterrado em Ramallah no dia seguinte, era um símbolo de esperança, especialmente para os refugiados palestinos. Ele queria um Estado palestino independente, e lutou por isso com todos os meios.

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Como líder do Fatah, que posteriormente formou o núcleo da Organização para a Libertação da Palestina (OLP), Arafat foi responsável por numerosos ataques contra alvos israelenses, jordanianos e libaneses. Somente na década de 90, quando se isolou politicamente, ele aderiu às negociações de paz com Israel.

"Por muito tempo pareceu que a assinatura da declaração de princípios que deu origem aos Acordos de Oslo foi a maior proeza política de Arafat", diz o analista político Martin Beck, especialista em Oriente Médio da Universidade do Sul da Dinamarca.

Da perspectiva de hoje, no entanto, isto é algo duvidoso: "A formação e o conteúdo da declaração de princípios eram extremamente problemáticos. Arafat aceitou um processo de paz assimétrico, e o povo da Palestina sofre com isso até hoje", completa.

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Confrontos entre palestinos e forças israelenses no campo de refugiados de Shuafat no oeste de JerusalémFoto: Coex/AFP/Getty Images

Após o fracasso das negociações de paz em 2002, Arafat tolerou e apoiou a segunda Intifada, a resistência armada contra Israel. Uma das razões era que, com o movimento radical islâmico Hamas, surgia uma séria concorrência – mesmo que Arafat tenha se mantido um indiscutível líder carismático dos palestinos até a sua morte.

Seu sucessor, Mahmoud Abbas, se distanciou do curso de confrontação. Diferentemente de Arafat, que sempre usava um uniforme caqui e um keffiyeh xadrez preto e branco na cabeça, Abbas se vê mais como um intelectual e pragmático, que busca alcançar, com pequenos passos, a criação de um Estado palestino através de negociações. Ele defende que a revolta violenta do povo palestino não rendeu frutos, senão apenas condenação mundial.

Mas dez anos depois de tomar posse, Abbas parece se encontrar preso no mesmo beco sem saída de seu carismático antecessor, porém sem o prestígio da maioria dos palestinos. Além disso, com o Hamas há uma concorrência radical, que, mesmo sem grandes feitos, hoje controla a Faixa de Gaza. Com isso, ela compete com a OLP de Abbas, que possui a palavra final na Cisjordânia.

"Todos os dias eles falam contra nós, como os israelenses. Dizem exatamente as mesmas palavras, usam a mesma retórica", criticou Abbas, durante cerimônia em memória dos dez anos da morte de Arafat.

Condição de vida não melhora

As condições de vida dos palestinos praticamente não melhoraram na última década. Pelo contrário: muitas das queixas que os palestinos tinham há dez anos perduram ou até aumentaram. A Faixa de Gaza está hermeticamente isolada e sem perspectivas econômicas, e Israel continua com a construção de assentamentos na Cisjordânia.

Aliado a isso, muitos palestinos criticam a colaboração da Autoridade Nacional Palestina com as forças ocupantes. "Em comparação com a Faixa de Gaza, as pessoas na Cisjordânia tiram proveito de uma situação melhor em termo materiais e de segurança. Mas isso também tem um preço alto, pois em muitos aspectos, para eles, parece que Abbas de fato entrou em um acordo com a odiada ocupação", opina Beck.

Brandanschlag auf eine Moschee in Ramallah 12.11.2014
Mesquita na cidade de Ramallah, na Cisjordãnia, foi alvo de ataques incendiáriosFoto: Reuters/A. O. Qusini

A formação de um governo de unidade nacional, sobre o qual o Fatah e o Hamas concordaram em abril, também vem recebendo críticas. Progressos são difíceis de serem vistos, e as anunciadas eleições parlamentares também estão na espera.

Da mesma forma que Abbas ostenta uma boa imagem entre políticos ocidentais, ele carece de popularidade com o seu próprio povo. Entre os palestinos, há os que acusam Abbas de ser passivo em relação à política israelense para a Faixa de Gaza e a Cisjordânia. E muitos não querem saber de uma resistência pacífica – principalmente desde que as forças israelenses voltaram a intensificar a repressão.

Dez anos após a morte de Yasser Arafat, muitos palestinos anseiam por uma figura indiscutível de liderança, que lhes de esperanças de um Estado próprio e independente. Esperança essa que o povo palestino parece não relacionar a Mahmoud Abbas.