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"A única prisão que pode sair é a de Cunha", afirma jurista

Jean-Philip Struck8 de junho de 2016

Em entrevista, Luiz Flávio Gomes afirma que ex-presidente da Câmara "pratica permanentemente atos que asseguram sua impunidade". Áudios vazados não seriam suficientes para fundamentar prisões de Renan, Sarney e Jucá.

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Eduardo Cunha
Segundo PGR, Eduardo Cunha continua interferindo na Câmara após ser afastadoFoto: Reuters/U. Marcelino

A divulgação dos pedidos de prisão dos senadores Romero Jucá e Renan Calheiros, do ex-presidente José Sarney e do deputado afastado Eduardo Cunha – todos do PMDB – levantaram questões sobre a real possibilidade de que elas sejam concretizadas e sobre o possível impacto no cenário político e jurídico brasileiro.

Em entrevista à DW Brasil, o jurista Luiz Flávio Gomes, presidente do Instituto Avante Brasil, afirma que de todos os pedidos, apenas o de Cunha parece ter chance de ser aceito pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

"Com base nos áudios, não vai ter prisão", afirmou o jurista, citando as gravações realizadas pelo ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que registrou conversas em março com Jucá, Renan e Sarney. Os diálogos sugerem que eles tramaram para sabotar a Lava Jato.

Já o pedido contra Cunha envolve uma avaliação da Procuradoria-Geral da República (PGR) de que, mesmo após ser afastado do comando da Câmara por ordem da Justiça, o deputado continua interferindo em seu funcionamento para atrapalhar as investigações que tramitam contra ele na Casa.

DW: Os pedidos de prisão chegaram ao STF há mais de uma semana. O vazamento deles pode ser encarado como uma forma de pressionar os ministros a tomarem uma posição?

Jurista Luiz Flávio Gomes
Gomes: "O Supremo está reagindo contra toda essa cleptocracia brasileira"Foto: Luiz Flávio Gomes

Luiz Flávio Gomes: Os vazamentos têm um objetivo mais amplo. Não é só pressionar ministro. Eles fazem parte da estratégia da Lava Jato, que precisa do reconhecimento da opinião pública, a destinatária final dos vazamentos. Para ter a população ao seu lado, a operação tem que publicar suas ações. Por tabela, esses vazamentos também alcançam os ministros. E se a opinião pública se inflama, é claro que o STF se sente pressionado. O próprio juiz Sérgio Moro já havia escrito há dez anos como vê a Lava Jato: prisão, delação e vazamento para a opinião pública.

Detalhes sobre os pedidos não foram divulgados, apenas as gravações de Sérgio Machado. O senhor avalia que o conteúdo delas é suficiente para fundamentar os pedidos de prisão contra Renan, Jucá e Sarney?

Não. E isso porque não está mais caracterizado aquele estado de flagrância, de que continuam a cometer crimes. Já passou. E só se pode prender parlamentar em estado de flagrância. Mas só essas gravações se tornaram conhecidas. O [procurador-geral da República, Rodrigo] Janot pode ter provas mais contundentes. Com base nos áudios, não vai ter prisão. Eles mostram uma articulação contra a Lava Jato. Agora, existe uma distância entre o que é planejado e o que é feito. Nós não sabemos se eles fizeram algo de concreto – e se isso ainda continua. Ou o Janot tem mais coisas que a gente ainda não sabe, ou ele entrou num jogo arriscado.

Caso existam provas mais contundentes, como o STF deve se posicionar em relação aos pedidos? A prisão do ex-senador Delcídio do Amaral e o afastamento de Cunha podem ser encarados como um precedente?

O Supremo está reagindo contra toda essa cleptocracia brasileira, contra as oligarquias que roubam o país e sempre ficam impunes. A Lava Jato é uma reação. E o Supremo entrou nessa onda de endurecer. Primeiro foi a prisão do Delcídio, depois a decisão de permitir prisões após julgamento de segunda instância. O Supremo não quer ficar para trás. Porém, tudo tem limite. A Constituição está aí, e é preciso preencher requisitos para as decisões. Do contrário, o Supremo se torna um órgão arbitrário. É preciso esperar Janot mostrar quais são as outras provas.

E o caso de Cunha? Seu pedido de prisão aparentemente é baseado na interferência dele nos trabalhos da Câmara, mesmo após seu afastamento.

A questão dele é mais complexa. Por exemplo, comparando com o Renan, Cunha pratica permanentemente atos que asseguram sua impunidade. Então, de todas as prisões pedidas, a única que poderia sair é a de Cunha. O caso do seu afastamento, em maio, demorou meses, mas quando foi julgado não havia perdido aquela urgência, já que ele continuava a praticar os atos – diferente do que se sabe até agora no caso de Sarney, Jucá e Renan. Cunha continua dando margem.

É a primeira vez que a PGR pede o afastamento e prisão de um presidente do Senado. A Lava Jato está ficando mais agressiva em relação ao mundo político?

Está. E vai ficar cada vez mais. A Lava Jato começou a ser criticada por dar muita atenção ao PT, por bater demasiadamente no partido. Se ela for identificada com qualquer outro partido, então acabou, deslegitima tudo. Só que agora entrou um novo grupo de oligarcas no poder. Ao ir pra cima deles, a Lava Jato mostra imparcialidade e conserva a credibilidade com a opinião pública.

Os pedidos de prisão estão testando um novo limite para a imunidade parlamentar?

A imunidade tem que existir, sobretudo, para manifestações do parlamentar em nome do interesse público. Mas uma imunidade que vem em defesa de atos criminosos e corruptos vira privilégio. E temos que acabar com isso. É preciso colocá-la dentro de limites. E esse momento é ideal para discutir tudo isso. Atos criminais não podem estar amparados por imunidade.