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A posição dúbia da Arábia Saudita em relação ao terrorismo

9 de agosto de 2016

País é acusado constantemente de apoiar grupos jihadistas, mas permanece como aliado do Ocidente. A contradição não é tão simples – e tem suas raízes ligadas à base ideológica que sustenta o regime.

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Membros da Casa de Saud
Membros da Casa de SaudFoto: Reuters/Saudi Press Agency

Há anos, a Arábia Saudita tem sido uma fonte de informações contraditórias. Primeiro, o país foi acusado de exportar uma variedade extremamente conservadora do islã sunita, conhecida como wahabismo, que também é a religião oficial do reino. Logo após o início da guerra civil na Síria, surgiram acusações crescentes de que a coroa estava financiando grupos jihadistas que não queriam apenas derrubar o regime de Bashar al-Assad, mas também criar um novo "califado" sob o domínio do "Estado Islâmico". E, durante vários anos, o Ocidente considerou a Arábia Saudita como um parceiro importante na luta contra o terror jihadista.

Sebastian Sons, especialista em Oriente Médio do Conselho Alemão de Relações Externas (DGAP), afirma que essas notícias não são tão contraditórias como inicialmente aparentam ser.

"O governo saudita esteve envolvido na luta contra o terror desde os ataques do 11 de Setembro. Isso foi em parte uma reação à pressão americana. Mas também porque as instituições do reino estavam sendo alvo crescente de ataques jihadistas, primeiro da Al-Qaeda e depois do EI.”

Ao mesmo tempo, há um número relevante de fundações religiosas no país e algumas delas, assim como alguns indivíduos ricos, têm simpatia pelos objetivos do "Estado Islâmico" e ajudam a financiar o grupo.

"Esse trânsito de verbas está sendo agora monitorado de perto", diz Sons, que explica que, ainda assim, não existe uma fórmula para exercer um controle total. "Primeiramente, a Arábia Saudita não tem a capacidade para fazer isso. Em segundo lugar, é preciso admitir que existem sérias dúvidas se eles têm a vontade política."

De qualquer forma, mesmo que a casa real tivesse vontade, ela não poderia fazer muita coisa. Isso porque a Casa de Saud, que controla o país desde a sua fundação no século 18, é totalmente dependente dos wahabistas conservadores. É esse movimento religioso que confere a ela a legitimidade ideológica na qual seu poder é baseado.

O presidente dos EUA, Barack Obama, e o rei saudita Salman
O presidente dos EUA, Barack Obama, e o rei saudita SalmanFoto: Saul Loeb/AFP/Getty Images

Aliança entre religião e política

A fundação moral para o domínio dos Sauds foi estabelecida por um teólogo originário da região onde hoje fica a capital Riad. Ele era conhecido como Muhammad ibn Abd al-Wahhab, era filho de um juiz e nasceu em 1703.

Ibn Wahhab desenvolveu um critério totalmente novo para analisar a legitimidade dos governantes regionais. A legitimidade, disse ele, só reside enquanto os governantes cumprirem com os princípios de uma fé religiosa. Líderes políticos, de acordo com wahhab, devem obedecer à vontade de Deus em todas as suas atividades. Se eles falharem nisso, a pena é a perda da legitimidade.

Assim, foi dado aos súditos um critério claro para julgar seus governantes: as suas ações expressam a vontade de Deus, ou não? Foi uma ideia radicalmente emancipadora, mas que desde o início carregou a semente para abusos que viriam: afinal, quem determina qual é a vontade de Deus?

Wahhab desenvolveu uma solução única para o problema: ele vinculou diretamente o poder religioso ao poder político. E ele fez isso ao buscar uma aliança com aquele que era o parceiro mais poderoso do seu tempo: Ibn Abd al-Aziz ibn Muhammad al-Saud, o príncipe Saud 1º, conquistador do emirado de Diriyah, o primeiro Estado saudita. O príncipe assegurou o poder teológico do seu parceiro com poder militar. Em troca, recebeu do teólogo a bênção religiosa para legitimar o seu domínio.

A aliança entre essas duas famílias, os governantes Sauds e os descendentes de Wahhab – responsáveis por analisar todas as questões religiosas do reino – continua até hoje.

Um dilema não solucionado

Por necessidade, a aliança também determina a natureza da posição atual da família real em relação ao terrorismo. "A família real enxerga o terrorismo como uma ameaça crescente à segurança, mas ainda assim tem que se alinhar ideologicamente com os teólogos wahabistas", afirma Sebastian Sons.

Isso significa que a monarquia é constante forçada a tolerar essa – por vezes – visão radical do mundo. Eles raramente podem se dar ao luxo de recusar apoio. "A estrutura do Estado saudita é baseada em uma aliança entre os teólogos wahabistas e a Casa de Saud. Ainda hoje isso é um dilema insolúvel para a família real."

Isso significa que o resto do mundo vai ter que conviver com a realidade de mais ataques sendo orquestrados a partir da Arábia Saudita. Enquanto o extremismo ideológico não for superado, medidas de segurança só poderão ajudar até certo ponto.