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Zimbabué: O finca-pé de Robert Mugabe na Presidência

Lusa | EFE | AFP | AP | mjp
19 de novembro de 2017

ZANU-PF diz que Mugabe deve demitir-se da Presidência do Zimbabué até ao final da manhã de segunda-feira ou terá início o processo de impugnação. Num discurso à nação, Mugabe desafiou as expetativas e mantém-se no poder.

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Simbabwe Harare Robert Mugabe
Foto: picture-alliance/AP Photo/B. Curtis

Esperava-se que Robert Mugabe anunciasse a sua demissão num discurso à nação emitido este domingo (19.11) pela televisão estatal ZBC, mas o Presidente do Zimbabué desafiou as expetativas: 37 anos depois, sob pressão do Exército, do seu partido e de milhões de zimbabueanos, Mugabe continua no poder.

O chefe de Estado - que foi deposto este domingo da liderança do ZANU-PF - rejeitou que a intervenção militar no país tenha sido "um desafio" à sua "autoridade como chefe de Estado" ou "uma ameaça à Constituição".

"Dirijo-me a vocês esta noite na sequência de uma reunião que tive hoje com as Forças Armadas (...) despoletada por preocupações com o estado da Nação e do ZANU-PF, no poder. Eu, como Presidente do Zimbabué e comandante-em-chefe das Forças Armadas, reconheço as questões que foram levantadas e acredito que foram levantadas no espírito de honestidade e preocupação com o estado do nosso país", começou por dizer o chefe de Estado.

Simbabwe Soldaten in Harare
Soldados nas ruas de HarareFoto: Reuters/P. Bulawayo

Entre as preocupações em debate no encontro, segundo Mugabe, esteve a economia, que, reconheceu, "atravessa um período difícil". Robert Mugabe, frisou que "o povo precisa de paz, segurança, lei e ordem" e condenou ainda a troca de acusações pública entre "partido e membros do Governo", que legitimam as críticas à as autoridades do Zimbabué.

"A era de vitimização e decisões arbitrárias tem de ser ultrapassada", acrescentou. "As questões levantadas pelo ZANU-PF têm de ser tratadas com urgência". "O Congresso [do ZANU-PF] terá lugar dentro de algumas semanas. Vou presidir a estes processos, que não devem ser dominados por quaisquer atos calculados para minar [o Congresso] ou comprometer os resultados aos olhos do público", acrescentou o Presidente zimbabueano.

Comité Central expulsa Robert e Grace Mugabe

Horas antes, o partido no poder no Zimbabué destituiu Robert Mugabe da liderança da União Nacional Africana do Zimbabué - Frente Patriótica (ZANU-PF). O Comité Central do ZANU-PF, que se reuniu de urgência para analisar a crise político-militar zimbabueana, decidiu também nomear como novo líder o antigo vice-Presidente do Zimbabué Emmerson Mnangagwa, afastado do cargo há duas semanas por Robert Mugabe. 

Citado pela Agência France Presse, o partido no poder avançou que "Emmerson Mnangagwa foi eleito presidente e primeiro secretário do ZANU-FP [...] e designado candidato presidencial às eleições de 2018".

"Foi adotada uma resolução para remover o presidente e substitui-lo por Mnangagwa", disse à AFP fonte partidária.  

"Destituímos o Presidente Mugabe, ele já não é o presidente do ZANU-PF. Que saia com dignidade", escreveu o ZANU-PF na rede social Twitter.

O ZANU-PF fez ainda um ultimato a Robert Mugabe: o chefe de Estado terá de apresentar a sua demissão da Presidência do Zimbabué até ao meio-dia de segunda-feira ou submeter-se ao processo de impugnação. 

Antes da reunião, realizada à porta fechada, o presidente do Comité Central, Obert Mpofu, referiu-se a Mugabe como "Presidente em fim de mandato" e elogiou a intervenção das forças armadas, que abrem uma "nova era, não só para o partido, mas para o país".

O afastamento do vice-Presidente Emmerson Mnangagwa desencadeou um conjunto de reações no Zimbabué, culminando com a intervenção militar do exército que tomou o controlo do poder e impediu Mugabe, 93 anos, de continuar a manobrar politicamente para que a sua mulher, Grace, o substituísse na Presidência do país. Grace Mugabe, aliás, foi também expulsa, "para sempre", do mesmo partido, bem como dois dos ministros mais próximos de Robert Mugabe, os da Educação Superior, Jonathan Moyo, e o das Finanças, Ignatius Chombo. 

Na reunião do Comité Central, órgão encarregado de tomar as decisões no seio da ZANU-PF, oito dos dez Comités Coordenadores Provinciais do partido manifestaram-se a favor da destituição de Robert Mugabe devido à "incapacidade" provocada pela idade avançada (93 anos) e lamentaram que toda esta situação tenha criado várias fações internas. 

Emmerson Mnangagwa Politiker aus Simbabwe
Emmerson Mnangagwa será o novo líder do ZANU-PFFoto: Getty Images/AFP/A. Joe

Na abertura da sessão, realizada na sede da ZANU-PF, em Harare, o ministro do Interior, Obert Mpofu, defendeu que, apesar de Robert Mugabe ter desempenhado um papel valioso no Zimbabué, a mulher e os mais próximos têm estado a "aproveitar-se" desse facto para se posicionarem na sucessão. 

Desde a intervenção militar, na semana passada, centenas de milhares de zimbabueanos têm saído às ruas para protestar contra a decisão e contra a manutenção de Mugabe no poder - ações que culminaram este sábado (18.11) com uma das maiores manifestações de sempre em Harare. Entretanto, os comandos militares que levaram a cabo a iniciativa vão receber ainda este domingo Robert Mugabe na Presidência zimbabueana, onde estão instalados.

Próximo passo: destituir o Presidente

A decisão tomada na reunião de urgência do Comité Central do ZANU-PF abre, assim, caminho à reintegração de Mnangagwa, que, por sua vez, deverá assumir a liderança de um novo Governo até às eleições gerais de 2018.

Zimbabwe Mugabe Rally
Robert e Grace Mugabe Foto: picture-alliance/AP Photo/T.Mukwazhi

Confirmado este cenário, a destituição de Mugabe é o passo seguinte, que terá de ser confirmada pelo Parlamento, medida que o líder parlamentar do maior partido da oposição, o Movimento para as Mudanças Democráticas (MDC), Innocent Gonese, já avançou na casa parlamentar zimbabueana após discutir a questão com o ZANU-PF. Segundo a imprensa local, a sessão parlamentar para acabar com a era Mugabe poderá acontecer na próxima terça-feira e a moção contará com o apoio do ZANU-PF e da oposição.

Robert Mugabe e os comandantes do Exército que tomaram o controlo do Zimbabué reuniram-se este domingo para negociar a sua renúncia, numa altura em que aumenta a pressão para o Presidente ceder o poder. "O Presidente Robert Mugabe encontrou-se esta tarde com os generais das Forças de Defesa do Zimbabué na Casa do Estado", disse o jornal estatal The Herald na rede social Twitter.

Entretanto, a Comunidade para o Desenvolvimento dos Estados da África Austral (SADC) anunciou que terá lugar na terça-feira (21.11) um encontro em Luanda para debater a crise política no Zimbabué.

Manter a legalidade

As conversações de Mugabe com o seu ex-comandante do exército Constantino Chiwenga estão na segunda ronda e as Forças Armadas tudo estão a fazer para evitar uma acusação internacional de golpe de Estado, algo que a União Africana (UA) já veio a público defender que não aceitará.

Fontes oficiais de ambas as partes não têm revelado pormenores sobre as negociações, mas os militares parecem querer defender uma resignação voluntária de Mugabe para manter a legalidade na transição política que, inevitavelmente, se seguirá.

A intransigência de Mugabe em deixar o poder tem sido, referem analistas locais e internacionais, uma forma de o Presidente zimbabueano contar com o apoio da UA e da comunidade internacional para preservar o seu legado como um dos líderes da libertação de África, bem como para proteger-se, tal como a família, de possíveis processos judiciais.