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"Vem aí um orçamento que não é o melhor para Angola"

Guilherme Correia da Silva15 de junho de 2016

O FMI aconselha o Governo angolano a "manter a prudência fiscal" com o aproximar das eleições de 2017. O economista Carlos Rosado de Carvalho receia que o país tome medidas de que se possa arrepender no futuro.

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Foto: António Cascais/DW

O Fundo Monetário Internacional (FMI) alerta que Angola não pode baixar os braços, apesar do preço do petróleo estar a aumentar no mercado internacional, rondando atualmente os 50 dólares o barril. A missão do FMI, que terminou na terça-feira (14.06) uma visita a Luanda, diz que poderá apoiar Angola com até 4,5 mil milhões de dólares, a três anos. Segundo o Fundo, as perspetivas para este ano ainda são "desafiadoras" e será necessário "manter a prudência fiscal com a aproximação das eleições de 2017".

O economista angolano Carlos Rosado de Carvalho teme que, com as eleições, se tomem medidas de que o país se possa arrepender. De passagem pelo Global Media Forum, organizado pela DW, em Bona, o economista diz que Angola precisa de se habituar a viver com menos dólares.

DW África: 4,5 mil milhões de dólares são suficientes para fazer frente à crise económica e financeira?

Carlos Rosado de Carvalho
Economista Carlos Rosado de Carvalho no Global Media Forum, em BonaFoto: DW/J.Beck

Carlos Rosado de Carvalho (CRC): Este valor não chega sequer para cobrir o défice previsto para este ano. Estamos a falar de valores muito baixos. Não devemos esperar que o dinheiro do Fundo Monetário Internacional sirva para tapar esse buraco. Não olho tanto para este programa devido ao financiamento, olho sobretudo para a credibilidade que traz às políticas económicas angolanas. Porque se Angola tiver as políticas económicas certas e o ambiente de negócios certo, não tem seguramente problemas em arranjar financiamento.

DW África: Ao mesmo tempo, parece ainda não estar claro se Angola vai mesmo pedir esta assistência financeira. Na segunda-feira, o FMI disse estar a aguardar que o Governo angolano confirme se quer a assistência ou não. O preço do petróleo subiu o suficiente para prescindir da ajuda?

CRC: Não. Creio que isto tem a ver com outras razões que a própria razão desconhece. É preciso recordar que o Governo não apresentou um pedido de "assistência financeira", mas de "assistência técnica". Portanto, se era assistência técnica, não vejo razão para não querer agora o apoio, porque Angola continua a precisar da diversificação da economia e dessa assistência técnica do Fundo Monetário Internacional. Destapou-se, assim, um bocadinho a "careca" do Governo, que queria apresentar este programa como uma coisa e afinal é outra – é aquilo que todos pensávamos: É também um programa de assistência financeira, sobretudo, e de credibilidade das políticas económicas.

Agora, de facto, o Governo assustou-se, porque o Orçamento [do Estado] foi elaborado com base num preço [do barril de crude] de 45 dólares. O Governo disse que, com o preço do barril abaixo dos 38 dólares, tinha que renegociar o pagamento da dívida e, portanto, aquilo fez disparar os alarmes e as campainhas. Eventualmente terá havido uma precipitação.

DW África: O Fundo Monetário Internacional afirma, esta terça-feira, em comunicado que a "atividade económica deverá desacelerar ainda mais" este ano. Diz ainda que é preciso introduzir "mais medidas para reduzir as vulnerabilidades". Concorda com esta visão do Fundo?

CRC: Concordo. E não é preciso que o Fundo Monetário Internacional venha dizer isso, pois são coisas que já sabemos. Primeiro, que temos de ajustar o nosso nível de vida ao preço do petróleo atual. Não há como [fugir a isso]. Costumam dizer que o Presidente da República despede os governadores do Banco Central quando há problemas de divisas, mas eu digo que nem que eles fossem o Messi ou o Ronaldo dos bancos centrais conseguiriam gerir a situação, porque simplesmente não há divisas. Depois há o problema cambial. Eventualmente, as coisas podem melhorar com as eleições, de alguma maneira – provavelmente o Governo vai usar mais as reservas para reduzir a pressão sobre a taxa de câmbio, pois a grande preocupação de todos os angolanos é que não conseguem comprar dólares. E isto é correto – o Fundo Monetário Internacional recomenda-o e eu estou de acordo. Mas isso devia ser acompanhado de uma desvalorização do kwanza. O meu receio é que, com as eleições, façamos coisas de que nos vamos arrepender no futuro.

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DW África: É expectável que a situação económica mude completamente com o aproximar das eleições?

CRC: Acho que a política do Governo indicia isso. As coisas más que deviam ter sido feitas, nomeadamente a eliminação dos subsídios aos combustíveis, [já foram feitas]. O Fundo Monetário Internacional defendia uma eliminação faseada dos subsídios, e o que fez o Governo? Eliminou os subsídios à gasolina e ao gasóleo à bruta. Porquê? Acho que é por causa das eleições. Portanto, vamos esperar pelo Orçamento e, sinceramente, espero estar enganado, mas acho que vem aí um orçamento que não é o melhor para Angola, e vem aí um conjunto de políticas que não são as melhores para Angola.