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Somália: entre o terror e a reconstrução

Sandra Petersmann
2 de outubro de 2017

Os EUA aumentaram seu envolvimento militar na Somália. Drones e forças terrestres foram implantados para lutar contra os extremistas Al-Shabaab. A estratégia representa perigos para a reconstrução do país.

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Somalia Mogadischu | Flüchtlingsunterkunft
Campo de refugiados em Mogadíscio.Foto: DW/S. Petersmann

Soldados estrangeiros, tiros, explosões, ataques aéreos -  quando refugiados de Bariire falam sobre o que vivem, dias e acontecimentos se misturam em depoimentos emocionados. Eles têm medo, como dizem, „dos dois lados". Marian está viúva agora. Os sete filhos dela perderam o pai. Quando as batalhas cessaram em Bariire, a mulher encontrou o corpo do marido coberto de sangue e perfurado por tiros. Quem o matou e quando aconteceu, ela não sabe dizer.      

Localizada no sul da Somália, a pouco menos de 60 quilômetros de distância de Mogadíscio, Bariiere já foi considerada uma fortaleza da milícia islamita al-Shabaab, que se juntou ao al-Quaeda na luta pelo califado. A retomada de Bariire aconteceu a 20 de agosto deste ano, quando tropas da União Africana (AU, sigla em inglês), juntamente com soldados somalis, posicionou cerca de 22 mil militares em toda Somália. Segundo declarações não-confirmadas de testemunhas, soldados norte-americanos também fizeram parte da operação.

Somália - MP3-Mono

O que aconteceu em Bariire?

Poucos dias depois da reocupação, em 25 de agosto, os soldados organizaram um ataque surpresa em uma fazenda. Na ocasião, dez civis perderam suas vidas. Entre eles, três crianças. Primeiro, o Governo da Somália negou a morte das pessoas, mas em seguida confirmou o acontecimento. Em forma de protesto, parentes levaram os corpos das vítimas para Mogadíscio. "Na escuridão, os camponeses assassinados foram confundidos com militantes do al-Schabaab”, disse o General do Exército Ahmed Jimrale Irfid, numa entrevista aos media internacionais

Reconstruíndo uma cidade arruinada

Somalia Mogadischu | Männer in Altstadtruinen
Somalis na ruínas da capital da Somália.Foto: DW/S. Petersmann

A Somália está sendo devastada pela guerra civil desde 1991. Um Estado que se desintegra. Os clãs mais poderosos do país preenchem os vazios. Mas agora a península do nordeste da África planeia construir novas estruturas federais com ajuda internacional. Desde dezembro do último ano, existe um novo Parlamento. E, a partir de fevereiro deste ano, um novo presidente. Nas duas eleições, os grandes clãs somalis lutaram pelo poder; muito dinheiro correu solto. Mas, de acordo com Michael Keating, enviado especial da ONU para Somália, os resultados podem ser considerados  um avanço. "Foi um processo eleitoral marcado por práticas de corrupção e de intimidação. Por incrível que pareça, o resultado foi recebido como legítimo tanto pela população somali quanto pela comunidade internacional”, disse Keating à DW.

O presidente Mohamed Abdullahi Mohamed goza da confiança da população. Ele é um refugiado que retornou à Somália. Além da cidadania somali, o presidente tem passaporte norte-americano. Mohamed está em busca de mais apoio militar, investimento e financiamento direto para seu governo. Ao longo da costa do país, reservas de petróleo aguardam para serem exploradas.

Otimismo visível

Na capital da Somália, o espírito otimista é visível por toda a parte: as incontáveis obras, novas ruas, cafés e lojas confirmam isso. Diplomatas estrangeiros, conselheiros e voluntários estão chegando ao país. Embaixadas são construídas.  Ainda assim, a maioria dos estrangeiros se protege atrás de muros explosivos nos terrenos próximos ao aeroporto. Carros-bomba, ataques-suicidas e sequestros ainda fazem parte do quotidiano do país. "O desafio é trabalharmos juntos a fim de que os próprios somalis possam solucionar seus problemas sem que seja preciso dizermos a eles como deve ser feito, porque temos pressa ou porque nós mesmos queremos alcançar certas coisas", avisa o enviado especial da ONU Michael Keating, ao comparar a reconstrução do país com uma maratona a ser cumprida em algumas décadas. 

Michael Keating, UN-Sondergesandter für Somalia
Michael Keating, enviado especial da ONU para a Somália.Foto: UN Somalia

Bariire – Um sinal de alerta

O caso não esclarecido dos dez civis mortos mostra como o processo de reconstrução é complicado.  A região de Lower Shabelle, onde Bariire está localizada, não é somente uma fortaleza dos al-Shabaab, mas também berço de clãs rivais armados. A seca na península do nordeste da África agravou os conflitos a respeito de água e terra. É difícil fazer uma distinção entre civis e extremistas.

De onde veio a informação que levou à operação militar naquele 25 de agosto em Bariire? Quem checou a informação? Os EUA têm apenas algumas dezenas de soldados no país, de acordo com as próprias contas feitas por eles. Isso significa que eles são dependentes de fontes somalis para fazer o reconhecimento do inimigo. Fontes de confiança em Mogadíscio consideram provável que um grupo tenha culpado o outro de lutar por al-Schabaab. É provável que a força militar norte-americana tenha atuado junto com soldados da Somália em um conflito local. 

 Trump e a guerra anti-terror

Em março deste ano, o presidente Trump deu ao exército americano mais poder para continuar a guerra anti-terror na Somália. Desde então, aconteceram 13 missões com a participação norte-americana: três operações terrestres e dez ataques aéreos. "É preciso mostrar pressão militar”, disse o homem das Nações Unidas, Michael Keating. "Porém, as experiências globais já nos ensinaram que não é possível derrotar uma revolta apenas com meios militares. É preciso que seja feita justiça e oportunidades sejam criadas para as pessoas também. A  Somália está cheia de conflitos não resolvidos.

Um ex-membro do Al-Shabaab disse, em entrevista à DW, que extremistas se aproveitam de conflitos locais para atacar a cidade. "As pessoas que fazem parte do Al-Schabaab acreditam que o Governo é o inimigo e que os soldados são criminosos. Quando o Governo conquista uma área de Schabaab, os soldados roubam e matam. Operações militares como as de Bariire podem recrutar novos soldados ao exército islamita”, sugeriu.

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