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História

Sarah Baartman: Exploração, racismo e miséria

Jane Ayeko | rl
28 de março de 2018

Há dois séculos, uma sul-africana foi exibida na Europa como um animal exótico. Sarah Baartman foi uma das vítimas do racismo científico. Milhares de pessoas pagaram para admirar o seu corpo de dimensões fora do comum.

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African Roots Sarah Baartman
Foto: Comic Republic

Quando viveu Sarah Baartman?

Sarah Baartmann, também conhecida na África do Sul como Saartjie Baartman, nasceu em 1789 nas proximidades do rio Gamtoos, na atual província sul-africana de Cabo Oriental. A jovem pertencia ao povo Khoikhoi. Ficou órfã muito cedo e, por isso, mudou-se para a Cidade do Cabo, onde trabalhou como serva para um "homem negro livre". Mudou-se, mais tarde, com ele para a Europa. Foram primeiro para a Grã-Bretanha, depois para Paris, onde Sarah morreu famosa, mas pobre, em 1815.

O que a tornou famosa?

Na Europa, Sarah foi exibida como uma atração exótica. As características do seu corpo, com dimensões normais para as mulheres Khoikhoi, foram consideradas uma aberração na Inglaterra e em França. A jovem sul-africana tinha uma cintura fina, grandes nádegas e órgãos genitais. Ficou conhecida como "Vénus Hotentote". "Hotentote" era o nome dado pelos europeus ao povo Khoikhoi, enquanto "Vénus" alude à deusa romana do amor.

Foi vítima de racismo?

Não se sabe se a jovem viajou para Londres por vontade própria ou se o seu dono a obrigou. Mas Baartman sofreu definitivamente com a mentalidade racista que dominou a visão da Europa sobre o mundo no início do século XIX. Os africanos eram considerados seres humanos menos desenvolvidos. As pessoas pertencentes ao povo Khoikhoi da África do Sul, raramente vistas na Europa, não eram mesmo tratadas como humanas. Após a morte de Sarah Baartman, o cirurgião de Napoleão, o famoso Georges Cuvier, dissecou o seu corpo, concluindo que ela tinha características semelhantes aos macacos. Ao longo de quase 160 anos, os seus restos mortais foram exibidos no Museu Nacional Francês em Paris, fazendo dela uma vítima do racismo científico.

Voltou para a África do Sul?

O fim do Apartheid, regime de segregação racial na África do Sul, "desenterrou” a história de Baartman. A África do Sul, sob o comando de Nelson Mandela, reinvindicou o repatriamento dos seus restos mortais. No entanto, o corpo da jovem só regressou ao seu país natal em 2002.

Como é lembrada hoje?

A luta pela repatriação do corpo de Baartman foi uma luta contra a violência racista. Com sua vitória póstuma, Sarah Baartman é ainda hoje um símbolo da superação da opressão aos sul-africanos. Na Cidade do Cabo é recordada com carinho no Centro para Mulheres e Crianças Saartjie Baartman, que cuida de sobreviventes de abusos.

Quem é Sarah Baartman da África do Sul?

Sarah Baartman chegou a Londres em 1810. Antes de ir para a Europa com o seu patrão, trabalhava como criada na África do Sul. Não se sabe se fez a viagem porque quis ou se foi obrigada.

Durante vários anos, foi exibida na Europa como um animal exótico. Baartman tinha nádegas e coxas protuberantes devido à acumulação de gordura - um traço genético comum na sua tribo, o povo Khoikhoi. Milhares de pessoas juntavam-se para admirar as dimensões fora do comum na Europa, enquanto os exploradores enchiam os bolsos com o dinheiro arrecadado nos bilhetes. A jovem ficou conhecida como "Vénus Hotentote - "Vénus” por causa da deusa romana do amor e "Hotentote" porque era este o nome dado pelos europeus ao povo Khoikhoi.

Quem conheceu Sarah Barrtman lembra-a como uma pessoa animada e com uma memória brilhante. No entanto, a maioria dos europeus considerava-a uma aberração.

Em entrevista à DW, Fundi Nzimande, comissária para a Igualdade de Género da África do Sul, explica que o modo como os euopeus trataram Sarah Baartman se deve à crença que existia na Europa de que África era um continente negro e as pessoas que lá viviam eram sub-humanos. "Essas crenças explicam como eles (os europeus) lidaram com a população africana aquando da sua chegada à África do Sul: o povo Khoikhoi e o povo San", acrescenta a comissária, lembrando que, naquela época, "as relações eram horríveis". "As mulheres não tinham opinião. Era, por isso, fácil para eles explorá-las", diz.

DW Videostill Projekt African Roots | Sarah Baartman, Südafrika
Sarah Baartman foi exibida na Europa como um animal exóticoFoto: Comic Republic

Sarah Baartman não viveu muito tempo na Europa. Morreu na pobreza, aos 25 anos, em Paris, a capital francesa, apenas cinco anos depois de ter saído da África do Sul. Ainda assim, e mesmo depois de tudo o que passou, nem depois da morte esta jovem encontrou a dignidade. A sul-africana foi dissecada pelo cirurgião de Napoleão que a comparou a um macaco. Durante 160 anos, o seu esqueleto, cérebro e órgãos genitais estiveram em exposição no Museu de Antropologia em Paris. Só em 1974, e depois de vários protestos, o seu corpo foi retirado do museu.

"Símbolo da violência”

Sarah Baartman morreu há 200 anos. Mas para os sul-africanos que sofreram horrores durante o Apartheid, o seu legado continua a ser importante. Segundo Fundi Nzimande, a jovem "é vista como um símbolo da violência extrema e horrível que as pessoas sofreram em situações em que estavam impotentes. Simboliza, por isso, as piores atrocidades que os seres humanos passaram no mundo".

Com o fim do Apartheid, em 1994, ressurgiu o interesse da África do Sul por Saartjie Baartman - o nome pelo qual muitos sul-africanos a lembram. Já na era de Nelson Mandela o país travou uma luta pelo repatriamento dos restos mortais da jovem. No entanto, o corpo de Sarah Baartman apenas regressaria a casa em 2002. O enterro, na sua província natal do Cabo Oriental pôs  fim a quase dois séculos passados no exterior.

A história de Sarah Baartman é ainda hoje um ensinamento para todos. "Nunca mais nenhum humano deverá ser tratado desta forma. Esta história lembra-nos que devemos honrar todos os povos e tratá-los com decência, independentemente, do seu género ou cor", conclui a comissária para a Igualdade de Género da África do Sul.