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"Gás não é o caminho para o desenvolvimento de Moçambique"

23 de novembro de 2021

A DW África ouviu o ambientalista Daniel Ribeiro sobre o papel da multinacional Total, que explora gás em Moçambique.

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Foto: Reuters/R. Duvignau

A campanha internacional denominada "Colapso Total" terminou na segunda-feira (22.11), mas trouxe também questionamentos sobre as reais possibilidades de desenvolvimento do país com a exploração do gás pela Total,no norte de Moçambique. São questionamentos, sobretudo, sobre o papel que a exploração do gás pela multinacional petrolífera desempenha e que benefícios traz para a sociedade.

A iniciativa "Colapso Total" surgiu no contexto do Acordo de Glasgow e teve a ONG Justiça Ambiental (JA) como um dos 45 signatários. Mas em Moçambique, vários setores não veem com bons olhos o boicote "futuro" do país, que estaria ancorado ao gás.

Para saber os reais benefícios - e malefícios - da exploração do gás no páis, a DW África entrevistou Daniel Ribeiro, ambientalista da ONG Justiça Ambiental.

Mosambik Maputo | Umweltschützer | Daniel Ribeiro
O ambientalista Daniel RibeiroFoto: privat

DW África: Por que é que a organização aderiu à campanha?

Daniel Ribeiro (DR): A Total é uma empresa enorme, com poder económico bem acima do nosso país, Moçambique. Por isso, é preciso criar ligações com outras sociedades civis por todo o mundo para termos forças para confrontar os impactos da Total. Uma coisa que vemos é que a Total tem uma maneira de operar igual por todo o lado - focada no lucro e associada a grandes impactos socioambientais e abuso de direitos humanos. Temos que lutar contra isso.

A Total também é uma das empresas responsáveis pela crise climática. Por isso, estão a fazer grandes iniciativas para travar qualquer ação séria para resolver o problema da crise climática. Nós temos a capacidade de captura dos Estados e de processos democráticos para travar ações concretas. E vimos isso na COP26 e outros espaços. Nesse sentido, a campanha "Colapso Total" é muito importante para unir todos estes grupos e lutar contra a Total. Para mostrar a verdade.  

DW África: A campanha em Moçambique, como a marca própria "Total Futseka", fez eco junto aos políticos?

DR: Na verdade, a campanha não é chamada "Total Futseka", mas também faz parte da campanha "Colapso Total". O que fizemos foi dar liberdade às pessoas que quisessem participar para dar a sua mensagem. Usar as palavras que gostassem. E uma das palavras usadas pelas pessoas foi a palavra "futseka", que quer dizer "vai-te embora". Mas em Moçambique, é muito difícil levantar a voz e falar a verdade, como qualquer voz crítica aos interesses das elites políticas.

Bildergalerie Kohletransporteure und Kohleproduktion in Mosambik
Muitos acreditaram no carvão para o desenvolvimento de Moçambique. Nesta imagem, um homem transporta o recurso mineral numa bicicleta (foto de arquivo)Foto: Gerald Henzinger

Já tivemos amigos jornalistas e líderes comunitários que desapareceram por ter levantado a voz e criticado os projetos da Total, como o do gás. Por isso é muito importante ter ligações internacionais e levantar a voz em outros sítios. A nível nacional também é complicado falar do assunto. Como há uma necessidade grande por desenvolvimento, muita gente acha que é melhor ter qualquer investimento do que não ter nenhum. E houve muita propaganda do Governo e dos média, com narrativas falsas sobre o real potencial do gás.

DW África: Diversos setores em Moçambique contestam as ações contra a Total levadas a cabo por ambientalistas, por verem no gás a esperança de um futuro melhor. É um sinal claro da irrelevância que as questões ambientais têm, até mesmo para os considerados intelectuais moçambicanos?

DR: O gás não vai ser o caminho para o desenvolvimento de Moçambique. Nós vimos narrativas falsas também na época do carvão, quando se falou de grande riquezas e desenvolvimento para o povo. Eram todas "palavras bonitas", mas a verdade é que nada daquilo aconteceu. 

As contribuições para o país das empresas de carvão são mínimas. E o mesmo vai acontecer com o gás. Os contratos que fizemos com as empresas são muitos fracos e têm poucos benefícios para o país. Depois, estamos a ver que o gás não é um combustível de transição, mas tem um grande impacto nas mudanças climáticas e no efeito estufa. Portanto, há uma grande pressão para se parar de usá-lo. E temos os problemas de corrupção associados ao gás, como as próprias dívidas ocultas. É algo que está ligado ao acesso aos fundos, devido às projeções do gás. Por isso, quando se fala que o gás é o caminho para o desenvolvimento, os dados e as análises não mostram isso. Nós precisamos usar essa informação e não as narrativas falsas dos nossos políticos e das elites.

Mineração ilegal em Moçambique é um problema

Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África