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Miséria no Exército pode comprometer luta contra terrorismo

6 de fevereiro de 2024

Soldados de barriga vazia e sem salários há três meses podem prejudicar o combate ao terrorismo em Cabo Delgado, alertam especialistas. Precariedade facilita propaganda insurgente e o aliciamento para as suas fileiras.

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Forças Armadas de Moçambique em Cabo Delgado
Foto: Roberto Paquete/DW

"Saco vazio não fica em pé", diz o adágio popular. Os soldados do Exército moçambicano que enfrentam escassez de comida em Cabo Delgado, segundo um relatório do observatório Cabo Ligado, não estariam nas melhores condições de defender a sua pátria do terrorismo. A agravar a situação estão os atrasos salariais, de cerca de três meses.

O especialista em resolução de conflitos Rufino Sitoe lembra como uma insatisfação de grupo poderá prejudicar uma meta de dimensão nacional: "Obviamente que as pessoas que estão lá a combater têm as suas famílias, os seus compromissos sociais e financeiros e, sem salários, não é possível que se concentrem [no combate a] esta insurgência".

Além disso, as comunidades há anos vulneráveis devido aos ataques dos insurgentes podem tornar-se alvos também de soldados governamentais não remunerados e esfomeados. É que, segundo Rufino Sitoe, a crescente precariedade no Exército pode atirar os militares para ilegalidades e não só.

"Começam a procurar alternativas de sobrevivência que envolvem saques de comunidades e de negócios. Começam a entrar em formas ilícitas de sobrevivência, negócios, para que os militares que estão no terreno tenham os recursos necessários para sobreviverem e para a sobrevivência das suas famílias, de modo a garantir que a moral destes homens continue em alta", antevê.

Deslocados da província moçambicana de Cabo Delgado
A população que é regularmente saqueada pelos insurgentes e, às vezes, também é alvo de saques por parte dos soldados governamentaisFoto: Marcelino Mueia/DW

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Não seria a primeira vez. Relatos de extorsões a população e inclusive de saque a um banco por parte de alguns jovens soldados governamentais já foram partilhados há alguns anos.

Foi aos jovens que o Presidente da República, Filipe Nyusi, pediu recentemente para não engrossarem as fileiras dos insurgentes, que estão de volta aos banhos de sangue em várias localidades.

Mas juntar-se, por exemplo, as fileiras de um Exército sem atrativos está longe dos objetivos de muitos jovens, mesmo aqueles sem oportunidades. As promessas aliciantes dos insurgentes acabam por falar mais alto, sublinha a especialista em contra-insurgência Jasmine Opperman. 

"Os insurgentes sabem dessa fraqueza das forças militares e aproveitam a oportunidade, fazem novos recrutas, espalham a sua propaganda e, com isso, a narrativa do Estado Islâmico torna-se a voz dos descontentes em relação ao governo moçambicano. É extremamente difícil forçar um estilo de vida completamente infamiliar na região", diz a especialista em contra-insurgência.

Porém, Opperman recorda que a complexidade à volta da desmotivação das forças não está apenas confinada ao salário e à comida. As diferenças sócio-linguísticas em relação à população local, que os olha com desconfiança, por exemplo, são um inconveniente.

Para Rufino Sitoe, uma das saídas passa por "fechar estas lacunas de modo a permitir que o trabalho de contra-insurgência efetivo produza melhores resultados, a curto, médio e longo prazos".

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Nádia Issufo
Nádia Issufo Jornalista da DW África
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