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Cabo Delgado: "Situação continua e está a aprofundar-se"

10 de novembro de 2020

Bispo de Pemba confirma que insurgentes atacaram aldeias em Muidumbe, na semana passada. Dom Luiz Fernando afirma: houve decapitações, mas não é possível quantificar o número de vítimas.

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Mosambik Luiz Fernando Lisboa Bischof, Pemba
Foto: DW/R. Belincanta

Nos últimos dias, têm surgido várias notícias preocupantes sobre a situação em Cabo Delgado, em Moçambique. Primeiro, o Governo confirmou a tentativa de assalto a estabelecimentos prisionais por parte dos insurgentes e, esta segunda-feira (09.11), o Fórum Nacional de Rádios Comunitárias (FORCOM) denunciou que vários jornalistas estão refugiados nas matas depois de mais um ataque no distrito de Muidumbe.

Questionado pela DW sobre os últimos acontecimentos, o bispo de Pemba, Dom Luiz Fernando Lisboa, dá conta que a situação está a "aprofundar-se", com a realização por parte dos insurgentes de múltiplos ataques.

A semana passada, afirma Dom Luiz Fernando Lisboa, mais onze aldeias foram atacadas no distrito de Muidumbe. Os insurgentes, conta, "espalharam muita morte, queimaram prédios públicos e casas". "Numa das aldeias mataram vários jovens que estavam num rito de iniciação. Foram cerca de 15 jovens com idades entre os 12 e 15 anos. Já ouvimos de várias fontes", confirma Dom Fernando Lisboa, alertando para o facto de, dada a complexidade da situação, não existirem números precisos.

Na mesma ocasião, o bispo voltou a reafirmar que "Pemba está sobrelotada".

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DW África: Tem conhecimento dos acontecimentos descritos?

Dom Luiz Fernando Lisboa (LFL): Os jornalistas que estão nas matas são da Rádio São Francisco na missão de Nangololo, que fica na aldeia de Muambula, uma das aldeias atacadas. Como os jornalistas são daquela aldeia, fugiram com as famílias, como [fez] toda a população. Não fugiram por perseguição aos jornalistas, fugiram porque são daquela aldeia.

DW África: As notícias que estão a sair cá para fora mostram um agravamento da situação ou estão a fazer-se mais denúncias? 

LFL: A situação continua e está a aprofundar-se, porque depois da tomada de Mocímboa da Praia, houve um ataque muito forte a Quissanga. Tanto é que praticamente toda a população de Quissanga já saiu e agora, na semana passada, atacaram onze aldeias em Muidumbe, que é noutro distrito. E espalharam muita morte, queimaram prédios públicos e casas, decapitaram cabeças de pessoas.

DW África: Esta terça-feira, várias agências e meios de comunicação internacionais estão a avançar que os terroristas terão decapitado, recentemente, cerca de 50 pessoas na vila de Muatide. Consegue confirmar esta informação?

LFL: O número eu não tenho como confirmar porque nessas aldeias todo o povo está fora, morreu ou fugiu. Então é difícil de dizer se foram 40/50 pessoas. Eu acabei de falar com um jovem de lá dessa aldeia [Muatide] que teve um tio e um irmão que foram mortos, mas ele não sabe o número de pessoas que morreram. As notícias não são precisas, mas houve ataques em onze aldeias e houve mortes. Numa das aldeias mataram cerca de 15 jovens, dos 12 aos 15 anos, que estavam no rito de iniciação. Já ouvimos várias fontes a confirmar isso. [O que se diz em meios de comunicação], que foram 40 ou 50, não sabemos quantificar. Quem fala que tem informação precisa neste momento está a arriscar. Por exemplo, o barco que naufragou, disseram muitos números – 50, 40, 30 – a última informação que temos é que foram cerca de 40 pessoas.

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DW África: Este é um conflito de difícil cobertura. Não há jornalistas no terreno, ficando a divulgação do que se passa muito dependente do Governo moçambicano e dos insurgentes. Na sua opinião, este facto tem prejudicado a perceção do conflito no exterior e o apoio às vítimas?

LFL: Tem prejudicado muito, porque nós temos pessoas que fugiram, só que estão a chorar porque deixaram os seus avós. Os velhotes não têm como correr, nem como andar pelo mato a caminhar quatro, cinco ou seis dias. Então, ficou muita gente para trás. Infelizmente, é mais um sofrimento ainda. As pessoas sofrem porque perderam, porque tiveram de fugir, sofrem porque tiveram familiares mortos e porque deixaram familiares para trás.

DW África: Continuam a chegar a Pemba muitos deslocados? Qual é a situação atual nos acampamentos?

LFL: Pemba está superlotada. Continuam a chegar pessoas à praia, infelizmente, porque não temos as condições necessárias para acolher e para recolocar essas pessoas. Então, ainda há pessoas a dormir na praia e a ser atendidas ali.

DW África:  Que tipo de iniciativas continuam a levar a cabo?

LFL: Como igreja, nós estamos a tentar fazer um trabalho psicossocial. Treinámos um grupo de cerca de 60 pessoas ativistas, entre padres, irmãs, seminaristas, jovens, que estão a ir aos acampamentos e bairros para reunir grupos e fazer quatro, cinco, dez encontros para deixarem as pessoas falarem dos seus traumas, dramas, contar a sua história. E isto tem tido uma repercussão muito boa, porque as pessoas estão frustradas, estão com medo, inseguras e poder contar a sua história tem ajudado muito. Além do trabalho que a Cáritas Diocesana tem feito de atendimento às vítimas com outras organizações das Nações Unidas e sociedade civil de levar comida, roupa e abrigo para as pessoas deslocadas.

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