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"Angola está à beira do precipício"

24 de novembro de 2016

O alerta é lançado pelo analista Rui Verde, que leu a proposta de Orçamento do Estado de Angola para 2017. O jurista fala numa série de "perigos", como a redução da capacidade do Estado para pagar a dívida. Mas há mais.

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Rui Verde
Foto: DW/J. Carlos

O Orçamento Geral do Estado (OGE) de Angola para 2017 foi aprovado há uma semana (17.11) na generalidade e está em análise nas comissões de especialidade do Parlamento.

O analista Rui Verde, que analisou a proposta de Orçamento, alerta para uma série de "perigos". Um deles é a redução da capacidade do Estado para pagar a dívida externa - pagamento que é já a despesa que mais pesa no OGE. E se não paga as prestações, o Governo não recebe novos empréstimos e entra em falência, diz o jurista.

Outro perigo é cortar nas despesas de educação, saúde e assistência social. E há mais riscos "imediatos", explicou Rui Verde em entrevista à DW África.

DW África: O risco de incumprimento financeiro de Angola está a aumentar, acaba de alertar a Economist Intelligence Unit (EIU). Um perigo para o qual o senhor já tinha chamado a atenção quando leu a proposta de Orçamento de Estado para 2017. O país está "à beira do precipício"?

Rui Verde (RV): Sim, o país está à beira do precipício e já está há um ou dois anos. Digamos que está cada vez mais à beira do precipício porque está cada vez mais dependente do financiamento externo e não é certo que consiga pagar. Como sabemos, o preço do petróleo tem oscilado à volta dos 50 dólares por barril, enquanto a economia não tem nenhuma dinâmica e, portanto, se não há dinheiro do petróleo tem que se pedir emprestado. E esse é o grande problema.

DW África: Além disso, dois terços do Orçamento para 2017 serão para pagar a dívida e para o setor da defesa e segurança. Ou seja, setores como saúde, educação, e assistência social vão ficar em segundo plano. Que preço se irá pagar em termos sociais?

24.11.16 Entrevista Rui Verde OGE Angola (ONLINE) - MP3-Mono

RV: O preço que se irá pagar é o contínuo decréscimo de Angola em termos do índice de desenvolvimento humano. A expetativa angolana há dois ou três anos era passar a ser um país de desenvolvimento médio. Não conseguiu e continua a ser um país de baixo desenvolvimento e vai caindo cada vez mais. O problema é que a população vai sofrendo cada vez mais com estas opções e, no fundo, hoje está-se a chegar ao fim do ciclo do regime. Claramente é isso.

DW África: E aumenta também o financiamento para a polícia. O que é que isto poderá indicar?

RV: Quer indicar claramente que o Governo pretende sobreviver à custa da repressão e tem medo de um levantamento do estilo "Primavera Árabe", porque as redes sociais em Angola estão extremamente ativas. Basta um pequeno incidente para haver um levantamento e obviamente tem de haver uma atenção reforçada da segurança. E é disso que o Governo tem medo.

DW África: Num artigo que publicou recentemente no portal Maka Angola também alertou para outros perigos como a suspensão da execução de projetos de investimento em curso, como o novo Aeroporto Internacional de Luanda, e a paralisação da própria administração pública angolana. O que é que isto poderá representar?

RV: Poderemos estar à beira de o país ficar totalmente parado, sem dinheiro para os funcionários públicos, sem dinheiro para projetos, sem dinheiro para nada. Há esse perigo. As receitas do petróleo neste momento representam apenas um quarto do Orçamento Geral do Estado. O restante tem que ser arranjado num outro lugar qualquer e em Angola não há propriamente muitos lados para ir buscar esse dinheiro que falta.

DW África: E onde é que o Governo pode ir buscar dinheiro para compensar o baixo preço do petróleo? É realista esperar receitas de impostos não petrolíferos em Angola?

RV: Isso claramente não é realista. Seria realista se a economia estivesse com um crescimento previsível grande, que não tem porque o crescimento é entre 0% e 1%. Onde pode ir buscar é pedir emprestado ou então começar a pôr processos aos mais ricos para devolverem o dinheiro que retiraram no passado. Mas, enfim, essa é uma hipótese de cariz diferente. Em termos técnicos, o que podem fazer é pedido emprestado

DW África: Mas pedir mais empréstimos certamente também não seria bom para a economia angolana…

RV: Não é porque já estão a ocupar uma percentagem muito grande de despesa.

DW África: Então, Angola poderá estar num beco sem saída?

RV: Está precisamente num beco sem saída.

Rui Verde
Foto: DW/J. Carlos
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