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Migração, o sonho de viver na Europa – Parte 4 – À espera de poder seguir

Alexander Göbel / Reinhard Spiegelhauer27 de junho de 2013

O pinhal de Oujda, Marrocos, simboliza a tragédia de muitos africanos. É lá que chegam ao tentar alcançar a Europa. Lá, sobrevivem em condições precárias, esperando uma oportunidade de seguir que talvez nunca chegue.

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Migração, o sonho de viver na Europa – Parte 4 – À espera de poder seguir
Migração, o sonho de viver na Europa – Parte 4 – À espera de poder seguirFoto: AP

Os homens vêm do Gana, do Mali e do Burkina Faso. São jovens que deixaram tudo para procurar a sorte num lugar longe de casa. Dormem debaixo de lonas de plástico verde, cozinham em fogueiras. Tudo o que lhes pertence trazem vestido, mais não têm. Mohamed é um dos que aqui vivem. Segundo ele, todos eles, que sabem que “a Europa está aqui tão perto, [pensam] na boa vida que lá se tem”. O jovem diz que sonha com o velho continente todos os dias. “Mesmo que te custe a vida, só pensas em partir”, continua, “tens de arriscar a vida para conseguires alguma coisa”.

Também Abdoullah vive agora no pinhal de Oujda. Também ele arriscou a vida: esteve mais de dois anos em trânsito, percorreu milhares de quilómetros do Gana até Marrocos. A viagem custou-lhe mais de 3.000 euros, dinheiro que a sua aldeia conseguiu juntar para que ele tivesse com que pagar aos passadores que o levaram pelo deserto. Os seus pais não sabem que ainda está vivo.

Mas Abdoullah tem a certeza de que eles rezam por ele. Quer tornar-se jogador de futebol profissional – de preferência, no Real Madrid. E quando o conseguir, liga para casa. E manda dinheiro. Para que os pais tenham orgulho nele. Também ele acredita que “a vida na Europa é ótima”. Já esteve em Gran Canaria e, conta, ficou impressionado com Las Palmas.

Oujda, a sala de espera da Europa

Porém, Abdoullah já está há um ano em Oujda. Com ele estão muitos outros emigrantes e refugiados africanos. Passam o dia a vaguear pela cidade a pedir a quem passa algum dinheiro para a próxima refeição, para água, sabão, roupas, medicamentos. Trabalhar em Marrocos não podem, alguns arranjam pequenos biscates: em quintas, no tráfico de droga ou na prostituição. Mas no pinhal de Oujda, muitos simplesmente não fazem nada. Marrocos não os quer, África não os quer e muito menos a Europa.

Abdulaye, do Burkina Faso, conta que “sempre que a polícia vem leva as tendas, não deixa nada”. Por vezes, “surpreendem-nos enquanto [dormem] e também já houve quem saísse ferido”.

Nos últimos tempos, têm chegado muitos malianos a Oujda. Os confrontos no norte do país empurram-nos para longe. Muitos são jovens como Abou de 20 anos. Depois de Melilha, não conseguiu avançar: a polícia descobriu-o, espancou-o e levou-o para o pinhal. Uma ferida está ainda aberta, o pé inchado. Devido às dores, Abou mal consegue falar. Os outros sentam-no no chão. Os homens estão sentados em círculo à volta de um tacho amolgado e comem o que Ismael, o chefe do campo, cozinhou: uma mistura de arroz com legumes. Têm de continuar fortes para conseguirem chegar à Europa. Mohamed está entre eles, desanimado com o que vê à sua volta: “guerras por todo o lado, derrame de sangue por todo o lado. No Congo, na Somália, no Mali”. As pessoas, diz, só querem ser livres e viver em paz.

“Tudo o que se mexa no mar é controlado”

Do outro lado do mar, além do Mediterrâneo, a Europa investe em alta tecnologia para travar a onda de refugiados que chega de África. O Estreito de Gibraltar é controlado através de raios infra-vermelhos e radares enquanto a guarda costeira faz patrulha. O objetivo é detetar botes de refugiados o mais próximo possível da costa marroquina, ainda fora das águas espanholas.

É da cidade portuária de Algeciras que partem as lanchas da guarda costeira e de outras unidades da polícia espanhola quando fazem a patrulha no estreito. A luta, diz o capitão Manuel Oviedo à porta do comando central, é mais contra o tráfico de droga e de pessoas. E, por isso, explica, “tudo o que se mexa no estreito é controlado: barcos de lazer, botes de pesca, cargueiros, tudo”.

Os homens que aqui trabalham conseguem dirigir as câmaras para o alto mar e ver onde se encontram botes e quantas pessoas estão a bordo. Mas há ainda três estações de radar. O radar é o instrumento que permite adquirir imagens a maior distância. Segundo Manuel Oviedo, “quando o tempo permite, é possível ver muito além das águas espanholas”.

Em vez de 10 quilómetros, a viagem tem agora até 1000

Dependentemente do tamanho das sombras no radar, da velocidade e da direção, pode-se verificar com grande probabilidade se se trata de uma lancha rápida, por exemplo, ou de um bote de um passador que pretende levar refugiados para Espanha. E, consoante a suspeita, são então enviados navios da guarda costeira, por vezes até mesmo helicópteros.

SIVE – Sistema Integral de Vigilância Exterior – é o nome deste sistema de vigilância. Mas existe ainda o Programa Perseus, que integra todas as estações do SIVE. Segundo o capitão Oviedo, Espanha tem agora “um projeto-piloto com Portugal que permite receber as imagens captadas nas estações de vigilância ao longo da costa algarvia”.

Devido à eficácia do SIVE e dos outros programas, muitos refugiados percorrem há anos rotas diferentes. Uma delas começa na Mauritânia e termina nas ilhas Canárias, o que significa que, em vez de dez quilómetros, os botes cheguem a percorrer cem. Muitos arrancam mesmo do Senegal, a mais de mil quilómetros de distância das Canárias.

A viagem é longa e muito mais perigosa do que através do estreito de Gibraltar. Mas nem isso assusta os querem chegar à Europa.

Migração, o sonho de viver na Europa - Parte 4 - À espera de poder seguir

A atuação da FRONTEX diminuiu as hipóteses de alcançar solo europeu
A atuação da FRONTEX diminuiu as hipóteses de alcançar solo europeuFoto: picture-alliance/Milestone Media
Por vezes, as ONGs fornecem lonas de plástico para as tendas
Por vezes, as ONGs fornecem lonas de plástico para as tendasFoto: DW